Londres – Os primeiros movimentos de Donald Trump em seu segundo mandato como presidente dos EUA têm confirmado os temores sobre a desvalorização de veículos de imprensa e de jornalistas que não seguem suas narrativas, com atos seguidos em quase três semanas que configuram uma verdadeira guerra com a grande mídia. 

Na semana passada, a secretária de imprensa de Trump, Karoline Leavitt, causou ondas de choque ao anunciar que “jornalistas independentes, podcasters, influenciadores de mídia social e criadores de conteúdo” seriam bem-vindos nas coletivas de imprensa da Casa Branca.

Essa medida, que poderia parecer positiva, tem se mostrado uma forma de favorecer os amigos.

Guerra de Trump com a mídia se repete

A história não é nova. Durante o primeiro mandato de Trump, veículos como Fox News tiveram tratamento preferencial, enquanto repórteres de organizações consideradas “hostis” foram banidos de briefings informais.

Veículos alinhados à extrema-direita, como Breitbart News e One America News, também receberam acesso favorável por transmitirem mensagens alinhadas a Trump.

Na era Trump 2.0, entretanto, a recompensa pelo apoio vem se tornando mais formal.

No novo “programa anual de rotação de mídia” do Pentágono, os dois substituíram a NBC News e a National Public Radio, respectivamente, no espaço de trabalho físico da sede do Departamento de Defesa dos EUA.

Essa medida, segundo o porta-voz do órgão, Jonathan Ullyot, tem como objetivo de “ampliar o acesso ao espaço limitado do Corredor dos Correspondentes”. No entanto, a “rotação” prioriza veículos pró-Trump.

O tabloide The New York Post, de propriedade de Rupert Murdoch, dono da Fox, também foi convidado a substituir o escritório usado pelo The New York Times. O HuffPost tomará o lugar do Politico – que virou alvo de críticas do presidente por supostamente receber financiamento público, o que o veículo negou categoricamente. 

A Casa Branca assinava um boletim com análise de mídia, também assinado por organizações públicas e empresas privadas, uma prática comum na mídia, e não financiamento para produção de reportagens. 

O National Press Club manifestou preocupação com as mudanças no Pentágono, destacando que “qualquer ação que restrinja a capacidade dos jornalistas de relatar as operações do governo deve alarmar todos que valorizam a transparência e a liberdade de imprensa”.

Ao mesmo tempo, a aliança de Trump com a Fox se torna cada vez mais forte. A nora do presidente, Lara, ganhou um programa em um importante horário do canal, o sábado à noite, enquanto quase 20 ex-profissionais da rede foram nomeados para cargos na administração federal. 

Impacto sobre a confiança em instutições vitais para a democracia

Em artigo no portal acadêmico The Conversation, o professor de sociologia de mídia digital Steven Buckley, da University of London, aponta que a proeminência de influenciadores partidários, juntamente com a polarização da mídia, pode diminuir a confiança do público nas instituições essenciais para a democracia, como a imprensa.

Em meio a essa confusão, a saída do âncora Jim Acosta, da CNN, representa a tempestade perfeita que se abate sobre o jornalismo norte-americano, formada pela combinação de tentativas de evitar conflitos com Trump e batalha para reverter declínio de audiência.

Crítico do presidente, Acosta anunciou na semana passada que estava deixando a rede por se recusar a trocar o horário nobre das 10h da manhã por um espaço entre meia-noite e 2 da manhã, apelidado de ‘cemitério’ devido à baixa audiência. 

Apesar de a CNN garantir que a mudança não tinha a ver com as posições políticas do âncora e sim com a necessidade de aumentar audiência no horário antes ocupado por ele, o movimento alegrou Trump.

Ele comemorou a notícia em sua rede social chamando o prestigiado profissional de “um dos piores e mais desonestos repórteres da história jornalística, um grande canalha”, sinalizando tempos complicados para jornalistas e veículos que não sigam a cartilha da Casa Branca.