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Canção da Ucrânia campeã do Eurovision com maior votação da história vira hino de soldados no front

Kalusha Orchestra, banda da Ucrânia vencedora do Eurovision 2022

Londres – Uma das favoritas para ganhar a edição 2022 do Eurovision, considerada a maior competição musical do mundo, a Ucrânia tinha como trunfos não apenas a qualidade da música que representou o país, um moderno e engajado hip hop, mas também a solidariedade dos que se comovem diariamente ao ver os efeitos da invasão da Rússia ao país.

A combinação deu certo na final realizada na noite de sábado (14) em Turim, na Itália, assistida por 200 milhões de espectadores. Com nada menos do que 439 pontos dos 480 que poderia obter na votação do público em 40 países, o grupo ucraniano Kalush Orchestra levou o troféu do Eurovision com maior votação popular já registrada em todas as 66 edições do festival, provocando manifestações de apoio de líderes políticos. 

Em menos de 24 horas, “Stefania” virou um hino da guerra com a Rússia, com combatentes postando vídeos cantando a música vencedora até de dentro de um bunker. 

Ucrânia desbancou Reino Unido, eleito o melhor pelo júri do Eurovision

Pelas regras do Eurovision, considerado um dos eventos não esportivos mais assistidos em todo o mundo, o vencedor é escolhido com base na soma de votos de jurados especializados e de uma votação popular via internet ou por mensagens de texto, ambos com o mesmo peso. 

Para o júri, o vencedor foi o britânico Sam Ryder, que se tornou uma celebridade no TikTok ao postar canções durante o lockdown da covid-19. A Kalush Orchestra conquistara 192 pontos e terminara na nona colocação.

Mas a popularidade do carismático Ryder não foi suficiente para manter o posto quando a votação popular começou a ser anunciada. 

Após a estrondosa votação popular, os ucranianos chegaram a 631 pontos, terminando quase 200 à frente do britânico, que teve que se contentar com o segundo posto – a melhor posição obtida pelo Reino Unido desde 1998.  

Um vídeo divulgado pelo Eurovision mostra o momento em que a vitória foi anunciada. 

Para alcançar a marca histórica, a música da Ucrânia vencedora, “Stefania” ficou entre as três mais votadas pelo público do Eurovision de todos os 40 países participantes do festival, à exceção da Sérvia, onde também pontuou, mas numa posição mais baixa.

O resultado reflete não apenas um reconhecimento artístico, mas também político, de apoio ao país invadido pela Rússia – que aliás, foi suspensa desta edição do Eurovision.

A música foi composta pouco antes da invasão da Ucrânia pela Rússia. A letra menciona as boas lembranças da mãe de um dos integrantes, invocando um passado nostálgico, com o narrador reconhecendo as dificuldades que ela teve que superar para cuidar dele.

Inicialmente concebida como uma mensagem à mãe, a letra acabou ganhando uma força adicional após a eclosão da guerra, extensiva à mãe-pátria, com versos como:

“Eu sempre encontrarei o meu caminho de volta para casa, mesmo se todas as estradas estiverem destruídas”.

O vídeo só foi divulgado depois da vitória na Eurovision. Mostra soldados mulheres protegendo crianças, como a música mostra a mãe protegendo o filho:
“Você não pode tirar minha força de vontade, pois eu recebi isso dela.”
“Eu sempre vou encontrar meu caminho de casa, mesmo com todas as estradas destruídas.”
“Ela acreditou em mim mais do que qualquer outra pessoa.”
“Mesmo quando ela estava cansada, ela continuou a me ninar.”
“Ela me deixava dormir mesmo se houvesse uma tempestade lá fora”

Em nove horas, tinha mais de 3 milhões de visualizações. 

 No dia seguinte, soldados que lutam na Ucrânia postaram vídeos com interpretações de Stefania direto do front da batalha. 

Alguns nem tinham instrumentos, mas usaram apenas a voz, da escuridão do bunker, para entoar o novo hino da guerra. 

Eurovision 2023 será na Ucrânia 

É a terceira vez que a Ucrânia vence o Eurovision. E também trata-se da primeira música de hip-hop a conquistar o primeiro lugar. Para executá-la, a Kalush Orchestra usou dois instrumentos de sopro típicos ucranianos, a sopilka e a telenka.

O presidente Volodymyr Zelensky comemorou a vitória nas redes sociais. Ele disse:

 “A nossa coragem impressiona o mundo, a nossa música conquista a Europa. No próximo ano, a Ucrânia será a anfitriã da Eurovisão pela terceira vez na história.

E eu acredito que não será a última”, escreveu. “Faremos o nosso melhor para um dia receber os participantes e convidados da Eurovisão em Mariupol. Livre, pacífica, reconstruída”.

