Londres – A expectativa de melhoria no ambiente de hostilidade contra a mídia que se tornou marca registrada do governo de Jair Bolsonaro valeu ao Brasil o avanço de 18 posições no Press Freedom Index, divulgado pela organização Repórteres Sem Fronteiras neste Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (3 de maio).
Ainda assim a situação não é boa, com o país classificado na faixa laranja, indicando as nações em situação problemática.
O ranking aponta o ambiente para o jornalismo como ruim em sete a cada 10 mercados e “satisfatório” em apenas três a cada 10.
Nas Américas, 11 nações estão em posição melhor do que a do Brasil. A Noruega continuou em primeiro lugar no Índice.
Ameaças à liberdade de imprensa no Brasil
O Índice de liberdade de imprensa adota uma metodologia que combina dados quantitativos de abusos, ataques e crimes com opiniões de especialistas sobre as condições para a prática do jornalismo.
Sob a perspectiva da Repórteres Sem Fronteiras, a liberdade de imprensa consiste na “capacidade dos jornalistas, como indivíduos e coletivos, de selecionar, produzir e divulgar notícias de interesse público, independentemente de interferência política, econômica, legal e social e na ausência de ameaças à sua segurança física e mental”.
Dessa forma, a pontuação é atribuída com base em violações praticadas por Estados e também em ataques sofridos por parte de atores sociais, situação que se agravou no Brasil durante o governo de Jair Bolsonaro e particularmente na campanha eleitoral.
Leia também | Um jornalista foi atacado no Twitter a cada 3 segundos na campanha eleitoral no Brasil, mostra pesquisa
Na análise sobre a situação do país, o relatório registra que os ataques do ex-presidente Jair Bolsonaro à mídia continuaram até o último dia de seu mandato, no final de 2022.
A Repórteres Sem Fronteiras avalia que chegada do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva restaurou a estabilidade nas relações entre mídia e governo.
Mas ressalta que a violência estrutural contra jornalistas, a propriedade altamente concentrada da mídia e os efeitos da desinformação ainda representam grandes desafios para a liberdade de imprensa no Brasil.
Leia também | De Bolsonaro a Lula: entenda por que o Brasil é o 92º em ranking de liberdade de imprensa entre 180 países
Desinformação e liberdade de imprensa
O Índice de 2023 também destaca os efeitos da desinformação no ecossistema de mídia digital sobre a liberdade de imprensa.
Em 118 países (dois terços dos 180 avaliados pelo Índice), a maioria dos que responderam ao questionário relatou que políticos estavam envolvidos em desinformação maciça ou campanhas de propaganda política de alguma forma.
“O Índice Mundial de Liberdade de Imprensa mostra uma enorme volatilidade com grandes altas e quedas e mudanças inéditas, como a subida de 18 posições do Brasil e a queda de 31 posições do Senegal”, salientou Christophe Deloire, Secretário-Geral da RSF.
Deloire chama a atenção para o papel dos Estados:
“Essa instabilidade é resultado do aumento da agressividade das autoridades de muitos países e da crescente animosidade contra os jornalistas nas redes sociais e no mundo físico.
A volatilidade também é consequência do crescimento da indústria de conteúdo falso, que produz e distribui desinformação e fornece as ferramentas para fabricá-la.”
Os melhores e os piores em liberdade de imprensa em 2023
O documento utiliza cores para demonstrar a escala de violações. O Brasil se encontra na faixa classificada como “problemática” em liberdade de imprensa.
A Noruega ocupa o primeiro lugar no índice de liberdade de imprensa da Repórteres Sem Fronteiras pelo sétimo ano consecutivo.
Mas um país não nórdico, a Irlanda, superou os vizinhos dos noruegueses que costumavam se destacar entre os melhores. O país saltou qiuatro posições este ano e ficou em segundo, seguido por Dinamarca, Suécia e Finlândia.
A Holanda subiu 22 posições, depois de uma queda em 2022 devido ao assassinato do jornalista investigativo Peter de Vries.
Os três piores países na lista são asiáticos.
O Vietnã aparece em 178º, por sua “incansável perseguição a repórteres e comentaristas independentes”.
A China caiu quatro posições e aparece em penúltimo, confirmando sua posição de maior carcereiro de jornalistas do mundo e um dos maiores exportadores de conteúdo de desinformação, segundo a RSF. O último é a Coreia do Norte.
Com a queda de 15 posições da Costa Rica no ranking, as Américas não têm mais nenhum país de verde no mapa da liberdade de imprensa.
O México (128º) caiu mais uma posição este ano e figura como a nação com mais jornalistas desaparecidos do mundo (28 nos últimos 20 anos).
Cuba (172º), onde a censura foi novamente intensificada e onde a imprensa é monopólio do Estado, continua com a classificação mais baixa da região, repetindo o resultado de 2022.
Uma das quedas destacadas pela Repórteres Sem Fronteiras foi a dos EUA, que perdeu três posições e agora está em 45º no ranking.
Os motivos foram especialmente a estrutura legal em nível local, com leis ameaçando a liberdade de imprensa, e a violência contra a mídia.
Os assassinatos de dois jornalistas ( Jeff German, do Las Vegas Review Journal em setembro de 2022, e Dylan Lyons do Spectrum News, em em fevereiro de 2023) também contribuíram para o resultado.
Leia também | Jornalista é morto na Flórida durante cobertura de assassinato; entenda
O relatório traz uma análise de cada região do mundo, com a Europa figurando como a mais fácil para os jornalistas trabalharem, ainda que com problemas como prisões e espionagem de profissionais de imprensa e os efeitos da guerra na Ucrânia.
Leia também | Veja as melhores e as piores regiões do mundo para a liberdade de imprensa em 2023