Os vazamentos de dados do site de adultérios Ashley Madison em 2018, ou de imagens feitas por invasores do Capitólio em Washington em 2021 têm uma origem em comum: o DDoSecrets, ou Distributed Denial of Secrets, coletivo de jornalistas baseados nos Estados Unidos (EUA) dedicados a expor dados de empresas e governos mundo afora em nome do interesse público.

A organização, reconhecida pelo Estado americano, que lhe garante status de ONG livre de impostos federais, é fonte regular  da imprensa dos EUA e vem capitaneando vazamentos importantes, à frente de uma geração de coletivos “pós-Wikileaks”. 

O DDoSecrets inclusive se opõe ao Wikileaks, tendo revelado mais de 11 mil mensagens internas da organização fundada por Julian Assange, que os membros do coletivo americano veem como apenas uma plataforma para propósitos do seu idealizador.

Leia também: EUA vencem batalha na guerra para extraditar Julian Assange; corte britânica amplia direitos de apelação do país

No conteúdo revelado, mensagens preconceituosas, com passagens contendo homofobia e transfobia, além de revelar o modus operandi da organização.

Emma Best, jornalista e figura pública do grupo, critica o WikiLeaks por falta de transparência, por apoiar teorias da conspiração e por uma tendência de “editorializar” seus lançamentos importantes.

DDoSecrets montou “dossiê” com conteúdo de radicais postado na rede social Parler

Na repercussão da invasão ao Capitólio, no calor das eleições presidenciais americanas, o DDoSecrets publicou vídeos e comentários postados na rede social Parler, frequentemente usada pela direita radical americana, num grande pacote usado pela imprensa dos EUA e também por investigações do Senado.

Por outro lado, a atividade do coletivo, que dubiamente não incentiva o hackeamento indiscriminado, mas aceita material de colaboradores que “ao hackear, viram interesse público no material encontrado”, é vista como problemática em setores do governo americano.

Radicais de direita invadiram o Capitólio em Washington, em 6/01/21. (TapTheForwardAssist/CC BY-SA 4.0/Wikimedia Commons)

“Até onde entendemos, nosso site e os conteúdos que listamos são totalmente legais em todas as jurisdições sãs e razoáveis ​​– tanto para aqueles que acessam o nosso site como para fazer o download dos conteúdos que oferecemos. Dito isto, não somos profissionais do direito e simplesmente não podemos fornecer opiniões qualificadas em matéria de direito.

É aconselhável que você consulte profissionais jurídicos qualificados sob o privilégio de advogado-cliente”, afirma a organização a respeito da legalidade da operação.

Em seu lançamento, coletivo enfrentou a pressão por divulgar dados de adúlteros na internet

Em 2018, ainda uma organização desconhecida, a DDoSecrets ganhou fama ao publicar login e senha de usuários do site de adultérios Ashley Madison, um episódio que hoje consta como “educativo” para o grupo, que após críticas, retirou o material do ar.

“A crítica e o feedback nos levaram a mudar”, disse Best, em entrevista à agência Associated Press na época. “Foi em parte  a opção segura, em parte uma medida prática”.

Leia também: Rede social trumpista estreia como celeiro de fake news sobre “eleição manipulada” nos EUA

Em ambientes da direita radical americana, o DDoSecrets é visto como um conglomerado de “hackers do demônio”, como postou o CEO da rede social Gab, similar ao Parler, frequentemente arena de debates negacionistas em relação à Covid-19 e/ou de nacionalismo violento, com evocações à Segunda Emenda da constituição americana, que discorre sobre o direto da população de possuir armas de fogo.

A Gab também foi alvo de vazamentos operados pela organização, que mantém em seu site “70 GB [gigabytes] de postagens públicas do Gab, postagens privadas, perfis de usuário, senhas, DMs [mensagens diretas] e senhas de texto simples para grupos em formato SQL, junto com mais de 70 mil mensagens em mais de 19 mil chats com mais de 15 mil usuários em formato de texto simples”, como explica a descrição do “Gableaks”.

Grupo revelou mensagens internas de forças policiais e endereços de agentes

Um dos motivos de críticas foi a publicação de 250 GB de informações sobre atividades da Polícia Metropolitana de Washington, revelando quase 100 mil emails hackeados por um grupo colaborador. 

Em outro caso de maior calibre, o “Blueleaks”, com informações de mais de 200 delegacias ou representações policiais, o grupo publicou 269 GB de dados que expuseram má-fé da polícia e o alcance excessivo da vigilância nos Estados Unidos. O nome e o endereço de cerca de 700 mil agentes foi divulgado.

Ainda assim, o material deu subsídio a reportagens e apontamentos que não teriam ocorrido sem o vazamento, o que mantém o DDoSecrets firme em seu propósito.

“Temos um objetivo comum: transparência.

Se os dados já são públicos, ou seriam / poderiam ser independentemente de nós, acreditamos que é melhor que um provedor estável e confiável seja a melhor maneira de garantir que o material seja examinado adequadamente”.

Leia também

Post mais visto no Facebook no 1º trimestre turbinou movimento antivacina; empresa omitiu relatório

Games e extrema direita | Pesquisa mostra como extremistas usam jogos para reforçar ideologias radicais