Maior canal de exibiĆ§Ć£o de vĆ­deos no mundo e fonte de notĆ­cias para um quarto da populaĆ§Ć£o dos Estados Unidos, o YouTube se pronunciou ontem (25/8) sobre suas iniciativas para conter a desinformaĆ§Ć£o na plataforma, diante de questionamentos que se intensificaram apĆ³s a tomada do AfeganistĆ£o pelo TalibĆ£. 

Em texto publicado no blog oficial, a empresa defende sua moderaĆ§Ć£o de conteĆŗdo e afirma que abusos ao remover vĆ­deos devem ser evitados.

Provocado por artigo no jornal The Washington Post, que acusa a empresa de se manter ā€œna sombraā€ de Facebook e Twitter quando o assunto Ć© se responsabilizar pelo conteĆŗdo exibido, o executivo Neil Mohan, chefe de produto da empresa, detalhou a percepĆ§Ć£o do YouTube sobre o assunto, defendendo que mais do que remover vĆ­deos, Ć© necessĆ”rio administrar bem o conteĆŗdo que fica online.

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Segundo o Post, a companhia, que pertence ao Google, mantĆ©m uma aparente tĆ”tica de deixar os colegas Facebook e Twitter enfrentarem a opiniĆ£o pĆŗblica, e sĆ³ depois tomar uma atitude, observando as repercussƵes que recaem sobre as outras redes sociais, frequentemente cobradas.

Um ex-funcionĆ”rio do YouTube ouvido pelo jornal disse, sob condiĆ§Ć£o de anonimato, que a postura mais ā€œlentaā€ da empresa Ć© uma mistura da estrutura enorme do Google, que gera decisƵes mais demoradas, e tambĆ©m uma certa estratĆ©gia. Menos cobrada politicamente, a plataforma de vĆ­deos evita o desgaste, deixando outras empresas na fogueira.

Em momentos crĆ­ticos, YouTube deixou Facebook e Twitter agirem primeiro

EpisĆ³dios como o banimento de Donald Trump das redes ilustram a postura do YouTube. Facebook e Twitter tomaram Ć  frente excluindo o ex-presidente dos EUA, e a plataforma de vĆ­deos seguiu o caminho, sĆ³ que uma semana depois, quando o assunto jĆ” estava ā€œfrioā€. Na crise do AfeganistĆ£o aconteceu o mesmo. 

Uma das possibilidades para essa cobranƧa menor seria a natureza da plataforma. Enquanto no Facebook e no Twitter formadores de opiniĆ£o se manifestam rotineiramente sobre temas polĆŖmicos, em posts com grande impacto e potencial viral, no YouTube isso acontece com menos intensidade.

Banidos das redes, ex-presidente Trump chegou a lanƧar blog, mas abortou o projeto um mĆŖs depois. (ReproduĆ§Ć£o)

Sobre o combate Ć  desinformaĆ§Ć£o, o executivo do YouTube coloca desta maneira: ā€œNĆ£o Ć© apenas o que removemos, mas como tratamos todo o conteĆŗdo que deixamos [no ar], que nos dĆ” o melhor caminho a seguir.ā€ 

Mohan exibe o dilema que se mostrou em outro fato envolvendo as Big Techs na Ćŗltima semana, quando o Facebook foi exposto por nĆ£o revelar um relatĆ³rio que mostrava uma notĆ­cia verdadeira, porĆ©m usada amplamente contra a vacinaĆ§Ć£o da Covid-19, como o post mais visto pelos americanos na plataforma, no primeiro trimestre.

Focar em remoĆ§Ć£o apenas leva redes sociais ao papel de tiranos e censores

A moderaĆ§Ć£o de conteĆŗdo desinformativo Ć© mais sutil e nĆ£o pode ser baseada apenas em remoƧƵes de conteĆŗdo, pois, como mostra o exemplo do Facebook, muitas vezes a notĆ­cia em si nĆ£o Ć© falsa.

Mohan afirma que o algoritmo do YouTube prioriza qualidade sobre popularidade, negando que a empresa esteja numa “busca cega” por mais cliques, e portanto por mais receita. Sobre a exclusĆ£o de conteĆŗdo da plataforma, o executivo argumenta:

ā€œUma abordagem excessivamente agressiva em relaĆ§Ć£o Ć s remoƧƵes tambĆ©m teria um efeito negativo sobre a liberdade de expressĆ£o. As remoƧƵes sĆ£o um instrumento contundente e, se usadas amplamente, podem enviar uma mensagem de que ideias controversas sĆ£o inaceitĆ”veis.ā€

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Andy Stone, porta-voz do Facebook, ao tentar explicar por que a empresa omitiu um relatĆ³rio que mostrava o alcance da desinformaĆ§Ć£o e no trimestre seguinte exibiu os nĆŗmeros quando receitas e desafios inocentes foram os mais acessados, ilustrou um pouco do que se coloca para as redes daqui em diante:

ā€œA imprensa escreveu sobre o mĆ©dico do sul da FlĆ³rida que morreu [apĆ³s tomar vacina contra Covid-19]. Quando o legista divulgou a causa da morte, o Chicago Tribune anexou uma atualizaĆ§Ć£o Ć  sua histĆ³ria original; o NYTimes nĆ£o.

Teria sido certo remover a histĆ³ria do Times por ser uma informaĆ§Ć£o errĆ“nea sobre aCovid? Claro que nĆ£o. NinguĆ©m estĆ” realmente sugerindo isso, e nem eu. Mas ilustra como Ć© difĆ­cil definir desinformaĆ§Ć£o.ā€

YouTube aposta em intervir em conteĆŗdos apĆ³s a versĆ£o oficial se estabelecer

O YouTube considera pouco a fatia de cerca de 18% do conteĆŗdo postado na plataforma violar o cĆ³digo de conduta da rede social. Mohan afirma que, dos 10 milhƵes de vĆ­deos removidos por trimestre, a maioria Ć© censurada antes de chegarem a 10 visualizaƧƵes. “Se nos concentrarmos apenas no que removemos, estaremos perdendo a enorme quantidade de conteĆŗdo que as pessoas realmente veemā€, afirma.

As eleiƧƵes americanas sĆ£o colocadas pelo executivo como exemplo da prĆ”tica adotada hoje pelo YouTube. Antes de concluĆ­da a apuraĆ§Ć£o, diversos vĆ­deos afirmavam que havia manipulaĆ§Ć£o, casos de votos rasgados e inĆŗmeras acusaƧƵes contra a credibilidade do pleito. A rede social manteve os vĆ­deos no ar, e apĆ³s os resultados oficiais, localizou e excluiu da plataforma conteĆŗdo considerado desinformativo ou falso a respeito da votaĆ§Ć£o.

YouTube remove cerca de 10 milhƵes de vƭdeos por trimestre, afirma executivo. (Nordwood Themes/Unsplash)

O que as manifestaƧƵes das big techs apontam Ć© que, apesar de ā€œtodo mundoā€ fazer parte delas, elas nĆ£o conseguem assumir o papel de controlar o mundo, com argumenta Mohan:

ā€œApĆ³s eventos trĆ”gicos, como ataques violentos, surgem teorias a cada segundo sobre tudo, desde a identidade do atirador atĆ© o motivo. Nesses momentos, o que acontece no mundo tambĆ©m acontece no YouTube.ā€

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