A publicação dos resultados financeiros dos primeiros quatro meses de 2021 do Reach, maior conglomerado britânico de jornais, reconfirmou a tendência de migração de receitas publicitárias do impresso para o online. Pela primeira vez, o faturamento com publicidade digital do grupo superou o da publicidade impressa, segundo informe à Bolsa de Valores distribuído em 6 de maio. 

O Reach não é o primeiro a registrar essa virada. Mas no caso dele é notável, porque seu portfolio é composto em sua maioria por jornais tabloides ou regionais, que têm no impresso sua principal vocação, em regiões onde ainda é forte o hábito de ir comprar o jornal ou recebê-lo na porta de casa. Entre os títulos nacionais do grupo estão Mirror, Express e Star (com suas edições semanais e dominicais). 

De janeiro a abril,  a receita de publicidade online do grupo cresceu 35%. E houve um salto em abril, de 78,4%, o que pode ser reflexo da reabertura gradativa de comércio e de outras atividades, como escolas e academias, depois que o programa de imunização contra a Covid-19 avançou e as taxas de incidência e mortalidade pela doença refluíram no país. Nos três primeiros meses, com o Reino Unido em lockdown e assombrado por um surto da doença, o crescimento havia sido de 25,2%.

No mesmo perído, o faturamento com publicidade dos impressos recuou 10,4% e a circulação diminuiu 7,9%. 

A base de leitores também cresceu. O Reach informou ter agora 6,2 milhões, contra 5,8 milhões registrados no início de março, e “continua bem encaminhado para chegar a 10 milhões até o final de 2022”. Os jornais do grupo não têm paywall; adotam o sistema de rastreamento para captar usuários. 

“O engajamento dos clientes continuou a crescer e será apoiado por um maior investimento estratégico em dados e análises, incluindo foco no mapeamento das atividades dos clientes para apoiar o objetivo de aumentar a receita média por usuário.”

O grupo é formado por nove jornais nacionais, mais de 110 títulos regionais e mais de 70 sites de notícias, com audiência combinada de 48 milhões de leitores, a maior do país.  

Mas não é do Reach o jornal britânico de maior circulação impressa. Pelos dados de monitoramento da ABC (que não incluem todos os jornais), a liderança em março ficou com o Daily Mail, que pertence ao DMGT, com tiragem média de 984 mil exemplares, queda de 13% em relação a março passado.

O Daily Mirror aparece em quinto lugar, com 367 mil, queda ainda maior, de 17%. Mas entre eles estão a edição de domingo do Daily Mail (Mail on Sunday) e dois jornais gratuitos, o Metro e o Evening Standard. 

Assim, em comparação entre diários semanais pagos, o Daily Mirror é o segundo depois do Mail. E em seguida na lista aparecem os demais títulos do Reach: Sunday Mirror (310 mil), Daily Express (241 mil), Daily Star (222 mil) e Sunday Express (212 mil). 

Não há números do ABC para os outros jornais. Pelos últimos dados disponíveis, de março de 2020, The Sun tinha 1,2 milhões de exemplares, o Sunday Times, 647 mil e o Daily Telegraph, 317 mil.  Mas todos sofreram com a pandemia, que deixou as pessoas em casa e ensinou o caminho para a versão digital. 

Ao mesmo tempo, para mostrar que nem tudo na indústria de mídia é ciência exata, um jornal do País de Gales que começou apenas digital em março passado anunciou o lançamento de uma edição impressa seis semanas depois

Otimismo 

O informe à Bolsa de Valores do Reach é otimista, destacando o “bom início de ano com publicidade digital e impressa apresentando um desempenho ligeiramente acima das expectativas”. E atribuiu os resultados à eficiência do programa de transformação e do mix digital. 

A receita com publicidade digital aumentou 41,3%, taxa estável em comparação com o crescimento de dois anos reportado no segundo trimestre de 2020, que foi de 39,8%. O Reach informou que o movimento de dois anos na receita dos impressos também ficou praticamente estável, com queda de 24,3% no período em comparação a 23,3% entre 2018 e 2020. 

Jim Mullen, CEO do grupo, comentou os resultados: 

“Tivemos um início de ano positivo e estamos vendo os benefícios do programa de transformação iniciado ano passado. Com o digital agora sendo responsável por uma parcela maior de nossas receitas de publicidade do que o impresso, e crescendo fortemente, estamos bem posicionados para progredir ainda mais durante 2021.”

 Cortes e ajustes pós-Covid 

O programa de transformação do Reach não se limitou ao investimento em produtos digitais e engajamento dos leitores, que se converteu em aumento da receita com publicidade digital. O grupo tem sido um dos mais agressivos nos ajustes operacionais depois da pandemia.

Em julho de 2020, foi o responsável pelo maior corte de pessoal entre todas as redações do país: 550 vagas foram eliminadas. Segundo o Financial Times, até setembro os cortes chegaram a 20% da força de trabalho.

Foto: Google Maps

No início de abril o grupo confirmou o fechamento de suas 15 redações e um sistema de trabalho remoto que prevê a manutenção de 75% da equipe em home office, com alguns escritórios transformados em hubs para atividades presenciais em caráter temporário. Um deles é a emblemática sede do Express, às margens do Tâmisa.

Chegou a enfrentar o risco de uma greve em reação à proposta de reajuste de 1% nos salários em abril. O grupo de negociação queria 5%. Mas a greve não foi adiante. 

O Reach está entre as empresas de mídia que recorreram ao esquema de suporte do governo para pagamento de salários durante a pandemia, tendo recebido £ 7 milhões, de acordo com o Financial Times. Apesar das aparentes dificuldades, decidiu pagar dividendos aos acionistas no início do ano, sob o argumento de confiança no futuro de seu jornalismo online. 

 

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