A semana termina com saldo negativo para o antes promissor mercado de streaming. Menos de um mês após seu lançamento, a CNN+ será encerrada no dia 30 de abril, confirmando os bastidores adiantados pelo Axios de que as coisas não iam bem com a plataforma.

O fim do streaming da emissora de notícias chegou apenas dois dias depois da Netflix divulgar a queda no número de assinantes pela primeira vez em uma década — acendendo o alerta para a saturação no ramo de catálogos audiovisuais online.

Num momento de ampla oferta de produtos similares, fica claro que os consumidores começam a ser mais seletivos sobre o que estão dispostos a pagar, diferente do tempo em que streaming era sinônimo de Netflix.

Fim da CNN+ anunciado por novo CEO mexe com mercado de streaming

O encerramento da CNN+ foi anunciado na quinta-feira (21) pelo novo CEO do canal, Chris Licht, em comunicado aos funcionários da companhia. Segundo ele, a decisão foi tomada pelos novos executivos da Warner Bros. Discovery (WBD).

“À medida que nós nos tornamos a Warner Bros. Discovery, a CNN será mais forte como parte da estratégia de streaming da companhia, que vê as notícias como uma parte importante de uma oferta mais ampla e atraente, juntamente com conteúdo de esportes, entretenimento e produções de não ficção”, afirmou o chefe da CNN.

“Embora a decisão de hoje seja incrivelmente difícil, é a mais acertada para o sucesso de longo prazo da CNN.”

“Tomamos a decisão de encerrar as operações da CNN+ e focar nosso investimento nas principais operações de coleta de notícias da CNN e na construção da CNN Digital”, acrescentou Licht.

Tida como a salvação do canal a cabo, o fim da CNN+ mexe com as funções dentro da empresa. Andrew Morse, diretor digital da CNN e um dos principais responsáveis pela criação e lançamento da plataforma, deixa o cargo. Alex MacCallum, ex-diretor de programação, assume o comando da renomeada CNN Digital.

Segundo a emissora, todos os funcionários da CNN+ serão afastados, mas continuarão a receber salários e benefícios pelos próximos 90 dias.

Alguns devem ser remanejados dentro da própria emissora, enquanto outros serão demitidos. No ano passado, a CNN anunciou a contratação de mais de 200 profissionais, com previsão de chegar a 450 novos funcionários para a plataforma.

Entre as contratações que ainda estão sem destino confirmado, estão grandes estrelas da mídia dos EUA, como o ex-âncora do “Fox News Sunday”, Chris Wallace, e a ex-apresentadora do “All Things Considered”, da rede NPR, Audie Cornish.

O destino dos programas da CNN+ também permanece incerto. Segundo o New York Times, vários títulos devem ser movidos para HBO Max, Discovery+ ou CNN.com, disseram duas pessoas familiarizadas com as discussões.

Os assinantes existentes receberão reembolsos proporcionais ao período de contratação do serviço.

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Axios já tinha adiantado problemas com CNN+

Os problemas da CNN+ já tinham sido adiantados pela jornalista Sara Fischer em apuração para o jornal Axios, confirmando os rumores que circulavam no mercado sobre as dificuldades da plataforma.

Em três semanas, o streaming teve apenas 150 mil assinantes. A baixa aceitação entre o público motivou o corte nos investimentos de marketing externo e a queda do diretor financeiro da CNN, Brad Ferrer, reportados no início da semana.

A jornalista, inclusive, antecipou antes mesmo dessa dança das cadeiras que a plataforma corria riscos de “grandes cortes”.

Fischer citou a emissora CNBC que indicou que “menos de 10 mil pessoas estão usando a CNN+ diariamente duas semanas após sua existência, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto”.

A verdade é que o lançamento da CNN+ desagradou os executivos da Warner Bros. Discovery (WBD), novo nome da empresa após a fusão da WarnerMedia (dona da CNN) e Discovery Inc., concluída em 8 de abril.

