Londres – Depois de perder filhos, esposa e neto em um bombardeio em outubro, o chefe da rede Al Jazeera em Gaza, Wael Dahdouh, viu seu filho mais velho, repórter e cinegrafista da emissora, se tornar mais um profissional de imprensa vítima da guerra entre o Hamas e Israel.
O carro de reportagem em que Hamza Al-Dahdouh estava foi atingido por um míssil disparado por um drone na manhã de domingo (7) em uma estrada entre Khan Younis e Rafah. No ataque morreu também o jornalista freelance Mustafa Thuraya.
Horas depois, um porta-voz das Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) confirmou que uma aeronave militar fez o ataque “após ter identificado um terrorista operando uma aeronave que representava uma ameaça para as tropas”, e que estava ciente de que “dois outros suspeitos” viajando no mesmo carro também foram atingidos.
Al Jazeera disse que repórter ia cobrir drama de refugiados
O grupo iria fazer uma reportagem em uma área de Moraj, que tem sido bombardeada pelo exército de Israel mesmo sendo uma zona humanitária.
Segundo a Al Jazeera, Hamza Al-Dahdouh, de 27 anos, documentaria o drama dos que fugiram de outras regiões em busca de segurança mas continuavam sob risco.
Na véspera do ataque, o jornalista fez uma homenagem ao pai no Instagram, onde tinha mais de um milhão de seguidores. Referindo-se à coragem de continuar trabalhando depois de perder familiares, ele escreveu:
“Você é firme e paciente. Não se desespere com a misericórdia de Deus. Tenha certeza de que ele o recompensará.”
A rede Al Jazeera mostrou em uma reportagem os destroços do carro e o velório do jornalista, com o pai, Wael al-Dahdouh, em lágrimas e segurando sua mão.
O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, em visita ao Oriente Médio, disse que a morte de Hamza al-Dahdouh foi “uma tragédia inimaginável”.
Em comunicado, a Al Jazeera Media Network condenou o ataque, que classificou como assassinato.
“O assassinato de Mustafa e Hamza a caminho para cumprir o seu dever na Faixa de Gaz reafirma a necessidade de tomar medidas legais imediatas e necessárias contra as forças de ocupação para garantir que não haja impunidade.
A rede acrescentou que o ato “confirma, sem dúvida, a determinação das forças israelenses em continuar estes ataques brutais contra jornalistas e suas famílias, com o objectivo de desencorajá-los de cumprir a sua missão, violando os princípios da liberdade de imprensa e prejudicando o direito à vida.”
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Israel e a rede do governo do Catar
A rede Al Jazeera, de propriedade do governo do Catar, registra diversos incidentes envolvendo seus jornalistas e o exército de Israel, alguns fatais.
Em 2022, a repórter Shireen Abu Akeleh, uma das personalidades mais conhecidas da mídia no mundo árabe, foi morta quando cobria uma operação militar na Cisjordânia junto com outros profissionais de imprensa e identificada pelo colete e capacete de proteção.
Inicialmente Israel alegou que havia um fogo cruzado no local, mas diversos relatórios apontaram o contrário, e atribuíram os disparos aos soldados do país.
Dias após o ataque do Hamas a Israel, em outubro, equipes que acompanhavam de longe um combate entre Israel e o Hezbollah na fronteira do país com o Líbano, entre elas uma da Al Jazeera, foram atingidas por mísseis. O cinegrafista Issam Abdallah morreu.
Uma investigação da organização Repórteres Sem Fronteiras apontou que o grupo tinha sido identificado como imprensa antes dos disparos.
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Há vários anos, mesmo antes da guerra em Gaza, o exército de Israel tem sido acusado de atacar jornalistas deliberadamente por organizações de mídia e de liberdade de imprensa, mas chamou de “ridícula” a acusação, alegando ser o único país do Oriente Médio com imprensa livre.
Segundo a Federação Internacional de Jornalistas, 68% dos jornalsitas mortos no mundo em 2023 perderam a vida na guerra entre o Hamas e Israel.
Em seu balanço de fim de ano, a organização contabilizou 75 vítimas, incluindo os profissionais de imprensa que estavam a serviço no momento de um ataque e os que estavam em casa ou em abrigos.
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