Londres – Enquanto a Austrรกlia direcionou sua legislaรงรฃo sobre mรญdias sociais ร  remuneraรงรฃo de empresas jornalรญsticas pelo uso do conteรบdo nas plataformas e o Brasil mira nas fake news, outros paรญses como Reino Unido, Franรงa e EUA estรฃo mais preocupados com o efeito das redes sociais sobre questรตes ligadas ร  saรบde mental de crianรงas e adolescentes, como autoimagem corporal.

Um dos mais recentes trabalhos a examinar esse efeito foi realizado pela Associaรงรฃo Americana de Psicologia (APA). 

Os pesquisadores constataram que adolescentes e jovens adultos que reduziram o uso de mรญdias sociais em 50% por apenas algumas semanas tiveram uma melhora significativa em como se sentiam em relaรงรฃo ao peso e ร  aparรชncia geral, em comparaรงรฃo com colegas que mantiveram seus nรญveis anteriores de uso de mรญdias sociais. 

Redes sociais e autoimagem corporal 

Estudos demonstrando riscos dessa natureza tรชm motivado campanhas como a do Center for Countering Digital Hate (CCDH), que escalou a atriz de Hollywood Laura Linney para narrar um anรบncio pressionando o Congresso dos EUA a legislar para proteger meninas do que chamam de “algoritmos agressivos”. 

Mas os danos nรฃo acontecem apenas com meninas.

O experimento da Associaรงรฃo Americana de Psicologia envolveu 220 estudantes de graduaรงรฃo de 17 a 25 anos (76% do sexo feminino, 23% do sexo masculino, 1% outro), todos usuรกrios regulares de mรญdia social (pelo menos duas horas por dia em seus smartphones), com sintomas de depressรฃo ou ansiedade.

No inรญcio da pesquisa, eles responderam a uma sรฉrie de afirmaรงรตes sobre sua aparรชncia geral (por exemplo, โ€œestou muito feliz com minha aparรชnciaโ€) e peso (por exemplo, โ€œestou satisfeito com meu pesoโ€) em uma escala de 5 pontos, com 1 indicando โ€œnuncaโ€ e 5 โ€œsempr

Na primeira semana, os participantes foram instruรญdos a usar suas mรญdias sociais normalmente. Eles tinham que reportar uma captura de tela diรกria. 

Apรณs a primeira semana, metade dos participantes foi instruรญda a reduzir o uso de mรญdia social. 

Nas trรชs semanas seguintes, uma parte do grupo reduziu em aproximadamente 50% o tempo de conexรฃo em mรญdias sociais, para uma mรฉdia de 78 minutos por dia. Outra parte dos participantes manteve uma mรฉdia de 188 minutos de uso diรกrio. 

Os pesquisadores constataram que os que usaram menos as mรญdias sociais apresentaram uma melhora significativa na forma como consideravam sua aparรชncia geral e peso corporal apรณs a intervenรงรฃo de trรชs semanas, em comparaรงรฃo com o grupo de controle, que nรฃo viu nenhuma mudanรงa significativa. O gรชnero nรฃo fez diferenรงa nas repostas. 

Vulnerabilidade dos adolescentes 

O autor principal do trabalho, Gary Goldfield, PhD, do Children’s Hospital of Eastern Ontario Research Institute, lembrou o que todos os que sรฃo ou jรก foram adolescentes sabem: “a adolescรชncia รฉ um perรญodo vulnerรกvel para o desenvolvimento de problemas de imagem corporal, distรบrbios alimentares e doenรงas mentais”. 

O problema รฉ o quanto isso estรก sendo agravado pelo impacto das mรญdias sociais, expondo adolescentes jรก vulnerรกveis a conteรบdos que aprofundam inseguranรงas e os colocam diante de alternativas como dietas malucas ou mesmo suicรญdio. 

O CCHD fez um alarme para esse risco em dezembro de 2022, em um relatรณrio chamado Deadly by Design.

Os pesquisadores do centro afirmam que novas contas configuradas por meninas de 13 anos no TikTok recebem recomendaรงรฃo de conteรบdo relacionado a suicรญdio em 2,6 minutos e conteรบdo a respeito de transtorno alimentar em 8 minutos.

Pode ser mais, pode ser menos. Mas รฉ cada vez mais difรญcil ignorar que existe um problema, e que pouco estรก sendo feito para resolver. 

Os especialistas criticam os controles das plataformas, mas hรก tambรฉm a responsabilidade dos pais.

O Ofcom, รณrgรฃo regulador de mรญdia britรขnico, divulgou uma pesquisa em outubro passado indicando que seis em cada 10 crianรงas tรชm contas em mรญdia social, embora a idade mรญnima seja 13 anos. E dois terรงos contaram com a ajuda dos pais para configurรก-las. 

A atenรงรฃo no Reino Unido para regulamentar a atividade de crianรงas e jovens nas redes รฉ decorrente de um trauma. Em 2017, Molly Russel, de 17 anos, tirou a prรณpria vida e um inquรฉrito comprovou a influรชncia do conteรบdo das redes na decisรฃo. 

Casos como esse reforรงam os argumentos dos que defendem regulamentaรงรฃo. jรก que vidas podem estar em jogo.