A Meta sinalizou nos últimos dias que não pretende aceitar facilmente a remuneração por conteúdo jornalístico, ameaçando banir notícias no Facebook e Instagram em reação a leis na Califórnia e no Canadá determinando que plataformas digitais paguem pelas notícias que circulam buscadores e redes sociais. 

A posição de confronto é de alto risco. Mesmo esperneando, as plataformas digitais não conseguiram barrar uma lei semelhante na Austrália, país pioneiro na regulamentação para compensar empresas jornalísticas afetadas pelo domínio das redes sociais na propaganda digital, e mais recentemente na França e Itália. 

Mesmo assim, notas oficiais e comentários de porta-voz da controladora do Facebook, Instagram e WhatsApp anunciaram que versões dos apps sem notícias “estão em fase de testes”, indicando disposição para brigar.

Meta vs Califórnia: entenda a briga

O Senado da Califórnia discute desde fevereiro o “Journalism Preservation Act” (Lei de Preservação do Jornalismo), exigindo  redistribuição dos lucros que plataformas digitais recebem ao veicular anúncios em postagens de notícias.

A proposta é que até 70% dos lucros sejam enquadrados como “custos de uso” e devolvidos às empresas jornalísticas autoras do conteúdo em que a publicidade foi exibida. 

A congressista democrata e relatora do projeto, Buff Wicks, alega que a remuneração por conteúdo jornalístico pode representar a   “salvação” para a imprensa regional, que vem encolhendo devido à queda de receita publicitária e audiência, em um efeito chamado “deserto de notícias”.  

Como resposta, o porta-voz da Meta, Andy Green, publicou no Twitter uma nota oficial da empresa contra a lei, ameaçando banir notícias para usuários do Facebook e do Instagram na Califórnia.

“Se a Lei de Preservação do Jornalismo passar, nós seremos forçados a retirar notícias do Facebook e do Instagram, ao invés de pagar para um fundo secreto que beneficia, em primeiro lugar, empresas de mídia grandes e de fora do estado, sob pretexto de apoiar editoras da Califórnia.”

Green argumenta que a lei não reconhece que estes veículos publicam o conteúdo nas redes “por vontade própria”, e que a indústria local de notícias já estava consolidada substancialmente “antes do Facebook ser amplamente utilizado.”

“É desapontador ver que os legisladores da Califórnia parecem mais interessados em priorizar os interesses de empresas de mídia nacional e internacional ao invés de seus próprios eleitores”, afirma.

Um dia depois da ameaça, a Assembleia da Califórnia votou por 46 a 6 para levar o projeto ao Senado Estadual. 

Meta vs Canadá: entenda a briga

O enfrentamento está sendo ensaiado também no Canadá. 

Em abril do ano passado, legisladores do Canadá propuseram o Online News Act, ou “Lei de Notícias Online”, que forçaria controladoras como Meta e Alphabet (empresa dona do Google) a pagarem para circular conteúdos de veículos de notícia canadenses.

Em março deste ano, a empresa de Mark Zuckerberg alertou que se preparava para remover a veiculação de qualquer material jornalístico em seus apps “caso a lei fosse aprovada nesse estado”, segundo a Reuters.

A proposta foi aprovada pelo Senado canadense no dia 27 de abril. Em resposta, a controladora começou a impedir a publicação e compartilhamento de notícias para alguns usuários e publishers no país no dia 1º de julho.

Em declaração oficial, a Meta informou que está “concordando com os termos da lei aprovada” ao remover conteúdos conforme definidos pelo texto, e que esse teste irá durar “várias semanas”.

A medida terá impacto evidente na audiência de veículos nacionais e internacionais por todo o país. Ouvido pela Reuters, o autor da lei e Ministro do Patrimônio do Canadá, Pablo Rodriguez, chamou os testes de “inaceitáveis”.

“Quando uma grande empresa de tecnologia nos diz, ‘se você não fizer isso ou aquilo, então eu vou puxar a tomada’ — isso é uma ameaça. Eu nunca fiz nada por medo de ameaça.”

Remuneração por conteúdo jornalístico no mundo 

A ameaça da Meta contra os legisladores da Califórnia e do Canadá segue os mesmos passos de uma briga contra uma lei similar aprovada pelo governo da Austrália em 2021.

Para enfrentá-la, a empresa chegou a banir notícias do Facebook, incluindo informações de interesse público, o que gerou uma onda de protestos.

O gesto foi encarado como uma “declaração de guerra” pelas autoridades australianas, uma vez que o corte não poupou nem veículos estatais. A redução fez o acesso a notícias online cair em até 20%, segundo o Chartbeat.

Apesar disso, a lei foi aprovada e a controladora foi obrigada a retornar à mesa de negociações para discutir pagamentos, fechando grandes contratos de remuneração por conteúdo jornalístico. 

Outros países, como França, Alemanha e Itália, seguiram os passos da legislação australiana, chegando a aprovar leis similares ou negociar acordos para a remuneração do uso de conteúdo jornalístico.

No Brasil, o assunto é tratado no âmbito dentro do PL 2630, popularmente conhecido como “PL das Fake News”, que visa regular as atividades das grandes empresas digitais.

O Comitê Gestor da Internet Brasil (CGI.br) publicou em maio um extenso relatório analisando os diversos aspectos da remuneração por conteúdo no mundo e sugerindo caminhos para a regulamentação do tema no país.