Londres – Apesar do noticiĂĄrio negativo na imprensa estrangeira sobre questĂ”es como meio ambiente e a resposta Ă  covid, o Brasil registrou um avanço em percepção internacional, passando a figurar entre as 30 naçÔes com maior poder de influĂȘncia global, segundo a edição 2022 do Soft Power Index, publicada esta semana Londres.

Comparado a 120 paĂ­ses, o paĂ­s ficou no 28Âș lugar, sua melhor posição desde que o estudo passou a ser feito pela consultoria britĂąnica Brand Finance, em 2020. Trata-se da anĂĄlise global mais abrangente sobre percepçÔes das marcas nacionais.

O ranking geral Ă© liderado pelos Estados Unidos – que retomaram este ano o topo da lista que haviam perdido para a Alemanha em 2021 – seguido por Reino Unido, Alemanha, China e JapĂŁo.

Soft Power do Brasil é o mais alto da América Latina e Caribe

O conceito de soft power, criado na década de 90, representa a capacidade de cada país de influenciar os demais por meio da atração ou persuasão em vez da força.

Para chegar ao resultado, a consultoria mediu por meio de pesquisas a percepção dos paĂ­ses diante de pĂșblicos especializados (governos, organizaçÔes da sociedade civil, diplomatas, comunidade de negĂłcios) e do pĂșblico em geral sobre 11 indicadores, incluindo a resposta Ă  covid. Foram entrevistadas mais de 100 mil pessoas. 

O Brasil foi o lĂ­der da regiĂŁo da AmĂ©rica Latina e Caribe. O paĂ­s ficou entre os dez principais do mundo no quesito Cultura e PatrimĂŽnio (8Âș lugar). As ĂĄreas de avaliação mais baixa foram Governança e Resposta Ă  Covid, as duas Ășnicas em que o Brasil nĂŁo liderou na AmĂ©rica Latina.

O paĂ­s aparece entre os 30 melhores em MĂ­dia e Comunicação (26Âș lugar), NegĂłcios e ComĂ©rcio (29Âș lugar), alĂ©m de ocupar a 30ÂȘ colocação tanto em Reputação como em RelaçÔes Internacionais.

O estudo elogia o setor brasileiro de mídia e comunicação, considerando-o imparcial, baseado em fatos e com liberdade de expressão

A anålise enfatiza que fatores culturais e burocråticos tornam os países latinos mais complexos para fazer negócios do que os de outras regiÔes.

As piores posiçÔes obtidas pelo Brasil foram em Educação e CiĂȘncia (35Âș lugar), Governança (56Âș) e resposta Ă  Covid (109Âș). Embora lĂ­der na AmĂ©rica Latina no quesito Educação e CiĂȘncia, o paĂ­s empata com o MĂ©xico em nĂșmero de artigos publicados em publicaçÔes cientĂ­ficas relevantes.

A pesquisa considera que apesar dos baixos índices de escolaridade quando comparados aos países mais desenvolvidos, os países latino-americanos estão melhorando a educação båsica, o ensino superior e a formação técnica.

A avaliação em Governança foi a segunda mais baixa obtida pelo Brasil, Ă  frente apenas da atribuĂ­da Ă  resposta dada Ă  Covid. Esses foram os dois Ășnicos quesitos em que o Brasil foi superado por outros paĂ­ses na AmĂ©rica Latina.

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Pontuação do Brasil foi uma das que mais cresceu

O índice de soft power do Brasil chegou a 43,4 pontos, um crescimento de 5,3 pontos em relação ao ano anterior, o que fez com que o país subisse sete posiçÔes sem ser ultrapassado por ninguém.

SĂł oito paĂ­ses entre os 120 analisados tiveram um crescimento maior de pontos, com destaque para o Reino Unido (7 pontos), China (9,9 pontos) e Estados Unidos (14,8 pontos).

Essas trĂȘs naçÔes foram fundamentais para tirar o mundo da crise ou pelo desenvolvimento de vacinas, o que fez com que subissem no ranking, que este ano foi influenciado pela forma como os paĂ­ses administraram sua recuperação da pandemia de COVID-19.

A anĂĄlise mostra que as percepçÔes das marcas nacionais estĂŁo se recuperando em grande parte para seus nĂ­veis prĂ©-pandemia. O Brasil, que ocupava a 29Âș posição em 2020 e caiu para a 35ÂȘ no ano seguinte, voltou nesta edição para o 28Âș lugar.

Estados Unidos retomam a liderança global

AlĂ©m de ser o paĂ­s de maior crescimento em relação ao ano anterior, os Estados Unidos da era Biden desbancaram a Alemanha e retomaram a liderança do ranking global com a marca de 70,7 pontos, a maior jĂĄ alcançada desde que o estudo começou a ser feito. 

Depois de cair para a sexta posição no ano passado, eles voltam para a liderança que tinham em 2020. O paĂ­s melhorou as notas em todos os quesitos, mas a chave para seu retorno ao topo foi a tremenda mudança na avaliação de sua resposta ao COVID-19 – da Ășltima colocação do ano passado para a 26ÂȘ posição na anĂĄlise deste ano.

