No dia em que a invasão à Ucrânia completa quatro semanas, a Unesco anuncia novas medidas para apoiar e proteger jornalistas que ainda estão no país.

A agência da ONU, em parceria com organizações estrangeiras e locais que defendem a liberdade de imprensa, vai oferecer equipamentos de proteção individual (EPIs) e treinamentos focados para a orientação de profissionais de mídia que não são especializados em cobertura de guerra.

Desde o início do conflito entre Rússia e Ucrânia, ao menos quatro jornalistas já morreram e dezenas ficaram feridos em bombardeios ou ataques deliberados contra a imprensa

Muitos jornalistas locais da Ucrânia estão despreparados e desprotegidos

Enquanto mais de 150 jornalistas russos já deixaram o país por medo da guerra, muitos profissionais ficaram na Ucrânia para cobrir o conflito mesmo sem ter a experiência necessária e formas adequadas de se proteger de ataques.

Segundo a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês), a preocupação é maior com jornalistas ucranianos locais que anteriormente trabalhavam com outros temas e, com a invasão russa, foram empurrados para o papel de correspondentes de guerra, totalmente despreparados para os riscos que agora enfrentam.

Para dar mais segurança a esses profissionais, a Unesco anunciou o fornecimento de um lote inicial de 125 kits de equipamentos de proteção individual (EPI), compostos por coletes à prova de balas e capacetes.

Os equipamentos de proteção serão distribuídos a partir da próxima semana pela organição Repórteres Sem Fronteiras (RSF), por meio de seu Centro de Liberdade de Imprensa em Lviv, inaugurado nesta semana, e pela IFJ.

Audrey Azoulay, diretora-geral da Unesco, destacou a importância de proteger jornalistas e trabalhadores da mídia que arriscam suas vidas diariamente na Ucrânia para fornecer informações durante a guerra.

“Estamos determinados a apoiá-los e protegê-los de todas as maneiras possíveis. A Unesco está firmemente comprometida com isso desde o início da crise, em estreita colaboração com seus parceiros internacionais e profissionais locais.”

A diretora-geral da agência também solicitou apoio e recursos financeiros aos estados-membros da Unesco para ampliar a iniciativa na Ucrânia. 

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Treinamentos e linha direta para jornalistas em risco na Ucrânia

A agência da ONU também está traduzindo para o ucraniano e distribuindo em vários idiomas seu manual de treinamento para jornalistas em ambientes hostis, desenvolvido em conjunto com a RSF.

A medida é uma forma de treinar profissionais de mídia a lidarem com situações semelhantes às vividas na Ucrânia.

Além do manual, a Unesco está organizando cursos online sobre Meio Ambiente Hostil e Treinamento em Primeiros Socorros, bem como o trauma psicológico associado ao trabalho em uma zona de conflito, também em parceria com a IFJ e a RSF. Treinamentos presenciais devem ocorrer no centro de Lviv.

A organização trabalha para fornecer financiamento para que profissionais treinados possam estar disponíveis 24 horas por dia por meio de uma linha direta criada pelo Sindicato Nacional de Jornalistas da Ucrânia, à qual os jornalistas podem ligar se precisarem de ajuda para sair de uma zona de perigo.

Em outra frente, a Unesco está trabalhando com a IFJ para transferir os escritórios dos dois sindicatos de jornalistas da Ucrânia para a Polônia.

A realocação garantirá que o Sindicato Nacional de Jornalistas da Ucrânia (NUJU), com mais de 4 mil membros, e o Sindicato Independente de Mídia da Ucrânia (IMTUU), com cerca de 2 mil afiliados, possam continuar a fornecer apoio a todos os jornalistas na Ucrânia e aos que se refugiaram em países vizinhos.

Tropas russas tem atacado jornalistas intencionalmente na Ucrânia

Os primeiros dias de conflito na Ucrânia revelaram que a garantia de proteção a jornalistas durante a guerra está sendo violada por tropas russas.

Em 6 de março, tiros chegaram a centímetros da cabeça do fotógrafo suíço Guillaume Briquet quando supostos membros de um comando especial russo dispararam contra o carro onde ele viajava. 

O ataque ocorreu logo após o profissional de imprensa passar por um posto de controle ucraniano em uma estrada em direção à cidade de Mykolaiv, enquanto cobria o avanço russo na região.

Apesar das diversas sinalizações de “Imprensa” no carro e em seu colete à prova de balas, Briquet, um experiente repórter de guerra, foi abordado pelos soldados e teve 3.000 euros e os equipamentos de reportagem roubados.

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A RSF compilou outros relatos de profissionais de imprensa atacados por tropas russas enquanto cobriam a guerra na Ucrânia.

Dois jornalistas do canal de TV árabe Al-Araby com sede em Londres – o repórter Adnan Can e o cinegrafista Habip Demirci – ficaram sob fogo russo em Irpin, um subúrbio de Kiev, também em 6 de março.

Os tiros foram direcionados para o carro em que eles estavam, embora uma bandeira branca e placas de “Imprensa” estivessem afixadas no veículo. Presos em uma cidade onde ocorriam combates, eles tiveram que se abrigar com os moradores.

Uma equipe do canal de TV Sky News do Reino Unido – composta por quatro britânicos e um jornalista ucraniano – foi atacada por uma unidade de reconhecimento russa enquanto se dirigia para Bucha, nos arredores de Kiev, no quarto dia da invasão, 28 de fevereiro, mas o caso só foi divulgado quatro dias depois. 

O líder da equipe, o repórter Stuart Ramsay, sofreu um ferimento a bala na região lombar. O cinegrafista Richie Mockler também foi atingido com dois tiros em seu colete à prova de balas.

Depois de gritar que eram jornalistas e verem que o tiroteio não cessou, a equipe teve que abandonar o veículo e correr para se proteger até ser resgatada pela polícia ucraniana.

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