A polêmica envolvendo o Spotify, o podcaster Joe Rogan e o músico Neil Young está longe do fim. As acusações de notícias falsas relacionadas à pandemia propagadas pelo podcast “The Joe Rogan Experience” fizeram a plataforma reagir.

Porém, dificilmente o conteúdo de Rogan deixará de ser hospedado no streaming.

Tudo começou quando, na semana passada, o artista canadense anunciou que retiraria todas as suas músicas do Spotify caso o podcast do humorista Joe Rogan continuasse hospedado na plataforma, movimento que ganhou proporções gigantes na mídia e nas redes sociais. 

Negacionista opôs Neil Young e Spotify

Isso porque, segundo o cantor e compositor, o streaming estaria “espalhando informações falsas sobre vacinas” ao divulgar o conteúdo de Rogan e “potencialmente causando a morte daqueles que acreditam na desinformação distribuída por eles”.

O ultimato de Neil Young foi levado adiante. Na quarta-feira (26), as músicas do artista foram retiradas do Spotify por causa do podcast de Joe Rogan. 

Dias depois e em apoio ao colega, a cantora Joni Mitchell anunciou que também estava retirando o seu conteúdo da plataforma por causa das “mentiras” sobre a Covid-19 transmitidas nela.

Mas quem é Joe Rogan e por que o podcast dele causou essa reação?

Não é de hoje que o comediante norte-americano de 54 anos tem seu nome associado a polêmicas. Em “The Joe Rogan Experience”, no ar desde 2009, ele se posiciona contra o politicamente correto e políticas identitárias de forma geral.

Rogan já foi acusado de racismo por falas preconceituosas contra negros durante suas entrevistas e de transfobia, quando, por exemplo, questinou a transição de gênero da socialite Caitlyn Jenner — nome escolhido pelo ex-atleta Bruce Jenner, pai de Kendall e Kylie Jenner, ao se assumir mulher.

Em outra ocasião, ele entrevistou o líder do Proud Boys, um grupo supremacista branco neofascista de extrema-direita que aceita apenas homens como membros. Esse episódio, inclusive, foi removido de forma discreta pelo Spotify, segundo a revista Variety.

Antes da criação do polêmico podcast, Joe Rogan ficou conhecido, nos Estados Unidos, por shows de stand-up comedy e, também, por ser comentarista de lutas do UFC.

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US$ 100 milhões por exclusividade para Joe Rogan

Em 2020, o Spotify fechou um acordo de exclusividade para hospedar o podcast “The Joe Rogan Experience”.

Segundo o “The Wall Street Journal”, o contrato rendeu mais US$ 100 milhões (cerca de R$ 568 milhões) para o comediante.

O valor é apontado como um dos motivos para a plataforma de streaming pender mais para o lado de Joe Rogan do que para o de Neil Young nessa disputa.

Além disso, especialistas estimam que o conteúdo do podcaster rende milhões de dólares mensalmente somente em anúncios para o Spotify.

Mas escolher um lado definitivo nessa briga não é matemática fácil.

Desde o início da polêmica com Neil Young por conta do podcast de Joe Rogan, o Spotify já perdeu cerca de US$ 2,1 bilhões (R$ 11,3 bilhões) em valor de mercado — isso somente em três dias.

No domingo (30), Joe Rogan publicou um vídeo no Instagram se desculpando pelos acontecimentos e anunciando que tentará “equilibrar” as abordagens dos temas do podcast.

Ele se defendeu das acusações de fake news ao dizer que buscou apenas conversar com pessoas que têm “opiniões diferentes” sobre assuntos controversos.

 

Harry & Megan e a polêmica no Spotify 

O posicionamento de Joe Rogan foi publicado nas redes sociais horas depois que o princípe Harry e a mulher, Meghan Markle, emitiram um comunicado expressando preocupações sobre o Spotify estar espalhando “desinformação relacionada à pandemia”.

