Londres – Ao contrário do que seria de se esperar numa era em que cada vez mais pessoas se informam pela internet, uma pesquisa acaba de comprovar que os jovens nativos digitais têm menos habilidade de identificar fake news do que os usuários mais velhos.

O estudo, realizado pela Universidade de Cambridge e pelo instituto de pesquisas YouGov nos EUA, descobriu que apenas 11% de pessoas entre 18 e 29 anos acertaram pelo menos 16 das 20 perguntas de um teste que continha informações verdadeiras e falsas, enquanto 36% desse grupo erraram dez ou mais respostas. 

Já entre os participantes acima de 65 anos, 36% tiveram pontuação alta, e menos de 9% acertaram menos de 10 opções. 

“Muitos americanos acreditam que estão sendo regularmente expostos a desinformação online, e a maioria está confiante em sua capacidade de distinguir notícias reais de notícias falsas, mas o resultado mostrou que essa confiança nem sempre é baseada na realidade”, destaca Linley Sanders, analista de dados do YouGov. 

O método do estudo, publicado esta semana na revista científica Behaviour Research Methods, é o primeiro validado cientificamente para testar a capacidade de separar verdade e desinformação, segundo a universidade de Cambridge. 

Criado pelos pesquisadores do Laboratório de Tomada de Decisões Sociais da universidade, o processo chama-se MIST (sigla para “misinformation susceptibility test”) e é resultado de dois anos de experimentos com mais de 8 mil participantes. 

Mais velhos e jovens foram expostos a fake news 

A pesquisa do instituto YouGov foi a primeira a aplicar o método: 1516 adultos dos EUA (jovens acima de 18 anos e pessoas mais velhas, acima dos 65)  se submeteram ao teste da desinformação em abril de 2023 e também responderem a perguntas sobre dados demográficos, política e comportamento online. 

Os pesquisadores mostraram um conjunto de 20 manchetes – 10 reais e 10  falsas – em uma ordem aleatória, e os respondentes tinham que tentar separar as fake news das notícias verdadeiras.

As manchetes de fake news foram criadas com a ajuda de inteligência artificial, abrangendo uma ampla gama do que os pesquisadores chamam de “características da desinformação” – entre elas a crença em teorias da conspiração e a tendência de aceitar declarações sem sentido ou falsas.

As notícias verdadeiras foram selecionadas de órgãos confiáveis de mídia e de empresas de pesquisas que divulgam dados de opinião pública. 

A desconfiança é tanta que todas as 10 questões submetidas à avaliação dos entrevistados foram consideradas fake news pela maioria dos respondentes. O estudo mostra a classificação das consideradas mais críveis para as menos críveis.

Na média, praticamente a metade dos integrantes do grupo pesquisado (49%) soube identificar corretamente a veracidade de pelo menos 14 das 20 questões apresentadas, nível considerado aceitável pelos pesquisadores. Considerando o nível mais alto de acerto (pelo menos 17 identificações corretas), o índice cai para a quarta parte da amostra (26%).

Considerando a idade dos respondentes, porém, observa-se que a taxa de acertos é bem maior entre os mais velhos. A pesquisa demonstra que a experiência de vida  conta mais do que a familiaridade com o mundo digital.

Dois terços (66%) das pessoas mais velhas, com idade superior a 65 anos conseguiram identificar a veracidade de pelo menos 14 das questões, enquanto esse índice caiu para 60%, entre os respondentes um pouco mais jovens, de 45 a 64 anos.

Comparativamente, o desempenho foi bem pior entre os mais jovens. Só a terça-parte (35%) dos adultos entre 30 a 44 anos conseguiram identificar corretamente a veracidade de pelo menos 14 das questões. E pior ainda foi o desempenho dos jovens entre 18 e 29 anos: só 28% deles conseguiram atingir esse nível de acerto.

Além de quantificar erros e acertos, os pesquisadores relacionaram as pontuações individuais com os hábitos de uso de internet. E descobriram que o tamanho de horas diante do computador não é documento. A exposição maior ao mundo digital piorou o desempenho.

Cerca de seis em cada dez (59%) daqueles que passam até duas  horas de recreação online todos os dias conseguiram identificar corretamente pelo menos 14 das proposições. Esse índice caiu progressivamente com o aumento de horas, chegando a apenas 32% entre os que passam mais de 9 horas em recreação online.

A pesquisa também analisou os canais pelos quais os entrevistados recebem suas notícias.

Isso demonstrou que os respondentes que identificaram corretamente pelo menos 17 das 20 proposições tendem a se informar pela mídia tradicional, com os maiores escores obtidos pelos consumidores de notícias da The New Yorker (31%) e da Al Jazeera (20%).  Entre os que se informam pelas mídias sociais, os que tiveram melhor desempenho foram os usuários do LinkedIn, com 20% deles identificando corretamente pelo menos 17 proposições.

Na faixa dos que tiveram índice de acerto mais baixo, os usuários das mídias sociais predominaram, comprovando que os que consomem notícias por meio delas são os mais suscetíveis às fake news.

Cerca de 53% daqueles que receberam notícias do Snapchat não conseguiram identificar corretamente mais de 10 das proposições. O estudo mostrou que logo em seguida nessa faixa dos que menos acertaram estão os usuários da Truth Social de Donald Trump, WhatsApp, TikTok e Instagram. 

Os eleitores ou simpatizantes do Partido Democrata tiveram um desempenho melhor do que os republicanos no teste de Cambridge, com 33% dos democratas alcançando pontuações altas, em comparação com o índice de apenas 14% dos republicanos.

No entanto, quase um quarto dos seguidores de ambos os partidos estava na faixa de pontuação baixa.

O YouGov constatou ainda que metade de todos os americanos, tanto os mais jovens como os mais velhos, diz que vê todos os dias no mundo digital o que classifica de fake news. 

“Os mais jovens recorrem cada vez mais às mídias sociais para descobrir mais sobre o mundo, mas esses canais estão repletos de desinformação e fake news”, disse Rakoen Maertens, principal autor do estudo que comparou a habilidade entre jovens e pessoas mais velhas. 

“Abordagens para alfabetização midiática, bem como as questões dos algoritmos e do design de plataforma exigem um repensar urgente”, recomendou. 

Além de utilizar o método em estudos científicos controlados, a Universidade de Cambridge colocou o teste em um formulário online para ser feito por qualquer interessado, que pode ser acessado pelo link abaixo. O resultado é apresentado na hora.