O The New York Times  é alvo de um processo judicial que pode mudar os parâmetros de julgamentos relacionados à imprensa nos Estados Unidos, e que entra na reta final esta semana. 

A ex-governadora do Alasca Sarah Palin, que concorreu à vice-presidência do país em 2008, processa o jornal por difamação após ter um editorial alterado pelo ex-editor da página de opinião, James Bennet.

Em depoimento a um tribunal federal em Manhattan na semana passada, o jornalista assumiu a culpa pelos erros contidos na publicação veiculada em 2017. 

Palin x New York Times, um processo histórico

Na sexta-feira (11) os advogados das duas partes apresentaram as alegações finais, e o júri começa a deliberar nesta segunda-feira. 

O artigo de opinião “America’s Lethal Politics”, assinado por Palin, foi editado por Bennet relacionando uma campanha publicitária da ex-governadora a um tiroteio em massa no Arizona em 2011.

O advogado de Palin, Kenneth Turkel, sustentou na sexta-feira que o jornal e o ex-editor de página editorial mancharam a reputação de Palin, acusando o Times de “arrogância” durante o julgamento, e que  teriam “passado dos limites”. 

O caso está sendo acompanhado com atenção pela mídia de notícias norte-americana, já que veículos de imprensa são blindados de acusações de difamação por figuras públicas desde o julgamento que ficou conhecido como New York Times Company v. Sullivan, levado à Suprema Corte em 1964.

O processo movido por Sarah Palin é a primeira ação judicial de difamação contra o New York Times a ser julgada nos Estados Unidos em quase 20 anos.

Por isso, tem o potencial de derrubar décadas de precedentes que ofereceram amplas proteções às organizações de mídia ao escreverem sobre personalidades públicas.

No caso avaliado pela Suprema Corte na década de 60, ficou decidido que pessoas em cargos públicos devem provar não apenas um erro de veículo de imprensa, mas comprovarem que o equívoco foi feito de forma intencional para difamá-las.

Sarah Palin (Foto: Gage Skidmore/Wikimedia)

Dessa forma, os advogados de Palin só conseguirão vencer no tribunal caso provem que Bennet e o jornal tiveram “malícia real” em deturpar a informação ao editarem o texto.

A defesa da ex-governadora já sinalizou que, em caso de derrota no processo contra o New York Times, pode levar o caso à Suprema Corte.

Após as mudanças realizadas pelo ex-presidente Donald Trump, hoje o tribunal tem uma maioria conservadora, o que deixa margem para a possibilidade de revisão da jurisprudência desses tipos de casos.

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Sede do New York Times, nos Estados Unidos (Foto: Pixabay)

Entenda o caso do New York Times 

O editorial “America’s Lethal Politics” foi escrito por Sarah Palin após um tiroteio em um treino de beisebol que feriu o deputado Steve Scalise e outros membros do Congresso norte-americano.

O artigo foi publicado em 14 de junho de 2017 no New York Times.

No entanto, ao receber o texto original de Palin, o então editor do jornal James Bennet fez uma revisão de forma que vinculou um mapa divulgado pelo comitê político da ex-governadora do Alasca como o inspirador de um tiroteio que aconteceu em Tucson, no Arizona, em 2011.

No atentado, seis pessoas morreram e a ex-deputada democrata Gabrielle Giffords ficou ferida.

Na publicação do NYT, o mapa foi descrito como tendo uma mira sobre Giffords e outros democratas, quando, na realidade, a ilustração utilizava uma mira sobre distritos eleitorais. 

Mapa da campanha de Sarah Palin que ocasionou erro e processo no New York Times (Foto: Reprodução)

Palin ficou indignada pelo editorial colocar a culpa nela por incitar o tiroteio no Arizona, já que o artigo argumentava que a imagem publicada no Facebook da política inspirou o atirador a realizar o crime.

O jornal disse que emitiu uma correção “rapidamente” após a publicação do artigo errado, admitindo que o texto “incorretamente afirmava que existia uma ligação entre a retórica política e o tiroteio da deputada Gabby Giffords em 2011”.

O que a autora alega no processo contra o jornal

Sarah Palin acusa o New York Times de ter manchado sua reputação.  

No processo, os advogados dela afirmam que o editorial do NYT erroneamente traçou uma ligação “clara” de “incitação política” entre o gráfico publicado nas redes sociais de Palin e o atirador do Arizona. 

Os advogados do jornal questionaram na semana passada o motivo de ela ter movido o processo contra o New York Times anos após o caso, e por um artigo que foi corrigido.  

Em depoimento na última quinta-feira (10), Palin disse ao tribunal que na época vinha recebendo ameaças de morte que pareciam “ataques orquestrados”. E que se sentiu  “impotente” contra o jornal depois que o editorial foi publicado.

“Foi devastador ler novamente uma acusação, falsa acusação, de que eu tinha algo a ver com assassinar pessoas inocentes”, disse ela no Tribunal Distrital dos EUA em Manhattan em 10 de fevereiro.

Os advogados do jornal procuraram desconstruir suas alegações de danos emocionais e profissionais diante das críticas, após sua retórica e dezenas de aparições na mídia em seus anos em cargos públicos e na chapa republicana de vice-presidente em 2008.

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“A culpa é minha. Eu escrevi essas frases. Não estou procurando transferir a culpa”, afirmou Bennet no tribunal na última quarta-feira ao assumir a responsabilidade pelo erro.

Questionado na audiência se havia realizado “qualquer pesquisa de fatos” antes de editar e publicar o texto, Bennet disse que não, mas que um assistente o fez.

O jornalista também tentou justificar o equívoco por causa do prazo apertado para que o artigo fosse aprovado.

Desde o início do ano passado, James Bennet, que deixou o New York Times em junho de 2020, é contratado pela revista Economist como editor sênior.

Perto do final do depoimento no tribunal em Manhattan, o advogado de Sarah Palin perguntou se ele havia sido repreendido pelo erro.

Bennet disse que compareceu perante o conselho de administração do NYT para se desculpar.

“Não sei se isso se qualifica como uma bronca”, disse ele, “mas parecia uma”.

Em 2021, o New York Times enfrentou uma controvérsia em torno do podcast Caliphate, que teve como principal fonte um homem preso pela polícia no Canadá por falsidade ideológica. Ele nunca tinha estado na Síria. 

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