Londres – A desinformação que tem proliferado no ambiente da mídia social foi apontada pela organização Repórteres Sem Fronteiras em seu relatório Global Press Freedom Index 2023 como um dos fatores que mais causaram impacto negativo sobre a liberdade de imprensa no mundo.
Em 118 países (dois terços dos 180 países avaliados pelo Índice), a maioria dos respondentes do questionário do Índice relatou que os atores políticos em seus países estavam frequentemente ou sistematicamente envolvidos em desinformação maciça ou campanhas de propaganda.
O Brasil, que celebra neste 1º de junho o Dia da Imprensa, ocupa a 92º posição no ranking de 180 países e é uma das nações citadas entre as que a desinformação mais tem se proliferado.
Efeitos da indústria de conteúdo falso
O Dia da Imprensa é comemorado no Brasil em homenagem ao início da circulação do jornal Correio Braziliense, em 1808. Desde então muita coisa mudou no jornalismo. Inovações tecnológicas permitiram levar notícias de forma mais precisa, rápida, ilustrada e em diversas plataformas, incluindo pelas redes sociais.
No entanto, elas também permitiram o avanço da desinformação.
O relatório global da Repórteres Sem Fronteiras destaca que a dificuldade cada vez maior de diferenciar o verdadeiro do falso põe em risco o direito à informação.
O Secretário-geral da organização, Christophe Deloire, enfatiza que essa é uma das maiores ameaças ao jornalismo atual:
O crescimento da indústria de conteúdo falso, que produz e distribui desinformação e fornece as ferramentas para fabricá-la, está minando o jornalismo, juntamente com a crescente agressividade das autoridades e da animosidade contra os jornalistas nas redes sociais e no mundo físico.
Segundo o estudo, o notável desenvolvimento da inteligência artificial está causando estragos sem precedentes no mundo da mídia.
O relatório chama a atenção para a quinta versão do Midjourney, um programa de inteligência artificial que gera imagens de altíssima definição em resposta às solicitações dos usuários, que tem alimentado as mídias sociais com “fotos falsas” cada vez mais plausíveis e difíceis de serem detectadas.
Isso tem feito a desinformação se espalhar com mais intensidade, alerta o estudo, citando como exemplos os casos das fotos bastante realistas que viralizaram de Donald Trump sendo preso por policiais ou de Julian Assange em coma usando uma camisa de força.
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Para a RSF, esse cenário está sendo agravado por posturas como a do Twitter, cujo proprietário, Elon Musk, está levando ao extremo uma abordagem arbitrária e baseada em pagamento para informações, mostrando “como as plataformas de mídias sociais podem se tornar areia movediça para o jornalismo”.
Citando uma investigação do consórcio Forbidden Stories, o relatório ressalta que a indústria da desinformação tem disseminado conteúdo manipulador em grande escala, “com conteúdo digerido por inteligência artificial e regurgitado na forma de sínteses que desrespeitam os princípios de rigor e confiabilidade”.
Guerra de propaganda
O estudo adverte que esse cenário tem sido favorável principalmente para a Rússia (164º lugar entre os 180 países em liberdade de imprensa), que caiu mais nove posições no Índice de 2023, à medida que aumentou sua propaganda massiva.
Em tempo recorde, Moscou estabeleceu um novo arsenal de mídia com as armas mais modernas da indústria de conteúdo falso, dedicado a divulgar a mensagem do Kremlin principalmente nos territórios ocupados no sul da Ucrânia (79º lugar no ranking) e nos países de sua esfera de influência.
Ao mesmo tempo em que ataca com a desinformação, o país reprime com força os últimos veículos jornalísticos russos de informação independente, que foram banidos, bloqueados e/ou declarados “agentes estrangeiros”.
Não é à toa que o país aparece entre os 20 piores do ranking global de liberdade de imprensa.
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