Paris – Sylvia Zappi, subeditora de cultura do Le Monde, é uma das que luta por inclusão e diversidade na redação do jornal francês, um dos mais importantes do mundo. Ela conhece o tema: é moradora de um dos subúrbios parisienses onde houve a revolta popular que ganhou as manchetes do mundo em 2005.

Em 2012, a jornalista começou a cobrir os “banlieues” (subúrbios) para o jornal, escrevendo sobre os problemas que todos conheciam mas também retratando aspectos positivos, como a história de uma associação que distribuía material escolar para crianças necessitadas.

Em uma entrevista para o Especial MediaTalks Diversidade, ela contou que o simples fato de morar lá e conhecer a realidade local “muda o olhar”. Conheça suas reflexões sobre o tema.

Um novo olhar para um jornalismo mais inclusivo

Tratamento mais equilibrado para ‘o que não vai bem’

“Morar no subúrbio permitiu enxergar que havia muitas histórias não contadas na imprensa. Isso não significa deixar de reportar notícias sobre coisas que não vão bem, como problemas com drogas, tráfico e assaltos. Às vezes, significa dar um tratamento mais equilibrado a elas.”

Relação diferente com a notícia

“Pessoas que tiveram experiências de discriminação não escrevem o mesmo tipo de artigo daquelas que não tiveram. Elas têm uma relação diferente com a notícia, uma visão diferente sobre o que está acontecendo na sociedade. Tê-las nas redações é uma riqueza a mais.”

Poucos negros e árabes nos impressos

“Os jornais franceses ainda penam para diversificar as redações. Mas em televisões privadas, como LCI e BFM, os avanços são notáveis, com a contratação de repórteres negros e de outras origens.

No Le Monde, de uma redação de 400 jornalistas, negros e pessoas de origem árabe não passam de 10 ou 15. A lentidão em mudar é causada por um ‘duplo bloqueio’.”

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Barreiras para o jornalismo inclusivo

Primeiro bloqueio: as escolas elitistas

“A imprensa em geral, escrita ou televisiva, recruta à sua imagem. A maioria dos jornalistas franceses são provenientes de 14 escolas reconhecidas pelo mercado.

São escolas de excelência com concursos muito exigentes, principalmente em Paris e em grandes cidades como Lille, Bordeaux e Lyon. Assim, são os filhos da burguesia os recrutados para essas escolas. Eles já chegam para a disputa privilegiados por um forte capital cultural.

Começa a haver uma mudança, com algumas escolas criando também um sistema de aprendizado em jornalismo. Mas é uma mudança tímida.”

Segundo bloqueio: o recrutamento nas redações

“No Le Monde, começamos a recrutar com base no critério de aprendizagem, integrando à equipe jovens que não vinham das grandes escolas de jornalismo.

E também começamos a recrutar salientando o desejo de aumentar a diversidade étnica, com a inclusão de profissionais de diferentes origens: norte-africanos, negros, mestiços e asiáticos. Mas é um pequeno fio de água.

Teremos que continuar pressionando.”


Esta matéria faz parte do Especial MediaTalks Diversidade na Mídia. Leia a edição completa aqui

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