As mulheres que apesar de ocuparem cargos de liderança não são reconhecidas como porta-vozes de suas empresas, têm uma arma poderosa para se posicionar: o LinkedIn.
Essa é a constatação de Nélio Bilate, consultor conhecido no universo corporativo brasileiro.
Em entrevista, ele reflete sobre a relação das executivas brasileiras com a mídia e as barreiras que encontram para representar publicamente suas empresas.
Poucas mulheres porta-vozes
“A presença crescente de mulheres no C-level das companhias, resultante de políticas de cotas ou determinações das matrizes, no caso das organizações globais, não tem sido acompanhada por maior espaço para falar em nome das empresas.
Quando elas chegam ao cargo de CEO, viram porta-vozes. Mas em geral, só quando chegam, o que é lamentável.
Há diversos casos de diretoras de comunicação que não são porta-vozes das companhias, embora sejam responsáveis pelas estratégias e treinamento dos executivos.
Por outro lado, muitas estão indo para os conselhos das empresas e ali têm tido mais oportunidades de falar.”
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Preconceito e ausência de treinamento
“Vejo duas explicações para as barreiras.
A primeira é o preconceito, uma crença de que elas não serão pragmáticas e racionais ao falar com a mídia – o que é uma contradição, pois elas são valorizadas exatamente por terem um lado mais humanizado.
O segundo motivo é a falta de um treinamento específico para as questões das executivas mulheres.”
LinkedIn, a ‘brecha’
“Tenho visto um movimento interessante de executivas que não são oficialmente porta-vozes ou são pouco demandadas para falar com a imprensa usando as redes sociais para se manifestar, sobretudo o LinkedIn.
Elas não falam em nome da companhia, mas se posicionam, dão opiniões sobre o que estão vendo e fazendo.
Algumas fazem isso de forma estruturada e profissional, contando até com consultores pessoais.
É evidente que há um acompanhamento por parte da área de comunicação da empresa, mas é um bom caminho para elas falarem.“
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“Ah, mas só podia ser mulher”
“Executivas que falam em nome de suas companhias para a mídia muitas vezes sofrem pressões internas exageradas.
Já presenciei um caso de uma vice-presidente que era repreendida pelo CEO a cada vez que dava uma entrevista.
E quando há uma falha, as mulheres são mais cobradas. As corporações tendem a perdoar mais os homens.
E aí surgem aquelas frases horrorosas, que infelizmente ainda existem: ‘ah, mas só podia ser mulher’, ou ‘quem mandou escalar a fulana para falar… se fosse beltrano não teria acontecido’”.
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Estereótipos e treinamento
“A imprensa é um pouco ‘viciada’ em perguntar às executivas sobre as dificuldades do início da carreira e os desafios enfrentados para serem promovidas.
E tem poucas que não derrapam nisso quando aparece a pergunta, exagerando ao falar sobre os sacrifícios, como um certo desabafo, e esquecendo de focar no negócio e na empresa.
As empresas se incomodam com isso, mas parte da responsabilidade é delas próprias. É preciso treinamento focado nessas questões, pois sabe-se que as perguntas dos jornalistas virão.
As empresas em geral estão aquém do que deveriam fazer no que diz respeito à preparação de mulheres porta-vozes.
Algumas profissionais investem por conta própria.
Uma executiva que hoje preside uma empresa nos EUA pagava seus próprios cursos sobre como falar em público quando era diretora. Mas isso deveria ser oferecido pelas empresas.”
Escalação de porta-vozes
“Os profissionais que lideram a área de comunicação também têm uma responsabilidade na representação.
Alguns têm receio de designar mulheres como porta-vozes, por terem o medo injustificado de serem responsabilizados se algo der errado.
Cabe a eles tentar equilibrar a escalação dos porta-vozes, não só por uma questão de justiça às profissionais bem preparadas, como também pela construção da imagem de empresa inclusiva e diversa.”
Este artigo faz parte da edição especial sobre representação de gênero na mídia
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