A Coalizão para Mulheres no Jornalismo (CFWIJ, na sigla em inglês) divulgou o balanço de um mês sombrio para as jornalistas, com cinco mortes e uma série de violações ocorridas ao longo de maio. 

Ao menos cinco mulheres jornalistas foram assassinadas no México, Chile, Palestina e Afeganistão, fazendo do mês o mais mortal para as profissionais da mídia neste ano. 

Além dos atentados letais, a ONG também destaca que profissionais foram vítimas de pelo menos 40 casos de graves violações da liberdade de imprensa, como prisões arbitrárias, assédio legal, físico e sexual, violência online, ameaças, intimidação e a deportação de uma profissional britânica no Afeganistão. 

Mulheres jornalistas são assassinadas durante ou por causa do trabalho

Aas violações documentadas pela CFWIJ nesse período confirmam que as mulheres correm mais riscos do que os homens no exercício da profissão jornalística.

Das cinco mulheres jornalistas assassinadas em maio, quatro morreram num espaço de quatro dias

Para a CFWIJ, são as mulheres jornalistas que mais enfrentam graves ameaças à sua segurança, representadas tanto no mundo online quanto no offline:

“[São ameaças que vão] desde desinformação e campanhas de descrédito enraizadas na misoginia e sexismo até problemas mais sérios, como o assédio do Estado.

Os problemas que as mulheres jornalistas enfrentam não são amplamente reconhecidos. As redações costumam ficar de boca fechada sobre eles; os governos tomam poucas medidas para combater as violações contra mulheres jornalistas.”

Em maio, as primeiras mortes registradas foram das jornalistas mexicanas Yessenia Mollinedo Falconi e Sheila Johana García Olivera, diretora e repórter do portal de notícias online El Veraz, respectivamente. Elas foram baleadas do lado de fora de uma loja de conveniência em 9 de maio.

O atentado tem claras indicações de ser algo planejado e direcionado a elas, pois ambas sofriam ameaças por causa da cobertura de crimes locais.

jornalista assassinado assassinato México liberdade de imprensa crime jornalista
Sheila García Olivera e Yessenia Mollinedo Falconi (Foto: Reprodução/Twitter)

A organização destaca que o aumento acentuado da violência contra jornalistas no México é alarmante. “A imprensa enfrenta ameaças de grupos armados, elite econômica e política influente, bem como elementos criminosos”, diz a CFWIJ.

Quatro dos 11 jornalistas mortos no México em 2022 eram mulheres. Profissionais de veículos pequenos e regionais como o El Veraz, onde Yessenia e Sheila trabalhavam, são maioria entre os crimes contra profissionais de mídia registrados no país.

O irmão de Yessenia, Ramiro Mollinedo Falconi , que também é jornalista, disse que foi repetidamente ameaçada pela cobertura de crimes por El Veraz. Os jornalistas locais denunciam a negligência do Estado que faz pouco ou, em muitos casos, nada para protegê-los.

Leia mais

Antes de manifestação contra 9ª morte, duas mulheres jornalistas são assassinadas no México

Morte de jornalista na Palestina choca e revolta o mundo

Apenas dois dias depois da morte das jornalistas mexicanas, as imagens do assassinato da repórter palestino-americana correspondente veterana da Al Jazeera Shireen Abu Akleh chocaram o mundo, provocando grande revolta da população que acompanhava há duas décadas seu trabalho na TV.

A jornalista foi baleada na cabeça enquanto cobria um ataque das Forças de Defesa de Israel (IDF) em Jenin, na Cisjordânia ocupada, no dia 11 de maio. Ela chegou a ser socorrida para um hospital, mas teve a morte declarada pouco tempo depois.

Um vídeo desse momento foi compartilhado no Twitter por um colega de Shireen. Acompanhado de outros profissionais de imprensa, que estavam no local identificados com os tradicionais coletes usados em coberturas de riscos, as imagens mostram o desespero e choro deles ao saberem da morte da repórter.

O estado israelense inicialmente alegou que Shireen foi morta por palestinos, mas depois admitiu que uma bala de soldado israelense poderia ter atingido a jornalista durante um suposto fogo cruzado.

Análises feitas por veículos jornalísticos como a AP, CNN e outros apoiam as declarações de testemunhas oculares de que a repórter da Al Jazeera foi morta de forma deliberada pelas tropas de Israel.

O dia do enterro de Shireen também foi de grande comoção e conflitos para os palestinos.

O que era para ser uma cerimônia fúnebre acabou virando protesto, com confrontos violentos entre palestinos e a polícia israelense. Isso porque o caixão de Abu Akleh foi coberto com uma bandeira da Palestina durante o cortejo.

A pressão sobre Israel para que o caso seja investigado uniu mais de 30 grupos de direitos humanos e defensores da liberdade de imprensa e a família da jornalista.

