Londres – O Paquistão vive um momento de turbulência política com a eleição de um novo primeiro-ministro, Shehbaz Sharif, indicado ao cargo após a queda de Imran Khan, mas uma lei de censura à mídia acabou sendo vetada apesar das instabilidades atravessadas pelo país. 

O Supremo Tribunal de Islamabad (IHC, na sigla em inglês) considerou inconstitucional um projeto de lei apresentado pelo ex-premiê que incluía novos regulamentos para processar jornalistas. 

A Portaria de Emenda à Lei de Crimes Eletrônicos do Paquistão (PECA, em inglês) permitiria que qualquer pessoa registrasse queixa contra a publicação das chamadas notícias falsas em redes sociais e aumentaria a pena de prisão de três para cinco anos para os considerados culpados.

Veto a projeto de lei de censura é alívio para mídia do Paquistão

O juiz Athar Minallah, presidente do IHC, afirmou que a portaria, originalmente emitida em fevereiro de 2022, viola o artigo 19 da Constituição, que garante o direito à liberdade de expressão, bem como os artigos 9 e 14. Por isso, o projeto foi considerado inconstitucional e barrado no dia 8 de abril.

Na decisão, o juiz apontou que a liberdade de expressão e o direito de receber informações “são essenciais para o desenvolvimento, progresso e prosperidade de uma sociedade”. Por isso, a PECA foi considerada “inconstitucional e contrária aos valores democráticos”, segundo reportou a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ), que comemorou o veto à lei de censura à imprensa. 

“A criminalização da difamação, a proteção das reputações individuais por meio de prisão e prisão e o consequente efeito de intimidação violam a letra da Constituição e sua invalidade está além de qualquer dúvida razoável.”

“A Portaria de Prevenção de Crimes Eletrônicos (Alteração), 2022, e sua promulgação é declarada inconstitucional, inválida além de qualquer dúvida razoável e, portanto, é derrubada”, acrescentou o tribunal.

Ainda de acordo com o IFJ, o tribunal também ordenou que o Ministério do Interior investigasse as ações de oficiais da Ala de Crimes Cibernéticos da Agência Federal de Investigação, que resultaram em amplo abuso de poder e violação significativa dos direitos fundamentais dos indivíduos.

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As mudanças na PECA, apresentadas em fevereiro por meio de portaria, tornariam a divulgação de notícias falsas ou a difamação de qualquer pessoa ou instituição estatal online um crime inafiançável.  

“Foi importante trazer essa portaria para coibir as fake news. Espalhar notícias falsas agora se tornará uma ofensa inafiançável com até cinco anos de prisão”, disse Farogh Naseem, ministro federal de Direito e Justiça, na época.

Opositores políticos e defensores da liberdade de expressão denunciaram a medida como uma tentativa do governo do então primeiro-ministro Imran Khan de reprimir a liberdade de expressão, ameaçando também a imprensa do país.

A lei de difamação criminal foi originalmente promulgada em 2016 pelo governo do ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif e duramente criticada na época como um ataque a dissidentes e rivais políticos. 

Várias associações de jornalistas, incluindo a PFUJ, a Pakistan Broadcasters Association (PBA), a All Pakistan Newspapers Society (APNS), o Conselho de Editores de Jornais do Paquistão (CPNE), a Associação de Editores de Mídia Eletrônica e Diretores de Notícias (AEMEND) e alguns jornalistas de alto escalão do país apresentaram uma petição para revogar a portaria da PECA por meio do advogado paquistanês, Munir A Malik.

O presidente da AEMEND, Azhar Abbass, declarou que o veto é um passo importante para restaurar a liberdade de expressão no Paquistão.

No entanto, apesar de celebrar a decisão, ele defendeu que a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa ainda devem melhorar muito no Paquistão, onde acontecem seguidas tentativas de censurar a mídia independente. 

“Muito mais precisa ser feito para que os jornalistas e a sociedade civil tenham total liberdade. Uma mídia livre e independente é essencial para a democracia sustentada e o estado de direito”, disse Abbass.

Para a IFJ, a “derrubada histórica” do projeto de lei é um avanço para restaurar os direitos de jornalistas no Paquistão:

“No entanto, há uma extrema necessidade de aumentar os esforços para garantir que todos os jornalistas e profissionais de mídia paquistaneses gozem de independência irrestrita.”

Paquistão aprova lei de proteção a profissionais de mídia 

Apesar de tentar censurar a mídia por meio da lei de controle das fake news em redes sociais, em novembro do ano passado, o Paquistão aprovou uma lei de proteção a jornalistas e profissionais de mídia, destinada a garantir segurança, privacidade, sigilo das fontes e independência no exercício das funções profissionais.

Apesar de ser vista por muitos como um avanço, a nova lei de mídia do Paquistão não agradou a todos.

Alguns membros da oposição, mesmo sendo a favor do projeto de lei, reclamaram que o governo e o presidente do Senado, Sadiq Sanjrani, não o enviaram para avaliação e contribuições de outros partidos políticos e da comunidade jornalística. 

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