Claudia Wallin, jornalista Suécia
Claudia Wallin

A Suécia tem pressa: este país singular, que ano após ano figura no topo do ranking global das economias mais inovadoras do mundo, se movimenta de forma veloz no palco da revolução deflagrada pela inteligência artificial.

O centro nevrálgico da tecnologia no país é o AI Sweden, criado pelo governo em 2019. Trata-se de um poderoso hub que reúne atores dos setores público, privado e da academia, com a missão de acelerar o seu uso em benefício da sociedade e da competitividade.

Na comunicação corporativa, trava-se um intenso debate sobre expectativas, desafios, possibilidades – e também o medo do impacto da inteligência artificial. Mas o saldo parece ser positivo: tanto na Suécia como nos demais países nórdicos, profissionais de RP veem de forma majoritariamente positiva a entrada em cena do novo fenômeno.

Panorama da inteligência artificial na Suécia

A tendência é apontada pelo relatório deste ano da Mynewsdesk – uma das principais plataformas digitais de RP da região – sobre o panorama do setor da comunicação corporativa. O estudo entrevistou 450 profissionais.

A maioria dos entrevistados (60%) acredita que a IA é um apoio bem-vindo para a criação de conteúdos, em um futuro que já começa agora.

Do total, 50% disseram que suas empresas planejam criar mais conteúdos gerados pela inteligência artificial – mas 61% acham que a nova tecnologia nunca será capaz de gerar conteúdos tão bons quanto os criados pela inteligência humana.

“A inteligência artificial é extremamente eficaz e pode tirar do jogo, em um nanosegundo, qualquer um de nós. Isto significa que as tarefas manuais em marketing irão se tornar obsoletas”, diz Lars Silberbauer, CMO (Diretor de Marketing) da Nokia.

No relatório Silberbauer afirma:

“A base da IA é o conhecimento que já existe. É aqui que a fantasia e a criatividade humana se destacam. Até mesmo a IA se tornará mais criativa, e poderá por exemplo gerar poemas – mas nove entre dez deles serão ruins, ou medíocres.

E de novo, é quando a sensibilidade humana entra em cena para selecionar o que de fato é bom. Assim, usar a inteligência artificial como um parceiro, ou um co-piloto, vai ser uma receita de sucesso para os criadores de conteúdo avançarem na direção do futuro.”

A consultora Pia Pinkawa, especialista em Marketing e Comunicação, avalia no relatório que o futuro da criação de conteúdos vai estar fundamentado em uma parceria revolucionária entre homem e máquina.

“Usei a IA para elaborar um conteúdo na área de sustentabilidade, e com isso economizei muito tempo em termos de pesquisa e escrita. Por outro lado, pelo menos na etapa atual, não vejo a IA ser capaz de gerar conteúdo em tópicos mais sensíveis, como uso de mão de obra infantil, que requer um olhar humano”.

Uma clara tendência, no campo da criação de conteúdos para a indústria de comunicação e marketing, é o foco cada vez mais direcionado para a interatividade e a co-criação. Arquitetar uma conexão mais profunda com os públicos-alvo, e também entre eles, é vital para engajar audiências e gerar confiança.

“E para trabalhar de forma mais criativa e eficiente com conteúdos, é preciso abraçar a IA”, destaca o relatório.

 Lições suecas sobre ética e eficiência no uso da IA

A meta do AI Sweden, centro nacional sueco para a promoção da inteligência artificial aplicada, é criar um robusto ecossistema destinado a impulsionar organizações a utilizarem a tecnologia para solucionar desafios sociais e empresariais.

Ao mesmo tempo, os suecos se debruçam sobre os dilemas éticos da inteligência artificial. Para fazer frente a este desafio, foi criado o AI Ethics Lab – o ‘laboratório de ética’ que funciona como uma divisão do centro nacional.

O objetivo é colaborar para a aplicação prática das diretrizes éticas produzidas por corporações, poder público e academia.

O ‘laboratório de ética’ sueco trabalha com casos reais, que estão sendo reunidos em um crescente banco de dados destinado a proporcionar a empresas privadas, organizações e gestores públicos um guia sobre como incorporar padrões éticos em seus projetos.

Assim, diferentes entidades não vão precisar ‘reinventar a roda’ e nem quebrar a cabeça para tentar desenvolver diretrizes éticas de alto nível. O foco do laboratório não é o debate sobre como questões éticas devem ser regulamentadas, e sim quais aspectos éticos devem ser considerados na implementação de uma solução de IA.

Em colaboração também com o setor corporativo, o governo da Suécia já opera uma estratégia de inteligência artificial para otimizar a eficiência do seu vasto Estado de Bem-Estar Social.

Nos cálculos da Agência Nacional para a Governança Digital (Digg, na sigla em sueco), a implementação das técnicas de inteligência artificial já existentes pelas autoridades públicas nacionais, regionais e municipais representaria uma economia anual de 140 bilhões de coroas suecas (o equivalente a cerca de R$ 64 bilhões).

Os principais desafios para atingir esse novo patamar de modernização na gerência do Estado são a ampliação do know-how das agências públicas para a utilização das técnicas já disponíveis e o acesso a bases de dados, assim como a definição de questões éticas e jurídicas.

O risco de “esgarçar os limites”

 O sueco Oliver Edholm, de 21 anos, abandonou a escola aos 15 para pesquisar e trabalhar com inteligência artificial, tornando-se conhecido como o mais jovem pesquisador na área.

Oliver Edholm, pesquisador de inteligência artificial sueco
Oliver Edholm

Aos 19 ele criou uma startup especializada em soluções de IA, a Depict.ai, que levantou US$ 20 milhões em financiamento e é a principal plataforma de recomendação de produtos na Escandinávia.

Em entrevista à Sveriges Radio, a rádio pública da Suécia, Edholm alertou os criadores de conteúdo sobre a tentação de esgarçar os limites diante de concorrentes pouco éticos.

“É preciso ter cuidado com os riscos. É sempre possível cair na armadilha de achar que podemos esgarçar um pouco nossos princípios porque somos mais éticos do que o nosso concorrente, e se ele vencer a corrida, isso não seria bom.

Mas acho que é justamente aí que se deve dizer: ‘não, nós temos nossos princípios, e é importante mantê-los’ “.


Edição especial MediaTalks sobre Inteligência ArtificialEste artigo faz parte do Especial ‘Os desafios da ESG na era da Inteligência Artificial

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