Londres – As críticas sobre censura à imprensa na guerra da Ucrânia, quase sempre dirigidas à Rússia, desta vez estão sendo feitas contra o país invadido, que nesta segunda-feira (14) cancelou as credenciais de jornalistas da americana CNN e da britânica Sky News devido à cobertura da libertação da cidade de Kherson.
As duas emissoras fizeram transmissões ao vivo na manhã de sábado (12) estreladas pelo correspondente de guerra da Sky Alex Rossi e pelo editor de Diplomacia da CNN Nic Robertson, documentando a emoção da população nas ruas com a chegada das tropas ucranianas depois da retirada dos russos.
Embora o tom tenha sido positivo para a Ucrânia, nesta segunda-feira o Estado-Maior das Forças Armadas publicou em sua página um comunicado sobre a cassação da licença, sem se referir ao nome das emissoras internacionais nem a veículos locais que também teriam quebrado as regras.
Jornalistas fizeram cobertura positiva para a Ucrânia
Nenhuma das reportagem faz críticas à Ucrânia, ao contrário. A Sky, que afirma ter sido a primeira rede internacional a transmitir notícias a partir de Kherson, mostrou a população nas ruas agradecendo aos soldados e até abraçando o repórter.
Kherson residents have told Sky's @alexrossiSKY that they feel 'relieved and excited' as they celebrate the liberation of the city.
Live updates: https://t.co/X3flQUk9BR pic.twitter.com/2c8iDLw6ii
— Sky News (@SkyNews) November 13, 2022
O mesmo aconteceu na reportagem de Robertson, que ao longo de 11 minutos mostrou ao vivo a aletria da população e entrevistou ucranianas que resistiram à tomada da cidade.
Ele relatou a destruição da infra-estrutura da cidade e a dificuldade para recompor o que foi inutilizado, mas sem sinais de críticas ao governo local e sim à Rússia.
Durante a entrevista, os que estavam ao redor da equipe cantaram o hino da resistência.
In liberated #Kherson https://t.co/4OSVFFrM4Q
— Nic Robertson (@NicRobertsonCNN) November 12, 2022
Censura a jornalistas na Ucrânia por ‘violação grosseira’
Embora as equipes não estivessem disfarçadas ou em local em que representantes das forças armadas não pudessem vê-las, a nota do Estado Maior afirma que “recentemente, alguns representantes da mídia, ignorando proibições e advertências existentes e sem o consentimento dos comandantes e serviços de relações públicas relevantes das unidades militares, realizaram atividades de informação na cidade de Kherson antes mesmo da conclusão das medidas de estabilização”.
Segundo o comunicado, tais ações foram “uma uma violação grosseira dos requisitos da ordem do Comandante-em-Chefe das Forças Armadas da Ucrânia nº 73 de 03.03.2022 (que teria sido entregue a todos os representantes da mídia junto com as credenciais), bem como de ordens relevantes do comando militar.”
Por essa razão, profissionais de imprensa acusados de violar as regras na área de combate tiveram suas autorizações de trabalho revogadas e seus cartões de imprensa foram declarados inválidos, disse o Estado Maior.
Nem a Sky nem a CNN se manifestaram imediatamente sobre o cancelamento. O Comitê de Proteção a Jornalistas emitiu uma nota expressando preocupação contra o que chamou de “decisão drástica” .
“CPJ is concerned about the drastic decision of the Ukrainian authorities to strip local and international correspondents of accreditation for reporting on the newly liberated city of #Kherson,” said @gulnozas, @CPJ_Eurasia.#Ukraine #PressFreedom pic.twitter.com/r8lA8k34oN
— Committee to Protect Journalists (@pressfreedom) November 14, 2022
O que diz a Ucrânia sobre a punição aos jornalistas
A ONG ucraniana de combate a fake news Detector Media disse ter conversado com duas fontes, apurando que seis jornalistas teriam perdido as credenciais, incluindo os repórteres da Sky News e da CNN.
Outros que transmitiram a partir de Kherson foram Suspilny, Hromadske e o canal Rada.
A organização questionou a chefe do centro de imprensa da Coordenação Unida das Forças de do Sul, que alegou “perigo” para os jornalistas, embora as cenas transmitidas pelas duas emissoras mostrem a cidade cheia de gente em clima pacífico, sem que qualquer incidente tenha sido registrado.
Segundo Nataliya Gumenyuk, a ordem 73 estabelece que a forma de trabalho dos jornalistas seja determinada pelo comandante da unidade relevante, que “autoriza tal trabalho apenas acompanhado por um assessor de imprensa na forma adequada, na presença de cartão de credenciamento e apresentação de requerimento antecipado”.
Gumenyuk afirmou que o fato de alguns jornalistas chegarem lá é o mesmo que pessoas que atravessam a rua no sinal vermelho: “todas sabem que isso não pode ser feito, é oficialmente proibido, mas elas ainda assim atravessam”.
A Detector Media argumentou que os jornalistas foram a Kherson para conversar com a população local, que correria tanto perigo quanto as equipes de filmagem, mas que não estava sendo proibida de ir às ruas.
No início da guerra, uma equipe da SkyNews chegou a ser emboscada em uma estrada na Ucrânia, ferindo um dos mais conhecidos correspondentes internacionais da rede, mas nem assim jornalistas foram impedidos de continuar cobrindo a guerra.
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A assessora alegou que os residentes são reféns da situação, mas mostrou desconforto com a possibilidade de que equipes de mídia aluguem apartamentos e fiquem na cidade por mais tempo, o que iria de encontro às operações de segurança e inteligência militar na cidade.
Gumenyuk negou que alguns jornalistas tenham recebido autorização de militares para entrar em Kherson, ou que tenham entrado junto com eles, embora as imagens das reportagens exibidas no sábado mostrem os repórteres documentando a chegada de soldados a bordo de veículos abertos.
Ela reclamou de todos os jornalistas quererem entrar ao mesmo tempo em Kherson, o que foi explicado pela Detector Media referindo-se ao momento histórico:
“Esse é o trabalho deles, e dá para entender por que os jornalistas querem estar no centro dos acontecimentos.”
A assessora informou que haverá acesso apenas parcial nos próximos dias.
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