O ex-presidente Barack Obama, uma das figuras públicas mais conhecidas e influentes do planeta, entrou na briga pela regulamentação das redes sociais com o objetivo de combater a desinformação. 

Obama expressou grande preocupação com os impactos das fake news nas instituições democráticas. E demostrou arrependimento por não ter feito mais durante seus mandatos para frear o crescimento de movimentos conspiratórios que descredibilizaram as eleições em 2016 e 2020.

“Uma das maiores razões para o enfraquecimento da democracia é a profunda mudança que ocorreu na forma como comunicamos e consumimos informações”, disse. “As pessoas estão morrendo por causa da desinformação”, afirmou Obama.

Obama alerta sobre impactos da desinformação na democracia

Em discurso na Universidade de Stanford, o ex-presidente dos Estados Unidos alertou sobre os riscos da proliferação de desinformação nas plataformas e a ameaça à democracia. 

Barack Obama fez a defesa da regulamentação como orador  principal do simpósio “Desafios para a democracia no reino da informação digital”, realizado pelo Centro de Políticas Cibernéticas de Standford e a Fundação Obamana Universidade de Stanford no dia 21 de abril. 

Falando para uma plateia lotada por 60 minutos, o ex-presidente defendeu que as empresas de tecnologia devem ser regulamentadas para frear o processo de “enfraquecimento das instituições democráticas em todo o mundo”.

Segundo ele, as big techs, por meio de suas plataformas de redes sociais, estão “turbinando alguns dos piores impulsos da humanidade”.

“O próprio design destas plataformas parecem nos colocar na direção errada”, analisou.

O discurso foi feito num momento em que Obama concentra cada vez mais suas mensagens na desinformação e no que deve ser feito sobre o poder amplamente descontrolado exercido por grandes empresas de tecnologia.

Por isso, ele intensificou os apelos para uma legislação específica para as redes sociais.

“Permitimos que nossa democracia definhe ou a tornamos melhor?” questionou. “Essa é a escolha.”

Obama também chamou a atenção para os graves impactos da desinformação e fake news – incluindo a manipulação das eleições de 2016 e 2020, e o aumento dos movimentos antivacina que ganharam ainda mais força durante a pandemia de coronavírus.

“O fato de os cientistas terem desenvolvido uma vacina segura e eficaz em tempo recorde é uma conquista inacreditável.”

“No entanto, apesar disso que sabemos por testarmos clinicamente a vacina em milhões de pessoas em todo o mundo, cerca de um em cada cinco americanos ainda está disposto a colocar a si e suas famílias em risco em vez de se vacinar”, afirmou o ex-presidente dos EUA. 

Impacto das fake news nas eleições dos EUA

Barack Obama foi sincero sobre os arrependimentos que tem em torno da eleição de Donald Trump, dizendo que seu governo sabia há muito tempo que a Rússia agia para manipular a democracia dos EUA, mas subestimou a eficácia dos esforços.

“O que ainda me incomoda é minha incapacidade de avaliar na época o quão suscetíveis nos tornamos a mentiras e teorias da conspiração.”

Um relatório do Senado americano de 2020 concluiu  que a Rússia havia interferido nas eleições de 2016 para influenciar os votos a favor de Trump, confirmando o que apontou um relatório anterior divulgado pelo Departamento de Justiça.

Além de impactar os resultados, a desinformação e as fake news também fizeram com que “muitos americanos rejeitassem os resultados de eleições democraticamente sólidas”, disse Obama – observando que a maioria dos republicanos duvida da legitimidade da vitória de Biden em 2020.

Para o ex-presidente, muitos desses problemas podem ser atribuídos a um declínio na alfabetização midiática, à erosão das fontes de notícias locais e a uma “sobrecarga de informação” à medida que entramos em contato com conteúdo ilimitado todos os dias.

“A pura proliferação de conflitos, fragmentação de informações e audiências [nas redes sociais] tornaram a democracia mais complicada”, disse Obama.

Obama declarou ainda que a desinformação é uma “ameaça à democracia”, citando o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e um dos aliados de Trump, Steve Bannon.

“Eles compreendem que não é necessário que as pessoas acreditem em uma informação para enfraquecer as instituições democráticas.”

“Precisam apenas inundar a praça pública de um país com esgoto. É preciso levantar questões suficientes, espalhar lama o suficiente, implantar teorias de conspirações suficientes para que os cidadãos já não saibam no que acreditar.”

“Assim que percam a confiança nos seus líderes, na mídia, nas instituições políticas, uns nos outros, na possibilidade da verdade — o jogo está ganho”.

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Para frear desinformação, Obama sugere mudanças em modelos de negócios

Obama mirou nos modelos de negócios das grandes empresas de tecnologia, observando que “conteúdo inflamatório atrai engajamento” e que “o véu do anonimato que as plataformas fornecem” facilita a disseminação de informações erradas.

Por isso, ele afirmou que uma regulamentação sólida é necessária para abordar os modelos de negócios das empresas de mídia social e a maneira como elas projetam seus produtos.

“Essas empresas precisam ter outra estrela norte além de apenas ganhar dinheiro e aumentar a participação de mercado.”

Em particular, Obama criticou os algoritmos usados pelas plataformas, defendidos pelas big techs como “segredos comerciais”. O ex-presidente disse que esses mecanismos “precisam estar sujeitos a algum nível de supervisão e regulamentação pública”.

Para fazer isso, Obama demonstrou apoio a um projeto de lei apresentado pelos senadores dos EUA Chris Coons, Amy Klobuchar e Rob Portman que exigiria que as empresas de mídia social compartilhassem determinados dados da plataforma e permitissem a verificação de pesquisadores independentes.

“Como a maior democracia do mundo, temos que dar um exemplo melhor. Devemos estar na liderança dessas discussões internacionalmente, não na retaguarda”.

“As redes sociais são uma ferramenta. No final das contas, as ferramentas não nos controlam, nós as controlamos. Cabe a cada um de nós decidir o que valorizamos e então usar as ferramentas que recebemos para promover esses valores.”

Assista ao discurso de Barack Obama na íntegra:

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