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Análise | Na Argentina que vai deixando de comer carne, até Malbec está ameaçado pelas mudanças climáticas

Foto: Francisco Deane / Unsplash

Buenos Aires – Quase ao mesmo tempo em que era realizada a COP27, os vinhedos de Mendoza, na Argentina, sofriam com geadas inéditas em novembro, associadas às mudanças climáticas. Os produtores calculavam perdas de até 60% na região da uva símbolo dos vinhos do país, a Malbec.

Márcia Carmo, jornalista

O portal Infobae informou que as geadas eram “resultado das mudanças do clima”. E não são as únicas conseqüências. A seca que castiga as regiões de cultivo de grãos provocará queda de até 40% na produção de trigo neste ano, segundo a Bolsa de Comércio de Rosário.

Para amenizar os impactos adversos, o governo do presidente Alberto Fernández prometeu uma cotação especial do dólar para produtores e exportadores. A Argentina tem cerca de 15 cotações da moeda americana.

O editor do caderno ‘Campo’ do jornal La Nación, Cristian Mira, ressaltou em um artigo que a COP27 aconteceu em um momento de maior demanda mundial por alimentos, com a população do planeta ultrapassando 8 bilhões de pessoas.

Para Mira, o desafio em um contexto de mudança climática é encontrar o equilíbrio entre produzir mais alimentos e a necessidade de reduzir o efeito estufa.

Ele lembrou que os países do Cone Sul chegaram com um discurso sintonizado ao encontro das Nações Unidas, no qual a “agricultura sustentável” ganhou maior destaque do que nas conferências anteriores.

“No Egito, representantes do Brasil, da Argentina e de outros países do continente apresentaram, com a liderança do Instituto Interamericano de Cooperação Agrícola (IICA), uma ideia simples que abre um amplo leque de oportunidades: a agricultura é parte da solução, não o problema”, escreveu Mira quando a COP27 chegava ao fim.

Não é simples. Na cúpula, uma companhia holandesa que compila dados sobre desmatamento informou como vem aumentando a demanda de seus serviços por parte das empresas de produção e consumo massivo de alimentos.

“Com a expectativa da entrada em vigor a partir de 2024 de novas normas da União Europeia para o setor, a preocupação dessas companhias será evitar adquirir insumos produzidos em áreas desmatadas para evitar punições”, disse um dos diretores da Satelligence.

Inflação e clima mudam hábitos alimentares na Argentina

Os desafios argentinos começam em casa. Além das geadas e da seca, existe um problema enraizado no país, que tem mudado os históricos hábitos alimentares. A Argentina já não é mais um país ‘carnívoro’.

A expectativa é de que a inflação acumulada bata 100% este ano, e com isso o preço da carne bovina tem subido em torno de 4,5% por mês. O aumento é até menor do que a taxa mensal de 6% da inflação, mas mesmo assim os argentinos migraram para opções menos caras, como frango e porco.

O consumo per capita de carne bovina é o  menor dos últimos 100 anos, de acordo com dados do setor. No início do século passado, cada argentino consumia em média cerca de 70 quilos. Agora, essa média baixou para 47 quilos.

Além do preço, há novos hábitos. Assim como em outros países, muitos jovens (e outros não tão jovens) deixaram de comer carne.

Defesa do clima ganha espaço na agenda de líderes do Cone Sul na COP27

Com problemas crônicos como a inflação, a expectativa com a atuação de Messi no Catar e sustos como a ‘gastrite erosiva’ que acometeu o presidente Alberto Fernández durante a reunião do G20, o espaço para a cobertura da COP27 não foi dos maiores na Argentina.

No domingo, logo depois da conclusão do encontro, o jornal Clarín destacou a decepção do vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, ao dizer que faltou “linguagem forte” no trato da mitigação (leia-se emissão de poluentes) no texto final.

Outro jornal influente na Argentina, o Página 12, avaliou que a COP27 terminou com uma boa e uma má notícia: o fundo do terceiro mundo e a falta de medidas mais assertivas para a redução do uso do petróleo.

A guerra à exploração petrolífera, aliás, foi a principal bandeira defendida na COP pelo presidente da Colômbia, Gustavo Petro. Primeiro líder de esquerda eleito no país, ele tomou posse em agosto depois de defender essa posição na campanha.

Sua pretensão conta com forte apoio dos ambientalistas e, ao mesmo tempo, enorme rejeição das petrolíferas e dos economistas, que entendem que a Colômbia depende dos recursos financeiros gerados pela exploração de petróleo.

É uma queda de braço na qual Petro acredita que o meio ambiente deva falar mais forte. “A solução para o planeta e a humanidade é um mundo sem petróleo e sem carvão”, disse na COP27.

Gustavo Petro, presidente da Colômbia

Já o ministro chileno de Energia, Diego Pardow, desembarcou no encontro dizendo que o Chile tem a meta de “carbono neutro” até 2050. E defendeu que o “hidrogênio verde chileno” pode servir para a transição energética global.

O país tem ampla capacidade eólica e solar, e vem adotando várias alternativas de energias limpas. Esse caminho é o que Petro diz querer trilhar também na Colômbia.

A conscientização sobre os efeitos do clima parece estar crescendo entre alguns governantes da região, apesar da COP27 ter rapidamente perdido espaço com a largada da Copa do Mundo.

Frente para salvar a Amazônia proposta por Colômbia na COP27

Dois dias antes do encerramento do encontro no Egito, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, escreveu em suas redes sociais que desabamentos após fortes chuvas no município de Piojó, na região norte da Colômbia, eram efeito da crise climática. 

E acusou a exploração de minério no local como responsável por agravar o drama.

Em seu discurso na cúpula, o presidente colombiano disse esperar que seu país, juntamente com a Venezuela e o futuro governo brasileiro de Lula, formem uma “frente comum para salvar a selva amazônica”.


Este artigo faz parte do MediaTalks Especial COP27.


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