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Como Gorbachev marcou o jornalismo russo ao financiar jornal do vencedor do Nobel da Paz de 2021

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Mikhail Gorbachev e Dimitry Muratov, ambos premiados com o Nobel da Paz (foto: reprodução Fundação Nobel)

Londres – Morto nesta segunda-feira (30) aos 91 anos, o ex-presidente da União Soviética, Mikhail Gorbachev, inscreveu seu nome na história da política e também do jornalismo independente russo. 

Em 1993, ele utilizou parte do prêmio em dinheiro do Nobel da Paz recebido em 1990 para comprar computadores e ajudar a fundar o jornal Novaya Gazeta, um dos mais combativos veículos de imprensa da Rússia e forte opositor do governo de Vladimir Putin e da guerra com a Ucrânia. 

Por desafiar a censura e as perseguições, o jornalista Dmitry Muratov fundador e editor do jornal, recebeu em 2021 o prêmio Nobel da Paz, ao lado da jornalista filipina Maria Ressa. 

Gorbachev premiado por liderança 

O Nobel da Paz foi concedido a Mikhail Gorbachev em outubro de 1990 “por seu papel de liderança” em negociações que abriram “novas possibilidades para a comunidade mundial resolver seus problemas prementes através das linhas divisórias ideológicas, religiosas, históricas e culturais”.

Ele foi o primeiro e último presidente da União Soviética. A posição foi criada em 1990, quando o político já havia liderado o país por cinco anos como secretário-geral do Partido Comunista (o titular do cargo era o chefe de fato do estado soviético). 

Gorbachev foi o responsável pela Perestroika – uma série de reformas econômicas e políticas destinadas a renovar o sistema soviético, mas que acabou levando à dissolução de todo o Bloco Oriental. 

Quando recebeu o Nobel da Paz, ele disse: 

Sou otimista e acredito que juntos seremos capazes de fazer a escolha histórica correta agora, sem perder uma grande chance na virada do século e do milênio de completar a transição extremamente desafiadora de hoje para uma ordem mundial pacífica.

Gorbachev permaneceu ligado ao jornal que ajudou a criar, comprando computadores e ajudando com o seu prestígio internacional.  

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Prédio do Novaya Gazetta em Moscou(Foto: Google Street View)

Em um vídeo postado pelo Novaya Gazeta no YouTube em janeiro de 2017, Dmitry Muratov revelou que os funcionários do jornal possuíam conjuntamente 76% das ações, enquanto os 24% restantes eram de propriedade do empresário Alexander Lebedev (14% ) e Mikhail Gorbachev (10%). 

Um dos computadores originais permanece exposto na sede do jornal, em Moscou. 

Foto: reprodução VT YouTube

Ameaças ao jornalismo na Rússia pós-Gorbachev

Apesar da abertura do país a partir da era Gorbachev, o jornalismo independente que ele incentivou ao ajudar a criar o Novaya Gazeta vive seus dias mais negros na Rússia. 

As perseguições do regime de Vladimir Putin não começaram com a invasão da Ucrânia, e o Novaya Gazeta é um exemplo disso.

Desde o início dos anos 2000, seis jornalistas e colaboradores do Novaya Gazeta foram mortos em conexão com seu trabalho. 

O Nobel a Dimitry Muratov foi anunciado um dia depois do  15º aniversário do assassinato de sua jornalista mais conhecida, Anna Politkovskaya, morta a tiros em 7 de outubro de 2006.

Menos de um mês após a invasão da Ucrânia, o jornal anunciou a suspensão das edições impressas e atualização do site depois de receber a segunda advertência do órgão regulador de mídia da Rússia, correndo o risco de ter sua licença cassada. 

Mas o governo tenta outros recursos para encerrar o Novaya Gazeta de vez.

Funcionários do jornal criaram uma versão europeia do Novaya Gazeta com ajuda de um fundo da organização Repórteres Sem Fronteiras para apoiar a imprensa no exílio. 

Alguns que ficaram na Rússia lançaram uma revista. Mas as duas iniciativas foram rapidamente sufocadas pelo regime Putin, que bloqueou o acesso aos sites no território do país. 

Nesta terça-feira (31), depois da morte de Gorbachev, o site russo do Novaya Gazeta resolveu mais uma vez encarar a censura, publicando textos sobre a morte do líder. 

Um deles é um depoimento de Dmitry Muratov, destacando a visão anti-guerra do líder soviético, sua fidelidade aos direitos humanos e o amor pela mulher, Raísa. 

Dmitry Muratov, vencedor do Nobel da Paz 2021 (Foto: Reprodução/YouTube)

“Vamos lembrar para sempre: ele amava uma mulher mais do que o seu trabalho, colocava os direitos humanos acima do Estado e valorizava um céu pacífico mais do que o poder pessoal.

Ouvi um comentário dizendo que ele conseguiu mudar o mundo, mas não conseguiu mudar seu país. Talvez sim.

Mas ele deu ao país e ao mundo um presente incrível – ele nos deu trinta anos de paz. Sem a ameaça de uma guerra global e nuclear. Quem mais é capaz disso?

Seguindo a inspiração de Gorbachev, Dmitry Muratov também doou o prêmio em dinheiro recebido da Fundação Nobel, mas não ao jornalismo e sim a crianças em tratamento de saúde. 

Depois da guerra, o jornalista foi além e leilou em Nova York a própria medalha do Nobel da Paz, que alcançou um valor recorde.

A renda foi destinada a crianças refugiadas pela invasão da Rússia à Ucrânia por meio do Unicef. 

 

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