O Reino Unido tambĂ©m desbancou por alguns dĂ©cimos a Alemanha, cuja pontuação cresceu, embora nĂŁo o suficiente para evitar a ultrapassagem. Mas a situação pode tornar a se inverter, porque a pesquisa foi realizada antes do escĂąndalo do Partygate, as festas promovidas na sede do governo enquanto a população era proibida de realizar encontros.

A China teve seu melhor desempenho de todos os tempos pesquisa, com sua marca nacional registrando melhorias em todos os quesitos. Ela saltou do oitavo para o quarto lugar e ficou a décimos do pódio.

Seu desempenho foi particularmente bom no pilar NegĂłcios e ComĂ©rcio, passando Ă  liderança e superando os EUA, Alemanha e JapĂŁo no processo. O segundo ano da pandemia tambĂ©m proporcionou Ă  China a melhoria de suas percepçÔes por meio da diplomacia de vacinas, mediante a oferta de equipamentos e imunizantes.

Dos seis paĂ­ses que completam o Top 10, trĂȘs caĂ­ram, mas permaneceram entre os dez primeiros: JapĂŁo (5Âș), CanadĂĄ (7Âș) e SuĂ­ca (8Âș).

A França, que estava em sĂ©timo, subiu uma posição. E dois deixaram as dez primeiras posiçÔes: SuĂ©cia e AustrĂĄlia, que deram lugar Ă  RĂșssia (segundo a avaliação anterior Ă  guerra) e Ă  ItĂĄlia.

A pesquisa também apontou os líderes das demais regiÔes, além dos Estados Unidos na América do Norte, do Reino Unido na Europa e da China na Ásia.

Os Emirados Árabes Unidos foram os líderes do Oriente Médio e Norte da África, enquanto a África do Sul ficou no topo do ranking da África subsaariana. A Austrålia teve o melhor desempenho na Oceania.

A pontuação do Brasil em relação aos líderes de cada quesito

Em termos comparativos, o Brasil obteve um resultado de cerca de 80% do melhor desempenho registrado em quatro quesitos: Familiaridade (7,6 contra 9,2 dos Estados Unidos), Reputação (6,1 contra 7,4 da Suíça), Pessoas (3,8 contra 4,8 do Canadå) e Cultura e PatrimÎnio (4,6 contra 5,9 dos Estados Unidos).

Um desempenho equivalente a cerca da metade da melhor nota foi obtido em InfluĂȘncia (4,3 contra 7,7 dos Estados Unidos), MĂ­dia e Comunicação (3,6 contra 6,8 dos Estados Unidos), NegĂłcios e ComĂ©rcio (4 contra 7,7 da China) e RelaçÔes Internacionais (3,3 contra 7,1 dos Estados Unidos).

Os piores desempenhos, que impediram uma ascensĂŁo ainda maior no ranking, foram em Governança (2,2 contra 5,7 da Alemanha), Educação e CiĂȘncia (2,9 contra 8,6 dos Estados Unidos) e na resposta dada Ă  Covid (2,9 contra 6,5 da Suíça).

Brasil não lidera na América Latina em Governança e na resposta à Covid

Dos onze quesitos que compÔem o índice do soft power, na América Latina o Brasil só não liderou na Governança e na resposta à covid.

Em Governança, o Brasil ficou atrĂĄs do PanamĂĄ e da RepĂșblica Dominicana. JĂĄ na resposta Ă  Covid, foi superado por 14 dos 18 paĂ­ses latino-americanos analisados. A melhor resposta Ă  covid na regiĂŁo foi da Costa Rica, que recebeu nota 3,9.

No ranking regional, o Brasil foi seguido pela Argentina (38Âș lugar geral, subindo 3 posiçÔes), MĂ©xico (42Âș, subindo 2 posiçÔes) e ColĂŽmbia (48Âș, subindo 4 posiçÔes).

Os paĂ­ses considerados de menor soft power na regiĂŁo foram Trinidad e Tobago (120Âș, na Ășltima colocação do ranking), Honduras (118Âș lugar) e Guatemala (na 111ÂȘ posição).

No comparativo com os trĂȘs paĂ­ses de melhor desempenho na regiĂŁo em soft power, o Brasil ganha em dez quesitos, mas perde de todos na resposta Ă  Covid.

O desempenho do paĂ­s Ă© melhor do que a mĂ©dia global em oito quesitos, mas fica abaixo em Governança, Educação e CiĂȘncia e na resposta Ă  Covid, justamente os trĂȘs de pior desempenho relativo em relação Ă s melhores notas registradas na pesquisa.

A maior contribuição para a melhoria da pontuação geral veio do crescimento do quesito Familiaridade, que ganhou 0,7 pontos em relação ao ano anterior e chegou a 7,6. Isso indica que o país se tornou mais conhecido para a amostra global, causando um efeito positivo indireto em quase todas as métricas.