Dentro da CNN, os executivos achavam que a plataforma foi lançada no momento certo e, até então, tudo corria bem. No entanto, os chefes da Discovery discordavam.

O plano original era que a CNN+ se tornasse lucrativa em quatro anos, com investimento de US$ 1 bilhão no serviço.

Os executivos do canal ainda miravam em rivalizar com grandes concorrentes do jornalismo impresso em número de assinaturas no streaming.

Mas dados internos acessados pelo Axios mostram que os programas que se saíram melhor foram aqueles que reproduziram os do canal de TV ao vivo, como “5 coisas com Kate Bolduan” e “Reliable Sources Daily”, de Brian Stelter.

Do lado da Discovery, a percepção era de que a CNN deveria ter adiado o lançamento da plataforma de streaming até depois da fusão, pois seria “mais fácil direcionar os esforços da empresa para algo mais alinhado com os objetivos da Discovery.”

O objetivo principal dos executivos da Discovery que agora operam na CNN é devolver a empresa ao seu núcleo jornalístico, ou seja, nada de conteúdo leve e variedades na plataforma de streaming — o que, infelizmente para a CNN+, era a maior aposta de seu catálogo.

A nova gestão quer se concentrar em uma oferta de entretenimento geral em torno do HBO Max, em vez de mais serviços nichados que precisam competir com outros grandes aplicativos pelo dinheiro do assinante.

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Netflix perde assinantes, projeta mais prejuízos e despenca na bolsa

O fim abrupto da CNN+ foi anunciado dois dias após a Netflix divulgar a primeira queda em mais de uma década no número de assinantes. A empresa ainda projeta que perderá mais dois milhões de usuários pagantes nos próximos três meses.

A plataforma perdeu 200 mil assinantes no primeiro trimestre de 2022 — abaixo de suas projeções que indicavam a adição de 2,5 milhões de usuários. Atualmente com 221,6 milhões de assinantes, a última vez que a Netflix perdeu clientes foi em outubro de 2011.

Após a notícia, as ações da empresa caíram 25%, resultando em uma perda de US$ 30 bilhões em valor de mercado.

O cenário levanta sérias questões para o mercado de streaming: afinal, quantas pessoas estão dispostas a pagar por vários serviços de streaming? E quão lucrativas essas empresas ainda podem se tornar nos próximos anos?

Em comunicado aos investidores, a Netflix atribuiu os maus resultados ao compartilhamento de senhas entre usuários, a forte concorrência e o conflito na Ucrânia. A decisão da empresa de suspender serviço na Rússia por causa da guerra resultou na perda de 700 mil assinantes.

“O grande número de residências compartilhando contas, junto com a competição, está criando obstáculos para o crescimento da receita. O grande impulso gerado pela covid-19 no mercado de streaming obscureceu este quadro até recentemente”, diz o texto. 

A empresa estima que mais de 100 milhões de lares compartilham senhas. Por isso, a plataforma disse que vai trabalhar para coibir a prática com o objetivo de retomar seu crescimento.

Segundo a BBC, medidas para evitar o compartilhamento de senhas foram testadas em regiões como a América Latina e podem ser estendidas a outros países, cobrando mais de quem descumprir as regras.

“Quando estávamos crescendo rápido, isso não era uma prioridade (compartilhamento de contas). Agora estamos trabalhando muito nisso”, afirmou o CEO da Netflix, Reed Hastings, aos acionistas.

Lucas Shaw, colunista do “Screentime” para a Bloomberg, disse à BBC que o compartilhamento de senhas era um problema para a Netflix “há muito tempo”, mas estava longe de ser o seu maior desafio.

“Parece que a empresa está tentando identificar uma área de potencial crescimento. No passado, eles tentaram combater o compartilhamento de senhas e não foram bem sucedidos.”

Mesmo com as dificuldades, a Netflix continua sendo a líder mundial em serviços de streaming — posto ameaçado por gigantes de peso que entram nos últimos anos no mercado, como Amazon, Apple e Disney.

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