Londres – Os assassinatos do jornalista Dom Philips e do ambientalista Bruno Pereira, em 2022, chamaram a atenção do mundo para uma crise de violência contra defensores do meio ambiente que não é nova: desde 2012 foram registradas 1.910 mortes no mundo, das quais 376 no Brasil.
Os dados são da organização Global Witness, que divulgou hoje um novo relatório mostrando a extensão dos riscos. Em 2022, 177 pessoas perderam a vida em crimes associados à luta pela preservação ou defesa de territórios contra agressões ambientais – mais de um quinto delas na Amazônia.
A Colômbia lidera o ranking de mortes em 10 anos e também em 2022, com 60 casos, seguida pelo Brasil, onde aconteceram pelo menos 376 assassinatos em 10 anos, de acordo com o levantamento da Global Witness. Em 2022 foram 34 mortes no país.
Brasil e Colômbia são os piores em mortes de ambientalistas
Desde que ONG começou a coletar dados em 2012, 1.335 defensores do meio ambiente em toda a América Latina perderam a vida – 70% de todas as mortes no mundo.
Pelo menos 1.390 dos assassinatos ocorreram entre a adoção do Acordo de Paris, em 12 de dezembro de 2015, e 31 de dezembro de 2022. Em média, um defensor foi morto a cada dois dias em 2022, assim como em 2021.
Dos 10 países onde ocorreram mais mortes, apenas três não são da região. O Brasil figura em segundo, com seis mortes de ambientalistas a menos do que a Colômbia.
A impunidade continua sendo a marca. Na Colômbia, apenas 5,2% dos assassinatos de defensores de direitos humanos, terras e meio ambiente foram resolvidos judicialmente.
No México, 90% dos ataques contra ativistas e jornalistas ficaram impunes, segundo a Global Witness.
No ano passado, a região foi responsável por 88% dos assassinatos no mundo – uma porcentagem cada vez maior.
Onze dos 18 países em que casos foram documentados em 2022 ficam na América Latina.
Embora o número geral de mortes tenha sido um pouco menor no ano passado em comparação a 2021, quando aconteceram 200 assassinatos, “não significa que houve uma melhora considerável da situação”, diz a ONG.
“O agravamento da crise climática e a demanda cada vez maior por commodities agrícolas, combustíveis e minérios só intensificarão a pressão sobre o meio ambiente – e sobre aqueles que arriscam a vida para defendê-lo.
Além disso, cada vez mais, estratégias não letais como criminalização, assédio e ataques digitais também estão sendo usadas para silenciar os defensores.”
Brasil, situação ‘preocupante’
A Global Witness chama a atenção para a situação “preocupante” do Brasil, com média de quase três mortes de ambientalistas por mês no ano passado.
“Ao chegar ao poder em 2019, o ex-presidente de extrema direita Jair Bolsonaro promoveu uma agenda antiambiental e contra os humanos.
No início de seu governo, ele deixou claro que não daria aos povos indígenas nem um centímetro a mais de terra – o que não chega a ser surpreendente, visto que certa vez ele descreveu os indígenas como “animais em zoológicos”.
Os ataques contra os povos indígenas e suas terras triplicaram durante sua presidência e, em 2022, 10 dos 34 assassinatos que registramos no Brasil eram de indígenas. Isso deu eco a pedidos para que Bolsonaro seja julgado por crimes contra a humanidade.”
Os nomes dos ambientalistas foram listados no relatório.
A organização salientou o “imenso desafio” que o presidente Lula e Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, terão que encarar “para reverter os danos sociais e ambientais incentivados por Bolsonaro”.
“O ponto de partida deve ser a proteção efetiva dos povos indígenas e suas terras. Porém, com um Congresso extremamente conservador, a tarefa será ainda mais complexa”, aponta o relatório.
Leia também | Jornalista que investigava escavações ilegais é jogado de prédio em Bangladesh
As mortes na Amazônia
Pela primeira vez desde 2012, quando a Global Witness começou a documentar ataques contra defensores, foram analisados assassinatos ocorridos em um bioma específico, revelando que a Amazônia foi palco de mais de um quinto de todos os assassinatos no ano passado – com 39 de 177 (22%).
Pelo menos 11 indígenas foram mortos, e muitos desses assassinatos estão ligados à mineração.
Desde 2014, foram contabilizadas 296 mortes na Amazônia, o que faz da floresta um dos lugares mais perigosos do mundo para os ativistas e jornalistas.
A justiça raramente é feita para esses ataques na Amazônia, e a impunidade reina absoluta, diz o levantamento.
Leia também | Repórteres Sem Fronteiras: jornalismo ambiental é cada vez mais perigoso na América Latina
Veja outros destaques do relatório
- O México havia sido o país com o maior número de assassinatos no mundo em 2021 – 54. Em 2022, o número caiu para 31, e o total desde 2012 é de 185. Pelo menos 16 dos mortos no ano passado eram indígenas e quatro eram advogados.
- Com 14 assassinatos em 2022, Honduras foi o país com o maior número de homicídios per capita do mundo.
- Dos 16 casos registrados na Ásia em 2022, 11 foram nas Filipinas, três na Indonésia e dois na Índia.
- As Filipinas aparecem com frequência como o pior lugar da Ásia para defensores da terra e do meio ambiente, com 281 mortes de ambientalistas desde 2012.
- Foram registrados cinco assassinatos na África em 2022. Quatro dos mortos eram guardas florestais, dois na República Democrática do Congo, um no Malauí e um na África do Sul.
Leia também | Especial | Como a COP27 repercutiu no mundo e sua influência nos rumos da ação climática