No melhor estilo “mate o mensageiro se a mensagem nĂŁo Ă© boa”, o MinistĂ©rio PĂșblico da Turquia abriu uma investigação sobre o conteĂșdo compartilhado com a hashtag “#HelpTurkey” nas redes sociais, criada em resposta aos incĂȘndios florestais que devastam o paĂ­s. E ameaçou multar canais de TV que exibam imagens ao vivo dos incĂȘndios ou matĂ©rias “que provocam medo e preocupação”.

A maioria das estaçÔes obedeceu, minimizando a cobertura de um desastre de proporçÔes gigantescas. Mas se na TV – dependente de concessĂŁo estatal para operar –  a onda de notĂ­cias negativas Ă© mais fĂĄcil de conter, o mesmo nĂŁo acontece nas redes sociais.

A hashtag #HelpTurkey entrou no ar na manhĂŁ de segunda-feira (2/8) e em algmas horas atingiu 2,5 milhĂ”es de tuĂ­tes. Celebridades aderiram ao apelo, pedindo ajuda internacional no combate aos incĂȘndios. Pessoas comuns tambĂ©m foram para as redes compartilhar imagens da tragĂ©dia.

Muitos usuĂĄrios acessaram o Twitter para postar fotos de ĂĄreas atingidas, expressar tristeza e solicitar ajuda para a Turquia. Mas o pedido nĂŁo foi bem recebido, por sugerir que o paĂ­s Ă© incapaz de combater os incĂȘndios por conta prĂłpria.

De acordo com nota divulgada pelo MinistĂ©rio PĂșblico, foram realizadas “investigaçÔes tĂ©cnicas” sobre postagens nas redes sociais e notĂ­cias na imprensa sobre os incĂȘndios florestais que começaram no dia 28 de julho. A pesquisa teria encontrado contas falsas, supostamente destinadas a criar pĂąnico e insultar o estado e o governo turcos.

“Os relatos espalharam desinformação e tentam causar uma atmosfera de caos”, diz o comunicado. 

O MinistĂ©rio PĂșblico afirmou que algumas contas haviam sido usadas anteriormente para propagar propaganda terrorista. 

Como usuårios de mídia social turcos identificaram a #HelpTurkey como um complÎ do exterior para atacar a reputação do país e sua unidade nacional, logo depois uma contra ofensiva intitulada #StrongTurkiye foi lançada no Twitter. As postagens enfatizam que o estado turco é capaz de lidar com seus problemas por conta própria.

No inĂ­cio da semana passada, o Diretor de ComunicaçÔes da Turquia, Fahrettin Altun, afirmou que a  campanha  do Twitter estava sendo orquestrada do exterior a partir de um Ășnico ponto com o objetivo de enfraquecer os laços entre o povo e o estado.

A chamada campanha de ajuda foi lançada com “motivos ideolĂłgicos. A ajuda prestada com boas intençÔes Ă© necessĂĄria para a unidade nacional, mas esta campanha visou o contrĂĄrio. 

Ele pediu a todos que confiassem apenas nas declaraçÔes e anĂșncios oficiais, e nĂŁo em “desinformação”. 

Em sua conta, ele promove os esforços do governo para conter a crise, destacando o nĂșmero de incĂȘndios que jĂĄ estariam sob controle.

O que diz o presidente 

Comentando sobre a hashtag, o presidente Recep Tayyip Erdoğan, em uma entrevista televisionada na quarta-feira, disse que ela doi criada para “conter a força da Turquia”.

“Isso significa que eles (potĂȘncias estrangeiras) estĂŁo perturbados. Somos fortes. O que eles os turcos fizeram depois disso? Eles abriram o ‘StrongTurkey’ ”, afirmou ele, referindo-se Ă  hashtag que foi criada em resposta a“ #HelpTurkey ”.

Mas a hashtag #HelpTurkey nĂŁo Ă© a Ășnica exibindo conteĂșdo sobre os incĂȘndios. HĂĄ outras, como #Turkeyfire e #Turkeisburning, em que usuĂĄrios postam imagens e discutem o problema, atribuĂ­do ao aquecimento global. 

PĂĄtria verde

Parecendo alheio ao problema e distante do tom avermelhado que tomou conta das redes sociais no paĂ­s, Erdogan usou o Twitter para divulgar seu compromisso com a “pĂĄtria verde”.

“Com a campanha Respire para o Futuro, esperamos trazer um total de 252 milhĂ”es de mudas ao solo antes do final do ano. Nossa luta desesperada para proteger a PĂĄtria Verde continuarĂĄ.”

AcadĂȘmico britĂąnico vĂȘ sinais de ação coordenada

O governo turno nĂŁo estĂĄ sozinho na tese de que pode haver uma ação orquestrada. O acadĂȘmico britĂąnico Marc Owen Jones, que trabalha na Faculdade de CiĂȘncias Sociais e Humanas da Universidade Hamad Bin Khalifa do Catar, disse no Twitter que a hashtag “#HelpTurkey” apresentava sinais de “operação de influĂȘncia”. Mas ele ressalta que muitas pessoas bem intencionadas participam dela.

“Alguns acharam que a mensagem gerada na hashtag foi projetada para fazer a Turquia parecer fraca, incompetente e desesperada”, disse Jones em um tweet.

“Isso, somado Ă  escala da campanha, sugere uma possĂ­vel operação de influĂȘncia. Mas a hashtag teve muitos usuĂĄrios reais.”

De acordo com Jones, devido a tais ataques sistemĂĄticos, os usuĂĄrios de mĂ­dia social devem evitar compartilhar conteĂșdo cuja fonte eles nĂŁo conheçam, e especialmente os usuĂĄrios mais jovens devem se educar sobre a manipulação de mĂ­dia social.

Comentando sobre os objetivos dos tweets multilĂ­ngues postados sistematicamente em #HelpTurkey – muitas vezes com uma “chamada global” convidando a divulgação internacional – ele disse:

“É algo feito com o mĂ©todo de copiar e colar e visa trazer o problema para plataformas internacionais.”

“Muitas das contas que tuitam esta mensagem sĂŁo provavelmente pessoas reais, inspiradas por celebridades e outras pessoas, embora o que nĂŁo estĂĄ claro Ă© quem estĂĄ dizendo Ă s pessoas para copiar e colar o conteĂșdo em inglĂȘs em vez de apenas retuĂ­-lo?” 

“O que Ă© estranho Ă© que isso tem sido feito regularmente a partir de contas de bot persistentes”, acrescentou ele, usando um termo para contas automatizadas executadas por software, nĂŁo os “usuĂĄrios” frequentemente retratados ao lado das contas.

População compartilha as cenas do caos

Sendo ou nĂŁo uma campanha orquestrada, os turcos estĂŁo usando as redes sociais para compartilhar imagens impressionantes do desastre, que no passado nunca seriam vistas, jĂĄ que a mĂ­dia nĂŁo teria como estar em tantos lugares.  Entidades de defesa do meio ambiente e de proteção aos animais tambĂ©m usam as redes para apelar por ajuda. 

 

Neste tweet, um homem aparece agradecendo aos cĂ©us depois que começou a chover em AnatĂłlia, neste domingo (8/8) 

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