Londres – Em mais um ato de perseguição à imprensa independente fora de suas fronteiras, o Ministério da Justiça da Rússia incluiu os sites de jornalismo investigativo Bellingcat e The Insider na lista de “organizações indesejáveis” no país. 

A notícia foi confirmada pela agência oficial estatal Tass nesta terça-feira (26). A organização de defesa dos direitos humanos Instituto Checo para a Iniciativa Jurídica da Europa Central e Oriental (Instituto CEELI) também foi adicionada à lista. 

Os dois sites já eram classificados como “agentes estrangeiros”, operam fora da Rússia e foram bloqueados logo após a invasão à Ucrânia, o que significa que a medida tem mais efeito político do que prático. Mas ela poderá ser usada para censurar conteúdos produzidos por eles e disseminados por outros meios.  

60 ‘indesejáveis’ na Rússia 

Organizações indesejáveis ​​são proibidas de funcionar no território russo, sob a ameaça de sanções administrativas e criminais. O site independente Meduza contabiliza 60 organizações classificadas dessa forma. 

A agência Tass informou que a decisão do Ministério da Justiça de adicionar mais três foi tomada pelo Procurador-Geral Adjunto com fundamento na lei federal que dispõe a respeito de “medidas de influência sobre pessoas envolvidas em violações de direitos humanos e liberdades fundamentais, direitos e liberdades dos cidadãos da Federação Russa”

Conforme declarado pelo Gabinete do Procurador-Geral sobre as três organizações classificadas com indesejáveis, “suas atividades representam uma ameaça aos fundamentos da ordem constitucional e à segurança da Federação Russa”.

Perseguição a quem se associar aos ‘indesejáveis’ na Rússia 

A cooperação com essas organizações também é sujeita a processo criminal. Sob este dispositivo legal, o órgão regulador de mídia do país, o Roskomnadzor, pode exigir que outras organizações de mídia ainda não bloqueadas removam conteúdos produzidos ou associados ao Bellingcat ou ao The Insider. 

As colaborações entre veículos de mídia independentes em investigações jornalísticas são comuns, não apenas na Rússia mas em todo o mundo, ajudando a desvendar casos de crimes transnacionais. 

Segundo a Tass, o chefe do Serviço de Inteligência Estrangeira, Sergei Naryshkin, disse que o The Insider, o The Project (outro site independente reconhecido como uma organização indesejável na Federação Russa), o Important Stories (reconhecido como agente estrangeiro), bem como as os canais do blogueiro e ativista político Alexei Navalny estão associados ao Bellingcat, “que emprega ex-oficiais de inteligência e cujas informações são usadas para pressionar a Rússia.”

Veículos críticos ao regime da Rússia desde antes da guerra 

Com operações na Holanda e no Reino Unido, o Bellingcat é um dos mais reconhecidos e premiados projetos de jornalismo investigativos do mundo.  

Foi fundado pelo jornalista britânico Eliot Higgins em 2014, reunindo pesquisadores, investigadores e jornalistas cidadãos que usam código aberto e buscas em mídia social para apurar diversos assuntos – desde traficantes mexicanos e crimes contra a humanidade até o uso de armas químicas e conflitos. 

O The Insider foi criado na Rússia pelo jornalista e ativista Roman Dobrokhotov, mas agora tem sua redação baseada em Riga, capital da Letônia.

O site costuma colaborar com o Bellingcat. O Insider ajudou a expor os agentes da inteligência russa envolvidos na tentativa de assassinato de Navalny, um dos maiores opositores de Vladimir Putin,  que foi condenado e cumpre pena na Sibéria. 

Em uma entrevista sobre a forma de operação dos veículos independentes russos em 2021, Dubrokhotov disse que o Insider foi criado para funcionar “em um ambiente muito tóxico”. 

“A equipe se encontra uma vez por semana em um espaço de co-working e parte sem deixar rastros. 

Não temos um escritório onde os agentes secretos possam confiscar computadores. Para sobreviver na Rússia, os meios de comunicação precisam ser pequenos e muito móveis.”

Em 2021, ele sofreu perseguição por ter denunciado que Alina Kabaeva, campeã olímpica de ginástica e supostamente amante de Putin, recebia um salário anual de 785 milhões de rublos (R$ 53 milhões) em um cargo estatal para o qual não tinha experiência relevante.