Londres – A uma semana do lançamento do livro de memórias do príncipe Harry, trechos de entrevistas concedidas por ele para promover “Spare” sinalizam que a manipulação da mídia pela família real supostamente para denegrir sua imagem e a de sua mulher, Meghan Markle continua como o principal motivo das mágoas que levaram ao rompimento e a uma interminável lavagem de roupa-suja em público que começou em março de 2021, com uma entrevista à apresentadora americana Oprah Winfrey. 

O nome do livro, Spare (palavra que tem vários significados, entre eles “segundo” ou “reserva”), que chega às lojas no dia 10, atesta o ressentimento de Harry por se sentir preterido. 

A frase “heir and spare” (‘herdeiro e sobressalente’) remete a alguém que nunca será rei. 

A julgar pelo que já se sabe até agora, o tom deve ser mais de queixas e ressentimentos do que de revelações concretas, a exemplo do que ocorreu na série da Netflix lançada em dezembro. Mas não menos prejudicial à imagem da monarquia. 

O clipe de uma das das entrevistas, para a britânica ITV destaca o trecho em que ele diz que gostaria de se reconciliar com o pai e o irmão e coloca a culpa na família pela possibilidade cada vez mais remota de que isso aconteça: 

“Eles não mostraram absolutamente nenhuma vontade de se reconciliar … Eu gostaria de ter meu pai de volta. Eu gostaria de ter meu irmão de volta. Eles acham que é melhor nos manter de alguma forma como os vilões.”

No padrão de comunicação do Palácio de Buckingham, não houve pronunciamento formal, mas vários veículos publicaram uma espécie de réplica atribuída à “fontes da monarquia”, afirmando que Harry e Meghan receberam um convite do rei Charles para participarem do Natal com a família – mesmo depois do seriado da Netflix. A fonte disse aos jornais que as declarações de Harry eram “completamente sem sentido”, e que as portas sempre estiveram abertas para eles. 

O jornalista que fez a entrevista para a ITV, Tom Bradby, conhece William e Harry desde a adolescência, pois já foi repórter especializado na cobertura da família real.  

Durante uma viagem de Harry e Meghan à África do Sul em 2019, ele fez uma entrevista explosiva, em que a duquesa admitiu não estar bem ao ser perguntada sobre sua saúde emocional. Ela não apareceu nos clipes das entrevistas que irão ao ar no fim de semana que antecede o lançamento do livro. 

A declaração sobre a reconciliação foi capa da maioria dos jornais britânicos na terça-feira. Muitos colunistas favoráveis à monarquia criticaram a posição do príncipe Harry nas entrevistas de promoção do livro, lembrando que os ataques à família começaram com ele e Meghan.

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Montagem: MediaTalks

Harry reclama de manipulação da imprensa pelo Palácio 

A possível ausência de revelações concretas não significa que Spare será menos prejudicial para a imagem da monarquia, que sempre praticou o lema “nunca reclame, nunca explique” como forma de se desviar de críticas e crises. Pelo menos oficialmente, segundo Harry. 

As declarações dadas pelo Palácio sobre o convite de Charles para o Natal, sem serem atribuídas a alguém, são de certa forma uma evidência do que ele critica. 

Em um clipe de outra entrevista, que irá ao ar no próximo domingo no programa 60 Minutes da rede americana CBS, Harry diz ao jornalista Anderson Cooper que o lema não era seguido. 

O príncipe é questionado por Cooper sobre sua suposta tentativa de conduzir a mudança para a Califórnia de forma privada. Ele diz que todas as vezes que tentou manter o assunto sob discrição, a monarquia não fez o mesmo. 

Segundo o príncipe, informações sobre os planos do casal eram plantadas ou vazadas a jornalistas especializados em acompanhar os passos da família real, que escreviam reportagens completas e no final diziam que o Palácio não havia comentado. 

Harry afirma, no entanto, que as matérias eram todas era baseadas em “comentários do Buckingham Palace”. 

Jornalista premiado escreveu livro do Príncipe Harry

Spare era para ter sido lançado antes do Natal, mas foi adiado por causa da morte da rainha Elizabeth II. O ghostwritter que deu forma final ao texto a partir de relatos do príncipe Harry é o jornalista americano  JR Moehringer, detentor de um prestigiado prêmio Pulitzer. 

O livro está saindo em 15 idiomas, e o audiobook é narrado pelo próprio autor. 

Não se sabe se o conteúdo foi alterado, mas a mídia britânica especula que passagens sobre a monarca podem ter sido removidas ou suavizadas. 

O contrato com a editora Penguin Books é de 30 milhões de libras para Harry produzir quatro livros, o que significa que mais chumbo grosso pode vir depois de Spare. 

O jornal Sunday Times relatou uma conversa com uma fonte com acesso ao livro, que seria seria pior do que a família real espera, com menos ataques ao rei Charles e mais ao príncipe William e à sua mulher, Kate. 

No seriado da Netflix, Harry contou  ter ficado “aterrorizado” quando o irmão gritou com ele durante uma reunião em que tentava convencer a família real a autorizar sua partida para os EUA continuando com funções oficiais na monarquia. 

Além de lidar com os ataques e decidir se algum trecho de Spare será respondido, a monarquia tem agora um dilema: convidar ou não Harry e Meghan para a coroação do rei Charles, marcada para o mês de maio. 

Os dois conservam os títulos reais de duque e duquesa de Sussex e oficialmente não houve rompimento de ordem institucional.

No discurso feito após assumir o trono, em setembro, Charles chegou a se referir ao “amor por Harry e Meghan, que decidiram construir sua vida no exterior”, o que foi visto como sinal de gentileza e possibilidade de reaproximação pelos mais otimistas.