Londres –  Antes de o juiz apitar o início da partida entre o Arsenal e o Brentford na noite desta sexta-feira (13/8) em Londres, dando início à Premier League, campeonato nacional de futebol mais importante do mundo, a luta contra o racismo online direcionado a atletas tomou conta das redes sociais britânicas, mobilizando estrelas do esporte e entidades que combatem a discriminação.

O ato é apoiado pela própria Premier League, que comanda o campeonato. A organização lançou um vídeo com cenas de atletas se ajoelhando. A mensagem afirma ser mais do que um simples gesto, e sim um símbolo de orgulho e identidade e um clamor por mudança. Os 20 clubes participantes concordaram em usar o gesto, mas alguns jogadores resolveram ficar de fora, como Ivan Toney, atacante do Brentford.

Uma das iniciativas realizadas em favor do ato de protesto é uma campanha lançada pela organização Hope Not Hate, estimulando os jogadores a se ajoelharem. 

Na semana passada, a entidade publicou uma pesquisa que mostra apoio de 63% da população do país às atitudes de jogadores e clubes para mitigar o preconceito.

O ato de se ajoelhar antes das partidas, que se tornou central na manifestação contra o racismo, foi apoiado pela maioria e entendido por 80% dos ingleses como importante. O estudo veio na esteira da onda de racismo verificada durante a Eurocopa.

Leia também:  Monitoramento do futebol inglês prova que há tecnologia para redes apontarem autores de ofensas online

A Hope Not Hate  está convocando os usuários das redes sociais a compartilharem as imagens da campanha e tuitarem com a hashtag #backtheplayers apoiando os jogadores que se ajoelham antes das partidas. 

Numa sinalização contra a desinformação, num momento em que o ato de se ajoelhar chega a ser associado nas redes sociais ao marxismo, a pesquisa ressalta que a maioria dos  dos ingleses entendem que a atitude significa aumentar conscientização sobre o racismo no futebol ou se identificar com o movimento Black Lives Matter, iniciado nos Estados Unidos.

Nick Lowles, executivo-chefe da Hope Not Hate, disse:

“Os jogadores da Inglaterra representam um país do qual todos podemos nos orgulhar. Com suas atuações soberbas e ajoelhando-se para mostrar sua oposição ao racismo, eles mostraram que são uma equipe para todos na Inglaterra, independentemente de quem sejam.

O futebol tem o poder de aproximar as pessoas quase como nada mais.”

Entre os atletas engajados na campanha está Jordan Henderson, que joga na seleção inglesa e é capitão do Liverpool, um dos times que disputa a Premier League. 

Nem todos aderiram 

Apesar do apoio popular, nem todos concordam em realizar o gesto. O Brentford foi o último a concordar com a decisão da Premier League. Apenas na última quarta feira a equipe anunciou que iria seguir os demais 19 times da competição.

Mas o atacante do Brentford, Ivan Toney, recusou-se a ajoelhar como os colegas. Ele alegando que os jogadores estão sendo “usados ​​como fantoches” e que o ritual pré-jogo havia se tornado “bobo e inútil”. 

O clube disse em um comunicado:

“Respeitamos os direitos de todos os indivíduos de mostrar sua oposição à discriminação e ao racismo da maneira que acharem mais apropriada para eles. […]Ivan Toney nos disse que preferia não se ajoelhar e que continuará a fazer sua própria declaração pessoal antes dos jogos desta temporada. O Brentford FC apoia totalmente a decisão de Ivan e vai continuar a apoiá-lo de todas as formas que pudermos. ”

Mas ele não é não é  maioria. Muitos astros do futebol têm usado as redes para se manifestar contra os ataques racistas, como o ex-goleiro Shaka Hislop. 

Ataques na Eurocopa

Os números da pesquisa realizada pela Hope Not Hate mantém na ordem do dia um assunto que vem sendo reivindicação de atletas e times, e que após os ataques racistas na final da Eurocopa, quando jogadores negros da seleção da Inglaterra foram alvo de abuso online, ganhou apoio explícito inclusive da família real britânica.

Durante o torneio, o primeiro-ministro Boris Johnson hesitou em condenar os críticos ao ato de se ajoelhar, e defendeu o “direito de vaiar”. Após o episódio da final, ele mudou de posição, mas ao que indica a pesquisa, publicada pelo jornal Daily Mirror, o dano político foi irreversível (veja mais abaixo).

Maioria quer racistas fora das redes e dos estádios, diz pesquisa

Os números revelam apoio da população ao banimento de racistas das redes sociais: 63% defendem o cancelamento permanente de contas de pessoas por este tipo de abuso.

Na semana passada, no mesmo dia em que 11 pessoas foram presas, acusadas de terem proferido xingamentos e comentários racistas contra jogadores da seleção inglesa, a PFA, associação que representa as principais ligas do país, publicou um levantamento de atividade racista online. Os dados deram base justamente a uma crítica explícita às big techs, empresas que administram redes como Facebook e Twitter.

Leia também: Polícia britânica prende 11 acusados de ataques racistas a jogadores após final da Euro 2020

Dois terços das pessoas ouvidas pela pesquisa da Hope Not Hate são a favor de banir racistas também dos estádios de futebol.

Além da campanha, a entidade lançou também uma publicação que traz histórias do combate ao racismo e fascismo de torcidas organizadas, como os Ultra, na Itália. 

Organização Hope Not Hate publica histórias em que o futebol combate o racismo e o fascismo. (Divulgação)
O tiro no pé de Boris Johnson

A sondagem mostra que 59% dos ingleses acreditam que Johnson e a secretária do Interior, Priti Patel, estavam errados ao dizer que os fãs deveriam ter permissão para vaiar os jogadores que se ajoelham antes dos jogos. 

Os conservadores, eleitores do premiê, foram 49% dos que desaprovam o preconceito, revela o levantamento. Entre os conservadores consultados, a maioria (66%) considera o racismo no futebol um problema “sério” ou “muito sério”.

Johnson foi bastante criticado ao se manifestar contra o racismo, justamente devido à sua postura anterior. Nos dias que se seguiram aos ataques racistas da Euro, o premiê se reuniu com representantes de Facebook e Twitter, que se comprometeram a colaborar com as investigações policiais.

Leia também