O governo do Camboja formou um comitĂȘ para “promover a Ă©tica do jornalismo e os padrĂ”es profissionais” na imprensa local. O projeto, porĂ©m, despertou reação negativa de jornalistas e entidades de defesa da liberdade de imprensa pela possibilidade de o painel ser utilizado para intimidar e repreender a cobertura crĂtica ao primeiro-ministro Hun Sen.
No paĂs, posts crĂticos ao governo publicados em redes sociais podem render a condenação de um jornalista, como Ă© o caso de Kouv Piseth, que pode ser sentenciado a cinco anos de prisĂŁo apĂłs criticar a decisĂŁo nacional de usar as vacinas Sinopharm e Sinovac contra a Covid-19, fabricadas pela China. Ele estĂĄ em prisĂŁo preventiva aguardando decisĂŁo judicial.
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Ao todo, o comitĂȘ terĂĄ 15 membros, em sua maioria altos funcionĂĄrios ou conselheiros do governo, alĂ©m de alguns especialistas em comunicação. Eles serĂŁo liderados por Buth Bovuth, secretĂĄrio de Estado do MinistĂ©rio da Informação.
O ministĂ©rio afirma que o mecanismo servirĂĄ para analisar denĂșncias e reclamaçÔes do pĂșblico e de outros meios de comunicação sobre o trabalho jornalĂstico no paĂs, alĂ©m de verificar a Ă©tica da mĂdia e o abuso profissional dos veĂculos de comunicação do Camboja.
Federação critica ausĂȘncia de membros da imprensa no comitĂȘ
Jornalistas estĂŁo preocupados com um possĂvel aumento na repressĂŁo contra a imprensa, e destacam o fato de o comitĂȘ ser formado em sua maioria por oficiais sĂȘniores do governo.
âQualquer ĂłrgĂŁo nacional encarregado de julgar a Ă©tica e o profissionalismo do jornalista deve ser liderado por uma ampla representação da indĂșstria da mĂdia, jornalistas e sindicatos de jornalistas, bem como lĂderes independentes da sociedade civil — e nĂŁo do governoâ, afirma a Federação Internacional dos Jornalistas (IFJ).
A federação pede tambĂ©m a “retirada urgente da iniciativa para permitir uma revisĂŁo e consulta Ă indĂșstria”.
A Associação Cambojana para a Proteção de Jornalistas (CAPJ) declarou que o governo do Camboja precisa entender o papel vital da imprensa para o paĂs e para a sociedade, especialmente durante a pandemia de Covid-19.
A entidade teme que “a liberdade de expressĂŁo, a livre circulação da informação e o espaço de liberdade e democracia se tornem cada vez menores”.
Governo assedia jornalistas, afirma Human Rights Watch
Brad Adams, diretor da ONG Human Rights Watch para a Ăsia, declarou que o comitĂȘ Ă© “apenas mais uma mina terrestre plantada para explodir em pessoas que relatam notĂcias que o governo nĂŁo gosta ou em crĂticas nas redes sociais. O governo deve se concentrar na crise da Covid-19 e erradicar a corrupção, em vez de assediar os jornalistas”.
Segundo o site Radio Free Asia (RFA), desde 2020 a mĂdia foi impedida de reportar o coronavĂrus no paĂs, diversos sites de notĂcias foram bloqueados e jornalistas presos. O governo declarou estado de emergĂȘncia, o que lhe deu poder para censurar a mĂdia tradicional e online.
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A RFA, que teve que fechar seu escritĂłrio no Camboja em 2017 devido Ă repressĂŁo contra a mĂdia, destaca tambĂ©m que o novo mecanismo sĂł expĂ”e ainda mais a erosĂŁo da liberdade de expressĂŁo no paĂs sob o governo de Hun Sen, no poder desde 1985. O site lembra que o partido do primeiro-ministro, o Partido Popular do Camboja, detĂ©m todas as 125 cadeiras no parlamento.
Em seu ranking anual sobre liberdade de imprensa, a organização RepĂłrteres Sem Fronteiras escreveu que alguns paĂses da Ăsia, incluindo o Camboja, “adotaram na primavera de 2020, decretos ou leis absolutamente draconianas, criminalizando qualquer crĂtica Ă ação governamental e prevendo, para alguns, penas de vĂĄrios anos de prisĂŁo pela mera publicação ou disseminação de informaçÔes consideradas ‘falsas’ pelo governo”.
De 180 paĂses analisados no ranking, o Camboja estĂĄ hoje na 144ÂȘ posição, uma das piores colocaçÔes entre os paĂses da Ăsia.
Legislação pós-Covid-19 é usada como mordaça
A lei sobre Medidas Preventivas Contra a Propagação de Covid-19 jå foi usada para prender dois jornalistas por comentarem sobre a resposta do governo cambojano à pandemia.
Sovann Rithy, editor do site de notĂcias TVFB, foi condenado a 18 meses de prisĂŁo apĂłs postar no Facebook uma citação do primeiro-ministro do Camboja, Hun Sen, que supostamente mostrava sua imprudĂȘncia em relação aos efeitos potenciais da Covid-19.
Ros Sokhet, editor do jornal Khmer Nation, foi condenado a uma sentença de 18 meses de prisĂŁo em novembro de 2020 sob a acusação de âincitação e provocar graves caos na segurança socialâ. Seu crime foram declaraçÔes postadas no Facebook.
O Camboja ocupa a posição nĂșmero 144 do Ăndice mundial de liberdade de imprensa da organização RepĂłrteres Sem Fronteiras, que monitora 180 paĂses.
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