Londres – Depois que grandes marcas como IBM, Apple, Disney, Comcast, TV Paramount e até a Comissão Europeia anunciaram a suspensão de seus investimentos em propaganda no Twitter/X em reação a um relatório da ONG Media Matters comprovando que os anúncios estavam aparecendo ao lado de posts pró-nazismo, Elon Musk adotou a tática de “matar o mensageiro”, com um processo judicial “termonuclear” contra a organização que o associou ao antissemitismo.
No entanto, o relatório da MediaMatters não é o único motivo da debandada de anunciantes.
Elon Musk envolveu-se em um debate sobre a teoria conspiratoria antissemita “A Grande Substituição”, concordando com ela e influenciando seus mais de 163 milhões de seguidores.
Embora os comentários tenham sido feitos pelo bilionário em sua conta pessoal e a CEO do Twitter / X, Linda Yaccarino, tenha se manifestado afirmando que discurso de ódio e discriminação não são admitidos na plataforma, o mercado não entende assim, já que a imagem de Musk se mistura à da rede que adquiriu em 2022 por US$ 44 bilhões.
A investigação da organização Media Matters comprovou que anúncios de grandes corporações apareceram ao lado de conteúdo promovendo Hitler e o nazismo, reavivando a crise entre o Twitter / X e o mercado publicitário que se instalou tão logo o empresário assumiu o comando da rede.
IBM suspendeu verba após polêmica de antissemitismo no Twitter
É a segunda vez que Musk processa uma ONG. Ele fez o mesmo com a organização Center for Countering Digital Hate por motivo semelhante.
A IBM foi a primeira a anunciar a suspensão dos investimentos depois do relatório e das postagens de Musk no Twitter validando a teoria conspiratória associada a massacres como os de Christchurh, na Nova Zelândia, e Bufflalo, nos EUA. Em nota, a empresa disse:
“A IBM tem tolerância zero com discurso de ódio e discriminação, e suspendemos imediatamente toda a publicidade no X enquanto investigamos esta situação totalmente inaceitável”.
Em seu relatório, a organização sem fins lucrativos dedicada a monitorar desinformação e conteúdo de ódio online apresentou exemplos de anúncios de várias outras marcas citadas ao lado de conteúdos antissemita, e algumas delas já seguiram os passos da IBM.
A Media Matters salientou que os anúncios foram posicionados nesses locais mesmo depois de a CEO Linda Yaccarino ter dado garantias ao mercado quando o Twitter mudou de nome de que as marcas estariam “protegidas do risco de estarem próximas” de postagens tóxicas na plataforma.
O baque pode ser grande. A publicidade representava 90% da receita da empresa antes da aquisição por Musk.
Após a primeira onda de boicote de corporações ela caiu e o empresário tentou mudar o foco para arrecadação por meio de assinaturas e do selo azul de verificação. Mas o plano não deu o efeito esperado para reverter a queda de 50% nas verbas advindas da propaganda, número informado pelo próprio Musk em julho
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A defesa do Twitter sobre os posts envolvendo antissemitismo
Yaccarino tem uma longa carreira em propaganda e marketing, tendo ocupado o cargo de líder global da área na a NBCUniversal da Comcast, cujos anúncios foram vistos pela MediaMatters ao lado de conteúdos promovendo o nazismo.
Sua contratação foi vista como um movimento de Elon Musk para reatar os laços com as corporações que haviam deixado a plataforma. Mas não tem sido fácil para a experiente executiva, como apontou a organização:
“Ela também alegou que X (anteriormente Twitter) tem “demonstrado seu compromisso absoluto em combater o antissemitismo na plataforma” e que “o antissemitismo é mau e X sempre trabalhará para combatê-lo em nossa plataforma”.
Mas seu chefe ontem à noite endossou a teoria perniciosa da conspiração antissemita de que o povo judeu está apoiando “hordas de minorias” que estão “inundando” o país para substituir os brancos. Essa teoria da conspiração foi a mesma que motivou o mortal tiroteio na sinagoga Tree of Life de 2018.”
Ao divulgar a investigação que mostrou os anúncios ao lado das marcas, a Media Matters destacou que o Twitter/X restabeleceu diversas contas de “fanáticos e extremistas de extrema-direita pagos, aparentemente incluindo uma conta pró-Hitler e negacionista do Holocausto, como parte de seu programa de compartilhamento de receita de anúncios de criadores”.
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Linda Yaccarino publicou um post na quinta-feira em que tenta novamente dar garantias aos usuários e anunciantes.
“O ponto de vista do X sempre foi muito claro de que a discriminação por parte de todos deveria PARAR de forma generalizada. Quando se trata desta plataforma – X – também somos extremamente claros sobre nossos esforços para combater o antissemitismo e a discriminação. Não há lugar para isso em nenhum lugar do mundo.”
Assim que a denúncia da Media Matters foi feita, um porta-voz disse à NBC que o sistema de publicidade do X não coloca intencionalmente uma marca ativamente ao lado desse tipo de conteúdo, nem uma marca está tentando ativamente apoiar esse conteúdo com posicionamento.
E iniciou a reação contra a Media Matters:
Grupos como o Media Matters procuram agressivamente postagens no X e depois vão para as contas, e se virem um anúncio, os pesquisadores deles continuam atualizando para capturar o máximo de marcas possível.”
A polêmica de Musk
Na quarta-feira da semana passada, Musk se envolveu em um tópico que começou com um compartilhmento de um post da Fundação para o Combate ao Antissemitismo, no qual um pai confronta seu filho por postar “Hitler estava certo” nas redes sociais com a proteção do anonimato e sugere que fale abertamente.
Outro usuário replicou dizendo que “as comunidades judaicas têm promovido o tipo exato de ódio dialético contra os brancos que afirmam querer que as pessoas parem de usar contra eles”, e que ” as populações judaicas no Ocidente estavam começando a perceber que as minorias inundando seu país não gostam muito delas”.
Ele finalizou com uma provocação: “Você quer que a verdade seja dita na sua cara, aí está”.
Em resposta a ao comentário associado ao antissemitismo, Musk escreveu: “Você disse a verdade”. A postagem inicial de Musk recebeu cinco milhões de visualizações, e ele seguiu com comentários sobre o tema na mesma linha de argumentação.
Mais tarde, o dono do Twitter comentou um post de um usuário holandês que reclamou que os brancos não “podem ter orgulho da sua raça”, dizendo: “é super-confuso”.
Até a Casa Branca reagiu, classificando os comentários de “abomináveis”.
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