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Inteligência artificial, jornalismo e desinformação: uma lista de desejos para 2024

Homem em cenário de códigos de inteligência artificial (IA)

Foto gerada por IA/ Pixabay

Londres – Em dezembro de 2022, o ChatGPT tinha apenas dois meses de vida e o deslumbramento com a IA ainda não dava muito espaço para preocupações a respeito do impacto sobre o ecossistema de informação, compreendendo não apenas imprensa, mas também plataformas de vídeo, redes sociais, serviços de mensagem e todas as formas possíveis de transmitir notícias e também de propagar desinformação. 

Mas vários dos especialistas escalados anualmente pelo Nieman Lab (site da Fundação Nieman para o Jornalismo em Harvard) para compartilhar sua visão sobre o futuro da imprensa já estavam de olho nos riscos e oportunidades da IA − do uso para compensar a falta de recursos que assola o jornalismo local até as fake news.

O que veio depois todos sabem.

Medos diversos endossados até por gente da tecnologia como Elon Musk, deepfakes ainda mais convincentes, redações importantes flagradas usando a IA de forma questionável e o mais importante: o entendimento de que ela se tornou uma tecnologia ao alcance de quase qualquer pessoa, não apenas de hackers ou de profissionais.

Previsões para o jornalismo sem IA na equação?

Na lista do Nieman Lab deste ano vários articulistas fazem previsões que envolvem a IA, mais do que na edição passada. Um deles é David Cohn, cofundador da plataforma de relacionamento Subtext.

Em 2022 ele tinha feito uma graça que na época era original mas depois se tornou comum: pediu uma ajuda à inteligência artificial.

Usando vários serviços de IA generativa, Cohn criou um texto e um vídeo descrevendo a visão de que a IA é uma habilidade especializada e alguns − mas nem todos − jornalistas saberiam aproveitá-la para melhorar o ecossistema de notícias.

Para quem despreza os chatbots por informarem o óbvio, a “previsão” confirma a tese de que não se pode esperar pensamento original de um sistema criado para capturar na internet e processar o que pessoas disseram e escreveram antes.

O palpite pode não ter sido original, mas foi acertado diante de situações como a da Sports Illustrated, que viu seu CEO e vários executivos demitidos em dezembro de 2023 após a revelação de que conteúdos gerados por IA feitos por autores inventados foram publicados sem sinalização.

Nem todos estão sabendo usar, alertou a própria IA em 2023. 

Este ano, Cohn foi para o outro extremo, fazendo para a edição 2024 do Nieman Lab nada menos do que 99 previsões para o jornalismo que não envolvem a inteligência artificial.

Erradas ou certas, elas são ousadas porque parecem ignorar uma realidade: a de que a IA circula nas veias da produção de conteúdo, queiramos ou não, saibamos ou não, tenhamos medo ou não, odiemos ou não.

É difícil imaginar 99 previsões sem que pelo menos algumas a levem em conta.

Como lidar com desinformação na era da IA, na visão da NewsGuard

Mais realistas, outros convidados exploraram com lidar com o inevitável. Uma das visões mais interessantes é a de Matt Skibinski, diretor do NewsGuard, iniciativa dos EUA dedicada a monitorar desinformação.

O título não deixa dúvidas sobre o risco futuro: ”A IA democratizará a desinformação”.

Ele cita uma mensagem de voz que criou em minutos por um aplicativo de “representação de voz de celebridades” simulando o presidente dos EUA, Joe Biden, avisando a moradores de uma localidade que o local de votação tinha mudado, e indicando uma cidade longe dali. 

“Foi tão fácil que qualquer um poderia fazer”, escreveu Skibinski. Mas ele não é catastrofista, e aponta rumos em vez de só lamentar.

O primeiro é as empresas de IA salvaguardarem seus produtos contra a utilização indevida, usando as ferramentas de que dispõem.

O segundo é as plataformas digitais serem mais vigilantes na identificação dos sites de notícias gerados por IA não confiáveis e capacitarem os leitores a separarem o falso do verdadeiro.

O terceiro é a eliminação do que ele classifica como incentivo financeiro das empresas à desinformação, “financiada em parte por 2,6 bilhões de dólares em receitas de publicidade programática todos os anos”.

O diretor do NewsGuard finaliza recomendando “aos que estão no negócio de credibilidade” − os editores de veículos de imprensa − explorarem a IA como aliada e não inimiga na luta contra a desinformação.

Não são bem projeções, parecendo mais uma lista de desejos − que todos torcem para que sejam atendidos.

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