Londres – “O que eles têm a esconder?”, indagou o secretário-geral da ONG Repórteres Sem Fronteiras, Christophe Deloire, ao ser barrado na visita a Julian Assange na prisão de Belmarsh, em Londres, que deveria ter acontecido na manhã desta terça-feira (4).
A visita, que seria a primeira a Assange feita por uma organização não-governamental desde que o fundador do WikiLeaks foi preso, há quase quatro anos, tinha sido previamente autorizada.
Mas foi impedida por ordem da chefe da penitenciária de segurança máxima depois que Deloire e a diretora global de operações e campanhas da entidade, Rebecca Vincent, já tinham sido examinados por agentes. A mulher de Assange, Stella, e o alto comissário da Austrália no Reino Unido, Stephen Smith, foram autorizados a entrar.
A Repórteres Sem Fronteiras, que tem mantido o caso da extradição de Assange para os EUA em evidência, havia distribuído uma nota à imprensa na segunda-feira avisando sobre a visita, com autorização concedida pela direção da penitenciária de segurança máxima onde ele aguarda a tramitação de mais um recurso impetrado pela defesa.
Segundo a RSF, a visita foi suspensa minutos antes de acontecer,
BREAKING: Representatives of Reporters Without Borders denied access to visit Julian Assange in Belmarsh prison this morning, despite official permission having been granted @rebecca_vincent @cdeloire @rsf_inter #FreeAssangeNOW pic.twitter.com/kvhsFhPxCV
— WikiLeaks (@wikileaks) April 4, 2023
Julian Assange responde a 18 processos movidos pelo Departamento de Estado dos EUA pelo vazamento de informações confidenciais sobre a atuação das Forças Armadas americanas nas invasões do Iraque e do Afeganistão. A condenação máxima pode chegar a 175 anos.
Ele passou seis anos asilado na embaixada do Equador em Londres, até ser entregue às autoridades britânicas depois que o novo governo do país deixou de apoiá-lo.
Uma longa batalha judicial foi iniciada para evitar a extradição. Organizações pressionam os governos dos EUA e do Reino Unido a libertar Assange e retirar as acusações contra ele, vistas como violações da liberdade de imprensa, ao colocar em risco fontes que podem revelar assuntos de interesse para a sociedade.
Uma coalizão de parlamentares na Austrália pressiona o governo a interferir no caso, já que Assange é australiano. Levá-lo para o país seria uma alternativa à prisão nos EUA.
O primeiro-ministro, Anthony Albanese, disse na quarta-feira que havia “encorajado” Smith a visitar Assange na prisão. O diplomata não falou sobre o que conversou com Assange na prisão, dizendo apenas que pretendia tornar as visitas regulares para acompanhar a situação de saúde dele.
Autorização cancelada na entrada da prisão
A defesa Segundo a Repórteres Sem Fronteiras, a permissão para visitar Julian Assange , sob o número 645511, tinha sido confirmada no dia 31 de março.
Em nota, a RSF informou que na manhã desta terça-feira eles chegaram a ser examinados e receberem a confirmação de que a visita a Julian Assange aconteceria às 9h15. Sua esposa, Stella Assange, foi autorizada a entrar conforme programado.
No entanto, funcionários da penitenciária disseram aos representantes da RSF que haviam “recebido informações” de que eram jornalistas e, portanto, não teriam permissão para entrar, por decisão da chefe da prisão de Belmarsh, Jenny Louis.
Ela não respondeu a pedidos para conversar com Deloire e Vincent ou para intervir de outra forma para permitir seu acesso, disse a organização.
“Estamos profundamente desapontados com a decisão arbitrária da chefe da penitenciária de Belmarsh de nos impedir de visitar Julian Assange, apesar de seguirmos todos os procedimentos e regras estabelecidas pela penitenciária.
Julian Assange tem o direito de receber visitantes na prisão, e nós temos o direito de visitá-lo como uma ONG de liberdade de imprensa. Apelamos para uma reversão urgente desta decisão, permitindo o acesso a Julian Assange.”
“Este é o último de uma longa série de obstáculos ridículos que enfrentamos nos últimos três anos na campanha pela libertação de Julian Assange. Em todos os níveis, as autoridades britânicas optaram pelo sigilo e exclusão, em vez de permitir o envolvimento normal em torno deste caso – desde a recusa em aceitar petições do RSF até a quase impossibilidade de acesso ao tribunal, e agora isso. O que eles têm a esconder? Independentemente disso, continuamos nossa campanha para #FreeAssange”, disse Christophe Deloire.
A RSF teria sido a primeira ONG a ter acesso a Assange na prisão de Belmarsh, que recebeu poucos visitantes além de sua família durante os quase quatro anos em que está encarcerado.
“Deloire e Vincent pretendiam avaliar as condições de Assange e falar com ele sobre seu caso, como uma ONG fazendo campanha ativa por sua libertação – não como jornalistas”, protesta Rebecca Vincent.
Vincent ressaltou que nunca trabalhou como jornalista ou teve um cartão de imprensa. Deloire já havia visitado Assange em três ocasiões durante seu período na embaixada do Equador.
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Dificuldades para acompanhar processo de Assange
A organização destacou que a proibição de visitar Julian Assange ocorre após a RSF enfrentar extensas barreiras no monitoramento de cada etapa do processo de extradição contra Assange nos tribunais de Londres, exatamente pelo motivo oposto, já que os representantes da RSF compareceram como observadores de ONGs e não foram autorizados a se registrar para cobertura, como os jornalistas fariam.
A RSF relata que também enfrentou barreiras na tentativa de entregar as petições #FreeAssange ao governo do Reino Unido.
Em setembro de 2020, a sede do governo britânico recusou-se a aceitar uma petição de 108 mil assinaturas pedindo que as autoridades do Reino Unido não extraditassem Assange.
Em maio de 2022, o Ministério do Interior recusou-se a aceitar uma nova petição de 64 mil assinaturas instando-o rejeitar o pedido de extradição, embora a RSF tenha conseguido entregá-la às embaixadas do Reino Unido em seis outros países.
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