O casal tem um contrato milionário com a plataforma de streaming. Em dezembro de 2020, eles fecharam um acordo de exclusividade no valor US$ 25 milhões (cerca de R$ 78 milhões) para a produção de conteúdos no Spotify.

O princípe Harry é um dos membros da Comissão de Desordem da Informação criada pelo Instituto Aspen. O marido de Meghan é um dos 15 membros que se uniram para colaborar contra as fake news em todos os aspectos da sociedade moderna.

Apesar de expressarem “preocupações”, Harry e Meghan não quebraram os vínculos com a empresa e afirmaram, via nota enviada à imprensa, que estão “comprometidos em continuar” a parceria com o Spotify.

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No domingo (30), o Spotify se pronunciou pela primeira vez sobre a polêmica e anunciou que adotará medidas para combater a desinformação sobre a covid-19 dentro da plataforma.

No entanto, o comunicado publicado no site da empresa, assinado pelo presidente e fundador, Daniel Ek, indica que os conteúdos de Joe Roegan não serão deletados.

“Sabemos que temos um papel fundamental a desempenhar no apoio à expressão do criador, equilibrando-a com a segurança de nossos usuários. Nesse papel, é importante para mim que não assumamos a posição de censor de conteúdo, ao mesmo tempo em que nos certificamos de que existem regras e consequências para aqueles que as violam”, diz o texto.

“Com base no feedback das últimas semanas, ficou claro para mim que temos a obrigação de fazer mais para fornecer equilíbrio e acesso às informações amplamente aceitas das comunidades médicas e científicas que nos orientam nesse período sem precedentes”, prossegue.

Entre as medidas contra fake news sobre a Covid-19, Ek anunciou um alerta para podcasts que mencionem a pandemia de coronavírus.

“Este alerta direcionará os ouvintes para o nosso hub dedicado à Covid-19, um recurso que dá acesso fácil a fatos orientados por dados, informação atualizada e compartilhada por cientistas, médicos, acadêmicos e autoridades de saúde pública ao redor do mundo, assim como links para fontes confiáveis”, detalhou.

O que diz Joe Rogan via Spotify

Depois da controvérsia provocada por Neil Young, o Reality Check (checagem de fake news) da BBC fez uma análise de quatro ideias defendidas por Joe Rogan em seu podcast. 

Uma delas é que a vacina seria uma “terapia genética”, o que não é verdade porque nenhuma vacina contra a Covid muda o material genético das pessoas. 

Segundo explicou a BBC, as vacinas da Pfizer e Moderna aproveitam uma molécula diferente chamada RNA mensageiro, induzindo o sistema imunológico a produzir anticorpos e outras células para combater o vírus, sem interagir com o material genético de quem é vacinado. 

Rogan também veiculou no Spotify que a ivermectina pode curar a Covid-19, em um episódio no ano passado com Bret Weinstein, um autor americano e professor de biologia, que disse: “A ivermectina sozinha é capaz de levar esse patógeno à extinção”.

A tese já foi descartada por estudos científicos rigorosos. 

O apresentador sustentou ainda que pessoas vacinadas depois de contraírem a Covid-19 correriam mais riscos de efeitos colaterais., hipótese igualmente falsa. 

Ela foi defendida nas ondas do Joe Rogan Experience pelo virologista Robert Malone, banido do Twitter em dezembro do ano passado por violar as políticas de desinformação sobre a Covid-19.

Segundo a BBC, depois da entrevista mais de 270 médicos e profissionais de saúde assinaram uma carta ao Spotify pedindo que a desinformação sobre a Covid fosse resolvida na plataforma. 

Joe Rogan também disse que os riscos de miocardite em jovens que tomam a vacina são maiores do que os riscos de pegar a Covid-19. 

O Reality Check da BBC esclareceu que é justamente o contrário, de acordo com pesquisas.

E lembrou que Joe Rogan corrigiu o que tinha dito mas continuou sugerindo que jovens não deveriam ser vacinados pelo baixo risco de pegar a Covid-19, outra afirmação falsa conforme a ciência já demonstrou. 

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