No quarto crime violento contra a imprensa no Haiti este ano, os jornalistas Tayson Latigue e Frantzsen Charles foram baleados e tiveram seus corpos queimados por integrantes de gangues. Um quinto profissional de imprensa morreu no país em 2022, baleado durante um protesto.   

Latigue e Charles foram capturados no domingo (15) quando faziam uma reportagem no conflagrado distrito de Cité Soleil, em Porto Príncipe, junto com outros cinco profissionais de imprensa. Os demais conseguiram escapar dos criminosos. 

Segundo a Associação de Jornalistas Independentes do Haiti, eles investigavam o agravamento da violência na região, incluindo o assassinato de uma menina de 17 anos, e teriam sido emboscados por duas gangues rivais. Os corpos não foram recuperados.

Jornalistas assassinados em clima de “insegurança catastrófica”

“O clima de insegurança para a imprensa haitiana é catastrófico. As autoridades nacionais devem fortalecer seus mecanismos de proteção à profissão, em particular aos jornalistas independentes e à imprensa online, cujo trabalho de informação é fundamental para a população haitiana, declarou Emmanuel Colombié, diretor do escritório da Repórteres Sem Fronteiras (RSF) para a América Latina.

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Emmanuel Colombié, diretor da RSF América Latina (divulgação / Senado Brasil)

“Os responsáveis ​​pela execução covarde de Tayson Latigue e Frantzsen Charles devem ser identificados e levados à justiça o mais rápido possível.

A impunidade quase total pelos assassinatos e desaparecimentos de jornalistas no Haiti está na raiz desse círculo vicioso de violência contra a imprensa. O governo de Ariel Henry deve interromper essa espiral infernal.”

Segundo acompanhamento da Unesco, o novo crime eleva para 61 o número de jornalistas assassinados ou que perderam a vida a serviço no mundo este ano, dos quais três no Brasil e 30 na América Latina. O México segue como o país mais perigoso para a imprensa, com 17 casos. 

Em janeiro, outro crime semelhante chamou a atenção para a violência contra jornalistas que documentam as gangues no Haiti. Os jornalistas Wilguens Louissaint e Amady John Wesley foram baleados e também teriam sido queimados vivos.

Dois meses depois, o fotojornalista Maxihen Lazzare foi atingido fatalmente quando um grupo armado abriu fogo contra manifestantes em um protesto por aumento do salário mínimo.

Crime vitimou jornalistas de veículos digitais

Latigue era o fundador da publicação digital Ti Jenn Jounalis, enquanto Charles era repórter do site FS News Haiti.  

De acordo com uma fonte local consultada pela RSF, existe uma espécie de discriminação contra os jornalistas da mídia online no país.

“Eles não são realmente considerados como jornalistas e são acusados ​​de se exporem a riscos sem sentido por falta de profissionalismo (…). Alguns jornalistas independentes também são suspeitos de serem aliados de bandidos.”

Em um comunicado, o FS News anunciou a morte de seu jornalista e exigiu justiça.

Uma reportagem do site descreve Frantzsen Charles,de 27 anos como “um apaixonado pelo jornalismo, que acreditava que poderia participar da mudança do país usando sua câmera e seu microfone”, mas “as gangues extinguiram todos os seus sonhos”.

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Reprodução

A Associação de Jornalistas Independentes condenou o crime, que chamou de “ato vilão e odioso”,  e exigiu que o governo atue para reverter o agravamento da insegurança do país em meio a um aumento de assassinatos e sequestros de jornalistas. 

O primeiro-ministro Ariel Henry também divulgou uma mensagem no Twitter dizendo-se chocado pelo ato bárbaro. 

O Haiti ficou na 87ª posição do último Ranking de Liberdade de Imprensa a Repórteres Sem Fronteiras em 2021. O país foi avaliado junto com outras 180 nações.

Na avaliação da RSF, apesar de vários progressos recentes nas leis relativas à liberdade de imprensa, os jornalistas haitianos ainda enfrentam falta de recursos financeiros, ausência de apoio por parte das instituições e dificuldade de acesso à informação.

Nesse cenário, a organização aponta que exercer a profissão no Haiti fica mais difícil diante das intimidações e ataques violentos cometidos pela polícia e por manifestantes contra jornalistas — ocorrências que têm aumentado nos últimos anos.

Em 2019, os jornalistas Pétion Rospide ( Rádio sans Fin) e Néhémie Joseph ( rádios Panic FM e Méga ) também foram assassinados em conexão com seu trabalho jornalístico. E desde 14 de março de 2018, o fotojornalista Vladjimir Legagneur está desaparecido .