Londres – A emissora de TV estatal RT  (Russia Today), braço de propaganda do governo da Rússia com operações em vários idiomas e nações, teve sua licença para transmitir no Reino Unido revogada na manhã desta sexta-feira (18), com efeito imediato.

 A decisão foi tomada pelo Ofcom, órgão regulador de telecomunicações do país, sob o argumento de que o canal não é “adequado” nem “responsável” e que não opera com imparcialidade.

A emissora já que a emissora estava inacessível pela TV no Reino Unido devido às sanções da União Europeia que afetaram o operador de satélites com sede na Europa que distribui o canal em todo o continente. Mas a revogação da licença tem um peso político, colocando mais lenha na fogueira de tensões. 

TV estatal russa segue os passos da chinesa CGTN

Além de suspensa na União Europeia, a emissora de TV russa RT também tinha sido bloqueada no YouTube, junto com outros canais estatais russos, e em outras redes sociais. 

O Twitter citou uma política que proíbe conteúdo que negue, minimize ou banalize eventos violentos, enquadrando a guerra da Ucrânia nessa politica. 

Este não é o primeiro banimento de uma TV  estatal de um país com quem o Reino Unido tem relação tensa.

Em 2021, o Ofcom suspendeu a licença da emissora chinesa CGTN porque ela é oficialmente de propriedade do Partido Comunista e a legislação britânica não permite que agremiações políticas detenham controle de emissoras. 

Lei de fake news foi uma das razões para suspensão da TV russa 

Ao explicar o banimento da emissora russa, o Ofcom disse que levou em conta “uma série de fatores”, incluindo o fato de que o canal de notícias foi financiado pelo estado russo “que recentemente invadiu um país soberano”.

O regulador também citou novas leis na Rússia “que efetivamente criminalizam qualquer jornalismo independente que se afaste da própria narrativa de notícias do estado russo, em particular em relação à invasão da Ucrânia”.

Há duas semanas o parlamento russo aprovou uma draconiana lei para punir quem disseminar fake news a respeito da guerra ou dos atos do exército com até 15 anos de cadeia.

Assustados com os riscos para os seus profissionais, os principais veículos de imprensa globais retiraram seus jornalistas do país. A britânica BBC chegou a informar que também sairia, mas voltou atrás e continua transmitindo a partir da Rússia. 

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“Consideramos que, dadas essas restrições, parece impossível para a RT cumprir as regras de imparcialidade previstas pelo nosso Código de Radiodifusão”, acrescentou o regulador britânico.

A RT respondeu à decisão dizendo que a Ofcom se mostrou “nada mais do que uma ferramenta do governo, curvando-se à sua vontade de supressão da mídia”.

O governo russo e a mídia estatal controlada pelo regime de Vladimir Putin têm tachado os bloqueios e suspensões de transmissão e de acesso a plataformas digitais globais como atos de censura contra a Rússia. 

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RT mudou de nome para neutralizar associação com país

A RT foi criada em 2005 em Moscou. Usava o nome de Russia Today, mas adotou o nome encurtado que não sugere à primeira vista ser uma TV estatal. O grupo é formado por agências de notícias, sites e o canal de TV. 

Internacionalmente, há serviços em inglês, árabe e espanhol.  

O canal 24 horas britânico foi lançado em 2014, em uma esforço de soft power. Na grade das operadores a cabo, ficava posicionada ao lado de outros canais de notícias como a  BBC e a Sky News. 

Na época do lançamento da TV estatal russa, Richard Sambrook, ex-diretor de notícias globais da BBC e diretor do Centro de Jornalismo da Universidade de Cardiff, disse em uma entrevista ao The Guardian: “editorialmente, sua linha é claramente aquela que está sendo conduzida pela agenda do Kremlin.

Depois do episódio de envenenamento por Novichok do ex-espião russo Sergei Skripal e sua filha Yulia em Salisbury, na Inglaterra, em 2018, as tensões aumentaram.

O regulador de telecomunicações do Reino Unido, Ofcom, multou a rede por ter cometido sete violações do código de transmissão do país na cobertura do envenenamento. O órgão disse que as violações foram “uma grave falha de conformidade”, quebrando as regras de imparcialidade. 

A rede ficou inconformada e veiculou uma longa reportagem comparando sua atuação à de redes americanas e à britânica BBC, que para a RT fazem o mesmo: divulgam a visão de seus países no exterior. 

TV russa e agência de notícias barradas no baile 

Meses depois, em julho de 2019, a pressão veio do próprio governo. As agências de notícias RT e Sputkink foram proibidas de participar de uma conferência global sobre liberdade de mídia em Londres, que teve como uma das estrelas Amal Clooney, na época enviada especial do país junto às Nações Unidas. 

Cerca de 1 mil jornalistas e membros da sociedade civil, bem como 60 ministros do governo, participaram do encontro. Em um comunicado, o Ministério das Relações Exteriores britânico justificou a decisão:

“Não credenciamos o RT ou o Sputnik por causa de seu papel ativo na disseminação da desinformação. 

Embora não seja possível atender a todos os pedidos de credenciamento, jornalistas de toda a mídia mundial estão participando da conferência, inclusive da Rússia.”

O escritório não mencionou para quais agências trabalham os jornalistas russos aceitos para cobrir o encontro. 

Os meios de comunicação russos contra-atacaram, com a RT dizendo em um comunicado:

“É necessário um tipo particular de hipocrisia para defender a liberdade de imprensa enquanto proíbe vozes inconvenientes e calunia a mídia alternativa. Infelizmente, o mundo aprendeu a esperar exatamente isso do Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido.

Cancelamento da estatal russa na Europa

A Europa foi mais rápida na tentativa de conter a disseminação de propaganda estatal por emissoras de TV e rádio russas.

No dia 27 de fevereiro, a União Europeia proibiu a RT e também a agência de notícias e rede de rádio Sputnik no espaço europeu. 

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse:

“Já não poderão espalhar as suas mentiras para justificar a guerra de Putin”.

A medida, cobrindo todos os Estados Membros, já tinha sido tomada unilateralmente pela Lituânia, Letónia e Alemanha.

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