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Parlamento Europeu aprova lei de liberdade de imprensa mas mantém possibilidade de ‘spyware’ em jornalistas

Vera Jourova, vice-presidente da Comissão Europeia, discursa na sessão de votação de nova lei de liberdade de imprensa

Vera Jourová, Vice-presidente da Comissão Europeia, em discurso na sessão do Parlamento Europeu que votou a nova lei (Foto: Frédéric Marvaux / © União Europeia

Londres – O Parlamento Europeu provou nesta quarta-feira (13) a nova lei de lei de liberdade de imprensa da União Europeia, destinada a proteger os jornalistas e os meios de comunicação contra interferências políticas e econômicas e contra o impacto das plataformas digitais sobre o jornalismo. 

 A lei European Media Freedom Act foi aprovada por 464 votos a favor, 92 contra e 65 abstenções, e ainda terá que ser implementada localmente nos países que fazem parte do bloco, um caminho que pode ser lento e complexo em algumas nações europeias com histórico de restrições ao trabalho da imprensa. 

Embora a receptividade tenha sido positiva por parte de organizações de liberdade de imprensa, o texto final admite o uso de spyware para vigiar jornalistas “em casos estritamente definidos”, o que foi objeto de controvérsia nas primeiras versões do projeto. 

Entenda os principais pontos da nova lei de liberdade de imprensa 

Proteção das fontes 
  • As autoridades serão proibidas de pressionar jornalistas e editores a divulgarem as suas fontes, especialmente por meio de detenções, sanções, buscas em escritórios ou da instalação de software de vigilância intrusivo nos seus dispositivos eletrónicos.
  • O Parlamento salientou ter acrescentado “salvaguardas consideráveis” para permitir a utilização de spyware, o que só será possível caso a caso e determinado por uma autoridade judicial que esteja investigando crimes graves puníveis com pena de prisão.
  • Mesmo nestes casos, os jornalistas terão o direito de ser informados após a ocorrência da vigilância e poderão contestá-la em tribunal.
Independência editorial dos meios de comunicação públicos
  • Para evitar que os meios de comunicação públicos estatais sejam utilizados para fins políticos, os seus dirigentes e membros dos conselhos de administração devem ser selecionados através de procedimentos transparentes e não discriminatórios para mandatos suficientemente longos.
  • Não será possível demiti-los antes do término do contrato, a menos que deixem de atender aos critérios profissionais.
  • Os meios de comunicação social públicos terão de ser financiados através de procedimentos transparentes e objetivos, e o financiamento deverá ser sustentável e previsível.
Transparência de propriedade
  • Para permitir que o público saiba quem controla os meios de comunicação social e quais os interesses que podem influenciar as reportagens, todos os meios de comunicação, independentemente de seu tamanho, terão de publicar informações sobre os seus proprietários em uma base de dados nacional, incluindo se são propriedade direta ou indireta do Estado.
Alocação justa de publicidade estatal
  • Os meios de comunicação também terão de informar sobre os fundos recebidos da publicidade estatal e sobre o apoio financeiro estatal, incluindo de países estrangeiros.
  • Os fundos públicos para os meios de comunicação ou plataformas online terão de ser atribuídos através de critérios públicos, proporcionais e não discriminatórios.
  • As informações sobre as despesas publicitárias do Estado deverão ser públicas, incluindo o valor total anual e o valor por veículo.
Proteção do jornalismo contra efeito das plataformas digitais
  • A lei tem um mecanismo para impedir que plataformas online de grande dimensões, como o Facebook, o X (antigo Twitter) ou o Instagram, restrinjam ou eliminem arbitrariamente conteúdos de meios de comunicação independentes.
  • As plataformas terão primeiro de distinguir os meios de comunicação independentes das fontes não independentes. O veículo deverá ser notificado quando a plataforma pretender excluir ou restringir seu conteúdo e terá 24 horas para responder.
  • Somente após a resposta (ou na ausência dela) a plataforma poderá excluir ou restringir o conteúdo caso ainda não cumpra suas condições.
  • Os meios de comunicação terão a opção de levar o caso a um órgão extrajudicial de resolução de litígios e solicitar um parecer do Conselho Europeu dos Serviços de Comunicação Social (um novo conselho de reguladores nacionais da UE a ser criado).

Reação das organizações de imprensa 

Em nota conjunta, 20 organizações de direitos humanos e liberdade de imprensa locais e internacionais como Repórteres Sem Fronteiras, Article 19, Transparência Internacional, Comitê para Proteção de Jornalistas, Instituto Internacional de Imprensa e Federação Internacional de Jornalistas saudaram a aprovação da nova lei como passo importante para promover a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação em um contexto de declínio do Estado de direito. 

“Quando o Estado de direito é prejudicado, o jornalismo independente é muitas vezes o primeiro a sofrer.”

As entidades viram na nova lei dispositivos adequados para “enfrentar eficazmente as ameaças a um jornalismo livre, independente e vibrante na Europa”, incluindo” a captura dos meios de comunicação, a vigilância intrusiva, a interferência política, o declínio do pluralismo dos meios e o poder desenfreado das redes sociais e plataformas de mídia digital”. 

No entanto, observaram que em determinadas áreas, a lei aprovada pelo Parlamento “apenas estabelece o mínimo de normas”.

Por isso, diz a nota, os países que fazem parte da União Europeia ” podem e devem ir muito mais longe no estabelecimento de salvaguardas mais sólidas para proteger a liberdade e o pluralismo e os direitos dos jornalistas, em particular contra a utilização de vigilância intrusiva e de spyware”.

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