Londres – No primeiro aniversário da morte da jovem curda Mahsa Amini sob custódia policial no Irã, pelo menos 100 jornalistas foram presos e vários condenados por noticiarem os acontecimentos e os protestos contra a repressão sobre as mulheres no país. 

As mulheres jornalistas tornaram-se o principal alvo das autoridades, e algumas ganharam notoriedade pela coragem, como Elaheh Mohammadi, presa há 11 meses e sob risco de prisão perpétua. 

Ela foi a única jornalista a cobrir o enterro de Mahsa Amini, que morreu no dia 16 de setembro de 2022 aos 22 anos após detenção por não usar o véu islâmico da forma correta. E escreveu para o jornal reformista Ham-Mihan uma reportagem pungente intitulada “Terra da Tristeza”.

No aniversário da morte de Mahsa Amini, jornalista segue presa há 11 meses

Depois de obter um bacharelado em língua e literatura persa na Universidade Al Zahra em 2009 e um mestrado em estudos femininos na Universidade Shahid Bahonar em Kerman em 2011, Elaheh começou a cobrir questões políticas e sociais para vários meios de comunicação iranianos, como Etemaad Daily , Khabar Online , Haft-e Sobh Daily e Etemaad Online .

Em dezembro de 2021 ela foi proibida de escrever para a imprensa durante um ano, após uma queixa apresentada pela Organização de Inteligência do país. A proibição deveu-se às suas reportagens sobre as condições das mulheres na prisão de Qarchak , questões de gênero e o abate de um avião ucraniano em janeiro de 2020.

A jornalista foi presa 13 dias após a morte de Mahsa Amini, acusada de conluio com os EUA, e aguarda o veredito de um julgamento a portas fechadas iniciado em maio.

Ela e a jornalista Niloofar Hamedi se tornaram as faces internacionais mais notórias da repressão a mulheres jornalistas no Irã e às violações da liberdade de imprensa agravadas depois da morte de Mahsa Amini. 

Hamedi tirou uma foto dos pais de Amini se abraçando em um hospital de Teerã, onde sua filha estava em coma e também foi acusada de “propaganda contra o sistema” e “conspiração para agir contra a segurança nacional” em conluio com os EUA.

Em 2023, as duas foram incluídas na lista das pessoas mais influentes do mundo da revista Time e receberam o Prémio Mundial de Liberdade de Imprensa UNESCO/Guillermo Cano, entre outros reconhecimentos. 

Elas estão na mesma prisão, Evin, onde ficam os presos políticos. Temendo protestos no aniversário da morte de Mahsa Amini, o governo iraniano reforçou policiamento para evitar novas manifestações e proibiu o pai da jovem de sair de casa. 

Contando a história de Mahsa Amini

Elaheh Mohammadi começou a cobrir o caso assim que Mahsa Amini foi levada para o Hospital Kasra de Teerã, em 16 de setembro de 2022, com ferimentos sofridos enquanto estava sob custódia policial.

Ela entrou em contato com a família e tornou-se uma das primeiras a relatar as suas opiniões sobre a causa da morte. 

Em seguida, assim que seu jornal deu luz verde, Elaheh comprou a última passagem de avião para Sanandaj e fez a viagem de duas horas de Sanandaj para Saqqez, cidade natal de Mahsa Amini, de táxi, segundo relato de sua irmã em reportagem publicada pelo jornal dois dias após sua prisão. 

Única repórter no cemitério de Aichi no dia do funeral, ela intitulou a sua reportagem“Terra da tristeza”, relatando a dor e a raiva de mais de 1 mil pessoas que participaram da cerimônia.

No túmulo de Amini estava escrito: “Você não vai morrer. Seu nome se tornará um símbolo.” 

A prisão da jornalista 

Elaheh foi convocada para interrogatório no dia 29 de setembro, mas agentes do serviços secreto do Irã a interceptaram quando ela se dirigia para a reunião e a levaram sob custódia. 

“Em um breve telefonema, minha esposa me disse que estava detida na ala 209 da prisão de Evin e que nenhuma acusação havia sido feita contra ela”, tuitou seu marido naquela noite.

Segundo a organização Repórteres sem Fronteiras, apesar de 17 dias em confinamento solitário, de uma campanha difamatória por parte das forças de segurança e de um longo período na prisão de Qarchak, nos arredores de Teerã, seguida de uma transferência de volta para a prisão de Evin, o moral de Elaheh ainda é bom.

Sua família diz que ela recita poemas em sua cela e escreve cartas de agradecimento a todos aqueles que a apoiam do lado de fora. E que reitera frequentemente o seu compromisso com o jornalismo em defesa das mulheres.

O julgamento começou em 30 de maio de 2023, no final do seu sétimo mês de prisão, quando foram anunciadas as acusações finais. 

As alegações são de “conluio” e de “propaganda anti-estatal”, puníveis com longas penas de prisão e possivelmente até com pena de morte, segundo a RSF. 

Durante a audiência mais recente, em 1º de julho, ela negou todas as acusações, de acordo com a RSF. 

Pena de prisão suspensa e proibição de jornalismo para irmã gêmea 

A Repórter Sem Fronteiras acompanha também o caso da irmã gêmea de Elaheh, Elnaz, presa em 5 de fevereiro de 2023 por uma reportagem no jornal Ham Mihan publicada três meses antes, sobre a repressão violenta do governo aos jornalistas que cobriram a morte de Mahsa Amini.

Libertada sob fiança depois de ter sido detida durante uma semana, foi condenada a uma pena de prisão suspensa de três anos pelo Tribunal Revolucionário.

Ao contrário da sua irmã, Elnaz não está fisicamente detida, mas está proibida de sair do país, de falar com meios de comunicação estrangeiros e de praticar jornalismo.

Além disso, de acordo com a organização,é obrigada a frequentar regularmente um curso sobre “jornalismo ético” coordenado por funcionários do Ministério da Inteligência iraniano.