Londres – O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, confirmou nesta terça-feira que Moscou e Washington mantiveram conversas sobre uma possível troca de prisioneiros que daria liberdade ao jornalista Evan Gershhkovich, preso na Rússia em 29 de março sob acusação de espionagem quando fazia uma reportagem na região dos Montes Urais.
Em uma teleconferência com repórteres, Peskov admitiu que “houve contatos sobre o assunto”. Mas disse não ser apropriado discutir as conversas em público. “Elas devem ser realizadas em completo silêncio”, afirmou.
Na segunda-feira (3), o jornalista do Wall Street Journal recebeu visita da embaixadora dos EUA em Moscou, Lynne Tracy. Foi a segunda visita consular autorizada em mais de três meses.
Jornalista preso na Rússia ‘bem de saúde’
O repórter é o primeiro acusado de espionagem pela Rússia desde a Guerra Fria, e pode pegar 20 anos de prisão. Em 22 de junho, um tribunal de Moscou rejeitou novo pedido para libertar Gershkovich.
Após a visita, a porta-voz do Departamento de Estado disse: “A embaixadora Tracy relata que o Sr. Gershkovich está bem de saúde e continua forte, apesar de suas circunstâncias”.
Ao mesmo tempo em que Tracy foi autorizada a se encontrar com Gershkovich na prisão, funcionários da embaixada russa visitaram Vladimir Dunaev, cidadão russo que está em prisão preventiva em Ohio (EUA) por acusações de crimes cibernéticos.
As duas visitas motivaram o questionamento ao porta-voz do Kremlin em seu briefing diário com jornalistas.
Desde a captura de Evan Gershkovich circulam especulações sobre a motivação do governo da Rússia para a prisão, que poderia ser forçar os EUA a soltar mais prisioneiros russos.
Essa possibilidade chegou a ser citada em maio pelo vice-ministro das Relações Exteriores, Sergei Ryabkov, em entrevista à agência estatal russa Tass.
Ele disse que isso poderia ser feito por um “canal dedicado” entre agências de segurança russas e americanas criado para este fim, como aconteceu no passado em outros casos, mas apenas depois que o caso de Gershkovich for julgado.
Em dezembro, a Rússia libertou a jogadora de basquete Brittney Griner, presa por porte de maconha, em troca da libertação de Viktor Bout, preso nos Estados Unidos por tráfico de armas.
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Repórter do Wall Street Journal é filho de russos
Evan Gershkovich, de 31 anos, é filho de russos originários da antiga União Soviética que agora moram nos EUA. Ele fala russo e já trabalhou na Agence France-Presse, no Moscow Times e no The New York Times.
A detenção aconteceu na cidade de Yekaterinburg, nos Montes Urais, por suspeita de “espionagem no interesse do governo americano”, disse na época o FSB, serviço secreto russo.
O jornalista preso teria “coletado informações que constituem segredo de estado sobre uma das empresas do complexo militar-industrial da Rússia”.
A organização de defesa da liberdade de imprensa Repórteres Sem Fronteiras levantou a possibilidade de o jornalista estar apurando informações sobre as atividades do grupo de mercenários Wagner, que viria a fazer um motim desafiando a autoridade de Vladimir Putin.
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No dia 10 de março, pouco antes da prisão, o jornalista havia publicado uma reportagem sobre as atividades de Yevgeny Prigozhin, sugerindo tensões entre o Kremlin e o grupo Wagner.
Ao anunciar a prisão de Evan Gershkovich, o FSB reconheceu que ele tinha credenciamento do Ministério das Relações Exteriores da Rússia para trabalhar como jornalista.
Mas a porta-voz do ministério, Maria Zakharova, disse que Gershkovich estava usando suas credenciais como proteção para “atividades que nada têm a ver com jornalismo”.
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