Reprodução Facebook

A final aconteceu na Itália em virtude da vitória do grupo de rock italiano Måneskin na edição de 2021. Com o resultado, a Ucrânia ganhou o direito de sediar o festival em 2023 e o presidente Zelensky já divulgou a intenção de realizá-lo em Mariupol.

Depois de Ucrânia e Reino Unido, completaram o pódio dos cinco primeiros a Espanha, a Suécia e a Sérvia – esta última com uma canção de forte ironia e crítica social, que foi alçada aos primeiros lugares também pelo voto popular.

O premiê britânico, Boris Johnson, foi um dos que elogiou o talento dos músicos da Ucrânia mas também o apoio ao direito à liberdade. 

No Eurovision, pedido para salvar cidades atacadas na Ucrânia 

“Por favor, ajude a Ucrânia, Mariupol. Ajude Azovstal agora”.  Esse foi o apelo do líder da banda campeã, Oleh PsiJuk, ao completar sua exibição na grande final. Daí a dificuldade de se separar o peso do reconhecimento artístico do apoio político na apoteótica votação popular.

Uma das que expressou apoio aos vencedores foi Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia. Pelas redes sociais, ela disse: “a Europa está com vocês”. 

A Kalush Orchestra foi formada em 2021 e se concentra no hip hop com motivos folclóricos e elementos da música tradicional ucraniana. No retorno ao palco para receber o troféu, PsiJuk dedicou a vitória a todos os ucranianos.

Na entrevista coletiva após a consagração, o líder da banda revelou que o visto temporário recebido pela banda os obrigava a deixar o país em dois dia. E que retornariam à Ucrânia prontos para lutar, caso necessário:

 “Como qualquer ucraniano, estamos prontos a lutar até o fim”.

E não parece ser só retórica: um dos membros do grupo, Vlad Kurochka (também conhecido como MC KylymMen) se alistou nas Forças de Defesa Territorial ao redor da capital Kiev.

A vitória deu um novo ânimo ao país invadido, com os ucranianos se sentindo respaldados pelo resto da Europa. Num post com todos os votos dados pelos outros países, a mensagem enaltece a imagem de uma Europa Unida em prol da Ucrânia.

Grupo representou Ucrânia por desistência da primeira classificada

No Eurovision, cada um dos 40 países escolhe seus representantes em festivais nacionais, e na Ucrânia não foi diferente.

Só que a Kalusch Orchestra havia ficado em segundo lugar na final da seleção nacional “Vidbir 2022”, realizada em 12 de fevereiro, perdendo para Alina Pash.

Mas a guerra mudou os rumos da história. A Pash foi envolvida numa polêmica de que teria violado o regulamento que impedia a participação de competidores que tivessem se apresentado na Rússia ou visitado a Crimeia desde 2014. Por isso abriu mão da vaga, que acabou sendo herdada pela Kalusch Orchestra em 22 de fevereiro.

Eurovision é  inspirado no festival de San Remo

O Eurovision é realizado anualmente desde 1956, e foi inspirado no Festival de San Remo, que era realizado desde 1951. Só não foi realizado em 2020 por causa da pandemia, e 52 países já participaram pelo menos uma vez.

Todos os representantes competem em uma das duas semifinais, classificando-se dez em cada uma delas. Aos vinte se juntam na grande final os representantes das “Big Five” (França, Alemanha, Itália, Espanha e Reino Unido) e mais o do país anfitrião (que este ano também era um dos Big Five).

A participação deste ano foi uma das maiores da história – o recorde é de 43 participantes. A edição deste ano representou a volta da lotação completa da arena do festival, embora com a obrigação do uso de máscaras. Em 2021 a final foi realizada em Rotterdam com meia lotação e em 2020 o evento não foi realizado.

A maior vencedora da história do festival é a Irlanda, com sete vitórias, sendo também o único país a ganhar por três vezes consecutivas, de 1992 a 1994.

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Eurovision revelou vários astros internacionais

O Eurovision fornece aos artistas um impulso na carreira local e, em alguns casos, abre as portas do sucesso internacional.

Vários dos artistas de música mais vendidos do mundo competiram em edições anteriores, incluindo ABBA, Celine Dion, Julio Iglesias, Cliff Richard e Olivia Newton-John. Alguns dos hits mais vendidos do mundo receberam sua primeira apresentação internacional no palco da competição.

O grupo italiano Måneskin virou sucesso internacional a partir de sua vitória na edição do ano passado.

O resultado deste ano traz grandes oportunidades em duas frentes: para o reconhecimento do talento da Kalush Orchestra e para a Ucrânia em sua luta por mais apoio internacional.

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