A Anistia Internacional foi uma das entidades internacionais que se uniram para condenar a proibição que impediu a jornalista indiana Rana Ayyub de deixar o país para participar de eventos na Europa a partir desta sexta-feira (1).

A repórter investigativa e colunista do Washington Post é perseguida por autoridades da Índia por ser uma crítica do governo de Narendra Modi. Em um novo ato de intimidação contra a profissional de imprensa, ela foi impedida de embarcar em um voo no aeroporto de Mumbai, na terça-feira (29).

Ayyub viajaria a Londres para falar em um evento sobre violência online contra mulheres jornalistas organizado pelo Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, na sigla em inglês) e, depois, participaria de outra conferência na Itália.

Jornalista indiana recebe intimação judicial 1h antes de viajar

Rana Ayyub publicou no Twitter que foi parada por funcionários da imigração no Aeroporto Internacional Chhatrapati Shivaji, em Mumbai, que disseram que ela não tinha permissão para viajar para Londres.

“Fui parada hoje na imigração indiana enquanto estava prestes a embarcar no meu voo para Londres para fazer meu discurso sobre a intimidação de jornalistas no ICFJ. Eu deveria viajar para a Itália logo depois para fazer o discurso principal no Journalism Fest sobre a democracia indiana”, escreveu.

Funcionários do aeroporto disseram a Ayyub que ela não poderia deixar o país porque é alvo de uma investigação de lavagem de dinheiro recentemente aberta, e que a Diretoria de Execução do Ministério das Finanças da Índia estava enviando uma intimação para ela comparecer a uma repartição pública em 1º de abril de 2022.

A jornalista indiana contou ao Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) que recebeu a convocação por e-mail uma hora antes da partida do voo.

“Impor restrições arbitrárias de viagem a Rana Ayyub minutos antes de sua viagem para uma palestra é uma violação flagrante de seu direito à liberdade de expressão e movimento”, afirmou a Anistia Internacional.

“As restrições de viagem a Rana Ayyub são as últimas de uma longa lista de violações de direitos humanos por autoridades indianas contra jornalistas, ativistas de direitos humanos, grupos da sociedade civil e meios de comunicação na Índia. A repressão à dissidência deve PARAR”, completou a organização.

Investigação contra jornalista indiana foi aberta em fevereiro

As autoridades indianas congelaram a conta bancária de Rana Ayyub em fevereiro, acusando-a de lavagem de dinheiro e fraude fiscal por campanhas de financiamento coletivo realizadas por ela para apoiar pessoas afetadas pela covid-19.

Ayyub negou as acusações e classificou o processo como uma tentativa de intimidá-la. A conta bloqueada era a principal fonte de renda da jornalista indiana por suas publicações no Washington Post e na newsletter no Substack.

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Jornalista Rana Ayyub é perseguida por governo indiano (Foto: Reprodução/Twitter)

“Impedir que Rana Ayyub viaje ao exterior é outro incidente em uma lista crescente de ações injustificadas e excessivas tomadas pelo governo indiano contra o jornalista”, disse Steven Butler, coordenador do programa asiático do CPJ, de Washington (EUA). “As autoridades indianas devem cessar imediatamente todas as formas de assédio e intimidação contra Ayyub.”

O Ministério do Interior, que supervisiona as autoridades de imigração do país, e a Diretoria de Execução não responderam ao pedido de comentário do CPJ enviado por e-mail, informou a organização.

Rana Ayyub virou uma pedra no sapato do governo do primeiro-ministro Narendra Modi, como definiu uma reportagem da revista Time.

Ela ganhou destaque depois da publicação independente do livro “Gujarat Files”, de 2016, sobre a violência ocorrida no início dos anos 2000 no estado de Gujarat, que deixou pelo menos 790 muçulmanos e 254 hindus mortos.

No livro, Ayyub acusou Modi, então ministro-chefe de Gujarat, e seus aliados de serem cúmplices da violência antimuçulmana e incluiu gravações de áudio secretas de políticos do partido Bharatiya Janata (BJP na sigla em inglês, Partido do Povo Indiano), agora sob o domínio da Índia.

Segundo a Time, Modi nunca foi formalmente acusado e disse que seu governo usou “força total” para “fazer a coisa certa” em Gujarat.

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Rana Ayyub é perseguida há anos; dois jornalistas já foram presos

Rana Ayyub é perseguida há anos de várias formas. 

Em 2018, apoiadores do partido indiano no poder compartilharam nas redes sociais um vídeo pornô adulterado para incluir o rosto da jornalista, em uma tentativa de desacreditá-la.

Ao longo desses últimos anos, ela também recebeu uma enxurrada de ameaças anônimas de morte e estupro em seus perfis online.

No início de março, a polícia de Mumbai prendeu dois colegas de profissão por divulgarem fake news contra ela.

Os jornalistas presos trabalhavam no site The Scoop Beat, um portal de notícias de variedades que cobre política, entretenimento, esportes e temas gerais da Índia.

No dia 26 de janeiro, o veículo publicou dois vídeos em seu canal do YouTube com informações falsas sobre Rana Ayyub, e chegou a ironizar as reclamações da jornalista, mas depois pediu desculpas.

Um dos vídeos publicados pelo The Scoop Beat, com o título “A Arábia Saudita baniu Rana Ayyub”, alegava que a jornalista indiana era auxiliada financeiramente pelo Paquistão e continha tweets falsos atribuídos a ela que expressavam desrespeito à Índia.

Segundo Ayyub, os vídeos resultaram em mais de 26 mil postagens com manifestações de ódio contra ela no Twitter, incluindo ameaças de estupro e morte.

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