Foi o 12Âș maior nĂ­vel de familiaridade da pesquisa, empatado com AustrĂĄlia e Índia. Os Ășnicos paĂ­ses latino-americanos com nĂ­vel de familiaridade comparĂĄvel foram o MĂ©xico (17ÂȘ posição) e Argentina (20Âș lugar).

A melhor posição relativa foi obtida no quesito Cultura e PatrimĂŽnio Cultural, onde o Brasil ficou em 8Âș lugar, apesar da queda de 0,6 pontos em relação ao ano anterior, que reduziu sua nota para 4,6. Entre as caracterĂ­sticas analisadas nesse quesito, o Brasil obteve uma segunda colocação global como lĂ­der em esportes, logo atrĂĄs dos Estados Unidos. TambĂ©m foi considerado â€œinfluente em artes e entretenimento”, alĂ©m de oferecer “comida que o mundo adora”.

O Brasil tambĂ©m ficou no Top 20 global em Pessoas e Valores (18Âș lugar) e InfluĂȘncia (19Âș lugar). Entre as caracterĂ­sticas analisadas no quesito Pessoas e Valores, os brasileiros foram considerados o povo mais alegre do planeta, Ă  frente dos italianos e espanhĂłis, que completam o pĂłdio.

Brasil entre os que mais conquistaram posiçÔes

A entrada da Itålia no Top 10 representou uma subida de nove posiçÔes em relação ao ano anterior.

Foi uma ascensĂŁo significativa mas trĂȘs paĂ­ses fizeram um salto ainda maior. A UcrĂąnia, mesmo antes de conquistar a simpatia mundial por causa da agressĂŁo sofrida com a guerra, subira 10 posiçÔes, conquistando o 51Âș lugar.

A Espanha subiu 11 posiçÔes e quase entrou no Top 10. Saiu do 22Âș para o 11Âș lugar, logo atrĂĄs da ItĂĄlia. A RepĂșblica Dominicana saltou 12 posiçÔes, passando da 73Âș para a 61ÂȘ posição. Mas a subida mais impressionante foi a da NigĂ©ria, pulando do 82Âș ao 69Âș posto, abocanhando 13 posiçÔes pelo caminho.

O Brasil também fez bonito. Com as sete posiçÔes conquistadas, foi o que mais cresceu, logo depois dos cinco países citados.

Soft Power x Hard Power

A atual guerra da UcrĂąnia ilustra bem a diferença dos dois tipos de poderes. A RĂșssia acredita que com o uso apenas de seu hard power militar alcançarĂĄ seus objetivos. O resto do mundo acredita que o hard power econĂŽmico farĂĄ a RĂșssia desistir da empreitada.

Enquanto isso, a UcrĂąnia estĂĄ oferecendo uma aula do uso do soft power para influenciar a opiniĂŁo global, utilizando fatores como a diplomacia, seu povo, sua cultura, valores e a mĂ­dia para ganhar apoio.

A pesquisa, aliĂĄs, foi feita antes do inĂ­cio da guerra – o que fez com que a RĂșssia aparecesse na nona posição do ranking. A consultoria alerta que a invasĂŁo deve fazer com que os russos percam posiçÔes, enquanto o efeito contrĂĄrio deve ocorrer com a UcrĂąnia, que tinha ficado no 51Âș lugar.

ApĂłs o inĂ­cio do conflito, uma pesquisa suplementar foi encomendada para analisar esse efeito.

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Conceito de soft power surgiu na década de 90

O primeiro a formular o conceito de soft power foi Joseph Nye, em 1990. Ele argumentou existir um método alternativo de política externa para as naçÔes ganharem o apoio de outras.

Essa alternativa é baseada em reputação e valores, em vez do método tradicional de coerção baseada na força militar ou econÎmica. Isso ocorre porque as naçÔes, como os humanos, são mais propensos a confiar e colaborar com aquelas com quem compartilham ideais comuns.

Para chegar Ă  pontuação final, o Ă­ndice da Brand Finance considera 11 quesitos. Os trĂȘs principais sĂŁo Familiaridade, Reputação e InfluĂȘncia, que contribuem para a metade do escore.

A outra metade leva em conta a resposta dada Ă  Covid, que passou a ser considerada desde o ranking de 2021, e o desempenho nos setes pilares que demonstram o soft power de cada paĂ­s: Cultura, Pessoas e Valores, Governança, MĂ­dia e Comunicação, NegĂłcios e ComĂ©rcio, RelaçÔes Internacionais e Educação e CiĂȘncia.

Para o cĂĄlculo do resultado desses sete pilares, sĂŁo consideradas 34 caracterĂ­sticas.

Este ano a pesquisa adicionou 15 novos países, fazendo com que muitos países perdessem posiçÔes do ranking passado para os novatos.

Foram ouvidas mais de 101 mil pessoas de 101 países, não sendo contemplados apenas aqueles de tamanho diminuto ou que ofereciam dificuldades à realização da pesquisa, como no caso de Cuba e Irã. As entrevistas foram realizadas em 53 idiomas.

O relatĂłrio completo pode ser visto aqui.

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