Londres -A COP28 parecia uma grande oportunidade para o Brasil sob a liderança do presidente Lula dar a um mundo assustado com as mudanças climáticas e com a crise da biodiversidade um recado diferente do que foi transmitido sob a administração de Jair Bolsonaro, durante a qual o desmatamento disparou e os conflitos em terras indígenas ocuparam as manchetes − mas não foi o que aconteceu.

No quarto dia da cúpula, o país ganhou da ONG Climate Action Network o troféu Fossil of The Day. O Brasil não foi o único agraciado com o “antiprêmio”.

Um dia antes, o troféu foi para a Nova Zelândia, pelo retrocesso em suas políticas climáticas, para os EUA e Japão, veteranos no Fossil of The Day, que também ganharam na COP27. Junto com o Brasil, subiu ao pódio a África do Sul.

O troféu foi um reflexo da perplexidade com que a imprensa mundial recebeu a decisão do Brasil de afiliar-se à Opep+, o grupo de observadores da Organização de Países Produtores de Petróleo.

Certa ou errada pela ótica da política, da economia ou da diplomacia, a decisão foi um desastre para a reputação do Brasil. E simbolizou a atmosfera que vem marcando a COP28: pragmatismo, e não idealismo.

Jornal simpático a Lula criticou participação do Brasil na COP28

O jornal britânico The Guardian, entusiasta do presidente Lula, escreveu:

“Quaisquer pretensões que ele pudesse ter de uma liderança climática mais ampla no corte de combustíveis fósseis foram enfraquecidas quando seu ministro da Energia, Alexandre Silveira, escolheu a abertura da maior conferência ambiental do planeta como o momento para anunciar que o Brasil planeja alinhar-se mais estreitamente com o maior cartel petrolífero do mundo”.

O tom foi o mesmo na imprensa de outros países, inclusive na do Brasil, e dá motivos para reflexão sobre estratégias para comunicar o que não necessariamente será bem recebido, mas não tem como ser evitado. Seria a COP28 o melhor lugar para anunciar a adesão, mesmo sendo ela justificável para os interesses nacionais?

Lula continua tendo um capital de imagem imenso no mundo. Talvez por isso, a reação do Guardian e de outros jornais tenha sido de decepção, já que a primeira COP com o presidente empossado no cargo, ao lado de Marina Silva e Sônia Guajajara como ministras de Estado, criou a expectativa de uma participação triunfal.

A lição observando-se como a mídia reagiu é que esse capital não foi suficiente para neutralizar as preocupações de um movimento de comunicação que parece ter sido mal calculado.

O jogo é complexo, com muitas variáveis. Uma cobertura negativa não significa perda de financiamentos ou de assento em fóruns climáticos. No entanto, a pergunta é: precisava anunciar agora?

Países criticados na conferência do clima da ONU

O Brasil do presidente Lula não é o único criticado na COP28. Correspondentes que estão fazendo análises sobre a conferência da ONU para o MediaTalks, comentando a participação − ou a não participação − de seus países (para uma edição especial que circulará na semana que vem) relatam histórias parecidas.

Na Suécia, EUA, Itália, Argentina e Reino Unido, a cúpula em Dubai serve como motivo para a imprensa expor as fragilidades de suas políticas ambientais.

Mas nada se compara aos donos da casa. No domingo, o jornal The Guardian revelou declarações inacreditáveis do criticado presidente da COP28, o sultão Ahmed al Jaber, em um arroubo de negacionismo climático.

Dialogando em um debate com Mary Robinson, ex-ministra da Irlanda, referência em mudanças climáticas, ele disse não haver evidências científicas sobre o efeito da redução de combustíveis fósseis sobre o aquecimento global.

E pediu que alguém mostrasse como reduzir preservando o desenvolvimento econômico, sem fazer as pessoas voltarem à era das cavernas.

Choveram críticas, e até a ONU divulgou um comunicado listando os motivos pelos quais o aquecimento global está associado aos combustíveis fósseis − discretamente, sem se referir ao comentário do líder que ela aceitou para presidir o encontro apesar de seu cargo de CEO de empresa petrolífera.

No dia seguinte, ele teve que voltar atrás, e disse, como sempre, que as palavras foram tiradas do contexto.

Mas é outro episódio a lembrar aos comunicadores e aos líderes de organizações: não é apenas o que se fala. É como, com quem e principalmente quando se fala.