‘Napalm Girl’ e fotógrafo se encontram no 50º aniversário da imagem que marcou a guerra do Vietnã

Nick Út e Phan Thi Kim Phúc participaram de evento em Nova York nesta semana

Napalm foto 50 anos, Phan Thi Kim Phúc, Nick Ut, Napalm Girl históriaPhan Thi Kim Phúc e Nick Ut se reencontraram em evento sobre os 50 anos da icônica foto na guerra do Vietnã (Foto: Reprodução/Instagram/ Fotografiska New York)

O dia 8 de junho marca o aniversário de 50 anos da icônica foto conhecida como “Napalm Girl”, uma imagem em preto e branco que entrou para a História ao mudar os rumos da guerra do Vietnã.

O registro foi feito pelo fotógrafo Hyung Cong “Nick” Út, da Associated Press, na época com 20 anos. Meio século depois, a cena da pequena Phan Thi Kim Phúc correndo nua e chorando em direção à lente da câmera ainda é impactante.

Atualmente com 59 anos, ela se encontrou com Út em um evento comemorativo nesta semana no museu Fotografiska New York para falar sobre fotografia e guerra.

A história por trás do registro da ‘Napalm Girl’

Apesar de a foto de Phan Thi Kim Phúc ser conhecida “Napalm Girl”, apelido surgido pela forte comoção que sua imagem causou em todo o mundo, o verdadeiro título dela é “Accidental Napalm”.

Em artigo recente para o Washington Post, Nick Tú lembra que, no dia 7 de junho de 1972, soube que estavam ocorrendo combates em Trang Bang, uma pequena vila a cerca de 48 quilômetros de Saigon. A região havia sido ocupada pelas forças norte-vietnamitas.

“Acabei chegando a uma vila destruída por dias de ataques aéreos. 

Os moradores estavam tão cansados ​​das constantes batalhas que fugiram de sua aldeia para buscar refúgio nas ruas, debaixo de pontes ou onde quer que pudessem encontrar um momento de calma.

Ao meio-dia, eu tinha as fotos que eu achava que precisava. Eu estava me preparando para sair quando vi um soldado sul-vietnamita lançar uma bomba de fumaça amarela, que servia como sinal de alvo, perto de um grupo de prédios.

Peguei minha câmera e alguns segundos depois capturei a imagem de um avião lançando quatro bombas de napalm na vila.”

Ele lembra que, ao se aproximar do local bombardeado, viu pessoas fugindo do napalm — uma bomba incendiária feita com líquidos inflamáveis à base de gasolina gelificada.

Foi nesse momento que ele ouviu uma garotinha gritando: “Nong qua! Nong qua!”; “Muito quente! Muito quente!”.

“Olhei pelo meu visor [da câmera] Leica e vi uma jovem que havia tirado suas roupas em chamas e estava correndo em minha direção. Comecei a tirar fotos dela.”

O fotógrafo ajudou Kim Phúc e as outras crianças que aparecem nas imagens — irmão, primos e vizinhos da menina — levando todas na van da AP para o hospital mais próximo.

Chari Larsson, professora sênior de História da Arte na Griffith University, na Austrália, detalha em artigo para o site de divulgação científica The Conversation como a foto atrai e comove espectadores 50 anos depois:

“No primeiro plano à esquerda, há um menino gritando de terror. À direita, de mãos dadas, mais duas crianças correm.

O olhar do espectador move-se inquieto pela fotografia, em busca de detalhes. Um fotógrafo recarrega o filme em sua câmera.

Soldados estão andando casualmente atrás das crianças, aparentemente indiferentes à sua angústia. A justaposição é marcante e eleva o registro emocional da fotografia: espera-se que os soldados ajudem e prestem assistência.

A imagem tem uma textura granulada muito diferente da suavidade da fotografia digital contemporânea. A profundidade de campo é truncada devido à tela de fumaça ondulante. Sem horizonte para oferecer descanso, o olhar do espectador é forçado a voltar para a menina.”

‘Napalm Girl’ quase não foi publicada em jornais

Larsson explica que inicialmente a fotografia de Nick Út foi rejeitada pela AP por causa da nudez da menina. Na época, a nudez frontal era considerada uma violação do decoro.

Mas a decisão foi anulada por Horst Faas, editor-chefe de fotografia da agência no Vietnã, e a imagem foi reproduzida por jornais de todo o mundo.

Conhecida informalmente como “Napalm Girl”, aos poucos a história em torno da menina e das demais crianças da icônica foto começaram a surgir.

No artigo para o Washington Post, o fotógrafo conta que Phan Thi havia sofrido queimaduras de terceiro grau em 30% do corpo.

“Uma vez estável, ela foi transferida de Cu Chi para o hospital infantil em Saigon e, depois para uma unidade de queimados.

Mas seus ferimentos não foram os únicos feridos que Kim Phuc sofreu no ataque. Ela perdeu dois sobrinhos e um de seus irmãos também ficou gravemente ferido.”

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O fotojornalista conta ainda que o hospital se recusou a admiti-la por causa da quantidade de soldados que estavam chegando.

“Eu sabia que ela morreria se não recebesse ajuda imediata. Mostrei a eles meu crachá de imprensa e disse: ‘Se uma dessas crianças morrer, vou garantir que o mundo inteiro saiba’.

Então eles levaram Kim Phuc para dentro. Nunca me arrependi da minha decisão.”

Do Vietnã à Ucrânia

A professora Chari Larsson destaca que a guerra no Vietnã foi a primeira a ser televisionada. Equipes de televisão documentaram a fuga da jovem Kim Phuc, mas a imagem estática de Út alcançou notoriedade e se incorporou na memória coletiva.

“A fotografia teve um impacto imediato e generalizado. Ela apareceu em jornais e revistas influentes, incluindo Life e Newsweek.

Seu lugar na história do fotojornalismo foi garantido quando ganhou o Prêmio Pulitzer de Spot News Photography e o World Press Photo em 1973.”

Cinquenta anos depois, a relação da sociedade com as fotos e com as guerras mudou.

Para a especialista, em 1972, “Napalm Girl” tornou-se a imagem que definiu a geração que capturou a futilidade da guerra no Vietnã.

Em 2022, é a guerra na Ucrânia que chama a atenção do mundo. “Talvez ainda seja muito cedo no conflito para que uma fotografia surja como o símbolo icônico da resistência ucraniana à invasão russa”, ela diz.

Para Nick Tú, ver os horrores da guerra pessoalmente fornece uma perspectiva que poucos podem experimentar.

“Ao mesmo tempo, em meio à morte e destruição da guerra, a resiliência da humanidade brilha – e me lembro disso toda vez que vejo uma foto de ucranianos apoiando seus cidadãos nesse período desafiador.

É com esse otimismo em meu coração que espero que, quando os soldados russos encontrarem uma inocente garota ucraniana precisando de ajuda, eles sintam o mesmo impulso que eu senti, guardem suas armas e cuidem de um companheiro humano.”

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