Leia mais

ONGs exigem que Israel investigue morte de repórter da Al Jazeera; Tribunal de Haia será acionado

Shireen Abu Akleh, jornalista da Al Jazeera morta na Palestina

Mortes de jornalistas no Chile e Afeganistão também marcam o mês de maio

Francisca Sandoval, repórter da emissora local Canal Señal 3 La Victoria, foi baleada na cabeça enquanto cobria os protestos do Dia do Trabalho em Santiago, no Chile, em 1º de maio.

Ela ficou gravemente ferida e, após 12 dias internada, não resistiu aos ferimentos. A jornalista de 30 anos foi a primeira profissional de imprensa morta no país desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet, em 1990.

Um protesto contra a morte de Francisca, convocado por entidades e estudantes de jornalismo, registrou confrontos com a polícia na Plaza de la Dignidad. No Twitter, o Señal 3 La Victoria compartilhou imagens de forças policiais dispersando os manifestantes com jatos d’água.

No fim de maio, a ONG CFWIJ contabilizou o quinto assassinato de uma jornalista mulher no mês, dessa vez no Afeganistão.

Maryam Madadi, que trabalhou na estação de rádio afegã Rabia Balkhi, foi morta em uma série de explosões que atingiram a cidade de Mazar-e-Sharif, no dia 25. 

Pelo menos nove pessoas morreram no bombardeio e outras 15 ficaram feridas. O Estado Islâmico reivindicou a responsabilidade pelos ataques.

Maryam e todas as outras vítimas dos atentados foram declaradas como pertencentes às comunidades étnicas e religiosas discriminadas pelo grupo fundamentalista.

Além de assassinadas, mulheres jornalistas também são presas

O mês de maio também registrou um triste marco para as mulheres jornalistas no Irã e na Etiópia, países que, somados, registraram cinco prisões de profissionais da mídia.

Nos dias 9 e 10 de maio, o serviço de inteligência iraniano prendeu as cineastas Firoozeh Khosravani, Mina Keshavarz, Shilan Assadi e a fotógrafa Reyhaneh Taravati, sem divulgar as acusações contra elas, segundo informações da CFWIJ.

Já a editora fundadora da emissora Ethio Nekat Media, Meskerem Abera, foi presa no dia 21 de maio acusada de incitar a violência pública por meio de suas aparições na mídia etíope.

Em outra forma de repressão cada vez mais comum por governos autoritários que querem silenciar a imprensa, oito mulheres jornalistas foram detidas e liberadas após algumas horas ou dias na cadeia.

Os casos aconteceram na Turquia (1), Rússia (3), Zimbábue (1), Etiópia (2) e Afeganistão (1).

Outras seis mulheres jornalistas enfrentaram repressão estatal e assédio legal na Rússia (1), Sérvia (1), Turquia (3) e Grécia (1).

Acesse o relatório completo da CFWIJ com os detalhes sobre as violações contra a imprensa e as profissionais mulheres neste link.

Leia também

Jornalistas são detidos e liberados horas depois, em nova forma de coerção pela Rússia na Ucrânia

Mulheres enfrentam ataques onlines organizados e deportação

No Afeganistão, as autoridades do Talibã restringiram a premiada jornalista do site americano Vice Isobel Yeung de trabalhar em Cabul e a instruíram a deixar o país “imediatamente”, segundo informações da CFWIJ.

Ela também foi impedida de sair do hotel depois que chegou à cidade e, segundo a jornalista, o Talibã citou problemas com uma reportagem dela sobre violações dos direitos das mulheres no país.

As ordens de deportação para a repórter e sua equipe vieram dias após uma nova ordem do grupo fundamentalista para que as mulheres cubram seus rostos em público e para que jornalistas do sexo feminino façam o mesmo no ar.

A medida foi amplamente contestada pelas profissionais e entidades que defendem a liberdade de imprensa.

Também em maio, pelo menos cinco mulheres jornalistas enfrentaram ataques online organizados na Turquia, país que avança rapidamente em restringir os direitos da imprensa.

A jornalista Seda Taşkın recebeu ameaças de morte nas redes sociais por causa de sua cobertura do funeral do proeminente compositor musical Ahmet Say.

Já as jornalistas Nevşin Mengü, Burcu Karakaş, Suzan Demir e Neşe İdil foram alvos de ataques feitos por apoiadores do Partido Zafer (Vitória), um grupo de direita, por criticarem um curta-metragem com mensagens contra refugiados.

Ameaças e intimidações às profissionais usaram linguagem racista e misógina, de acordo com a ONG.

Leia também 

Como o ‘Ni Uma Menos’ foi divisor um de águas na cobertura de questões de gênero na Argentina