Em resumo
- Charlie Kirk, líder conservador morto em Utah, fundou a Turning Point USA e se tornou uma das vozes mais influentes da direita jovem nos EUA.
- De podcasts a grandes conferências, ele expandiu sua influência nacional, aproximando estudantes do Partido Republicano e gerando polêmicas por desinformação e ‘lista negra’ de professores acusados de viés esquerdista
O assassinato do ativista conservador Charlie Kirk durante uma palestra na Utah Valley University, em 10 de setembro, gerou ampla condenação e chamou a atenção para o clima de violência política nos Estados Unidos.
Para muitos, Kirk não era apenas mais um comentarista partidário. Ele era um dos líderes com maior visibilidade do movimento conservador jovem.
Kirk ajudou a moldar a política republicana nos campi universitários, na mídia e dentro da coalizão do presidente Donald Trump.
Para entender o significado do ataque — e por que as reações foram tão fortes — é preciso saber quem era Kirk, o que a organização que ele construiu representava e o papel que ele e seus aliados desempenharam nos debates nacionais.
Kirk, destaque precoce na mídia
Charlie Kirk era um ativista conservador, autor de livros e celebridade da mídia que ganhou destaque de forma precoce, uma situação incomum.
Criado nos subúrbios de Chicago, ele apareceu nas manchetes nacionais aos 18 anos ao fundar a Turning Point USA, um movimento juvenil conservador.
Kirk frequentou a universidade por pouco tempo. Em vez de estudar, ele escolheu dedicar-se em tempo integral à organização conservadora.
Essa decisão tornou-se central para o mito em torno dele: ele representava uma escolha entre jovens conservadores promissores de abandonar a educação superior em protesto contra o alegado viés de esquerda das universidades.
Ao longo da década seguinte, Kirk se tornou uma figura nacional. A partir de 2016, ele passou a discursar com frequência em comícios de Trump, o que o ajudou a construir um extensa presença na mídia.
Em 2020, ele publicou The MAGA Doctrine (A Doutrina MAGA), um livro best-seller que defendia o nacionalismo e a “Agenda America First” de Trump.
Seu podcast homônimo — The Charlie Kirk Show — foi baixado mais de 120 milhões de vezes nos últimos 10 meses, segundo a Turning Point.
O programa trazia comentários políticos e entrevistas com personalidades e políticos republicanos de destaque — entre eles Tucker Carlson, o senador Josh Hawley, do Missouri, e o governador Ron DeSantis, da Flórida. Essas conversas ampliaram o alcance de Kirk muito além do público estudantil.
Leia também | Como influenciadores de notícias cobriram o assassinato de Charlie Kirk
Ligando estudantes universitários ao Partido Republicano
A Turning Point USA foi fundada em 2012 por Kirk e Bill Montgomery. Kirk conheceu Montgomery, um empresário aposentado, após fazer um discurso em um encontro de jovens conservadores em Illinois.
Montgomery o incentivou a não seguir para a universidade e a dedicar-se totalmente à construção de um movimento conservador juvenil.
Kirk descreveu os primeiros dias como solitários: dirigia até campi, distribuía panfletos e tentava recrutar estudantes para falar sobre livre mercado e governo limitado.
A Turning Point atraiu apoio financeiro significativo de doadores conservadores de destaque, incluindo Foster Friess, o financista de Wyoming; a Richard and Helen DeVos Foundation; e o empresário de Illinois Richard Uihlein e sua fundação familiar.
Em 2024, a Turning Point afirmou ter filiais em mais de 1 mil campi, empregando mais de 400 funcionários e tendo expandido seu orçamento anual para mais de US$ 8 milhões (cerca de R$ 43 milhões).
Atualmente, a Turning Point é mais conhecida por sediar conferências que reúnem multidões. Seu Student Action Summit, na Flórida, regularmente reúne entre 4.000 e 5.000 estudantes e já contou com participações de figuras importantes do Partido Republicano, incluindo Donald Trump Jr. e o senador Ted Cruz, do Texas.
Um encontro em Phoenix em 2022, chamado AmericaFest, atraiu mais de 10.000 participantes.
De forma mais controversa, a página Professor Watchlist publica nomes de acadêmicos acusados de viés contra conservadores.
A Turning Point também deu origem a subsidiárias alinhadas, incluindo Turning Point Action e TPUSA Faith. Essas organizações ampliaram o alcance da Turning Point para a política eleitoral e a organização em igrejas.
A divisão de mídia da TPUSA produz uma série constante de vídeos, transmissões ao vivo e podcasts populares — um legado que deve garantir que a influência de Kirk continue apesar de sua morte.
Leia também | Fake news online são vistas como a maior ameaça global, diz novo estudo
Expansão do papel nacional da Turning Point
Kirk e a Turning Point proporcionaram conexões importantes para jovens conservadores e para o Partido Republicano. Em 2016, a Turning Point mobilizou milhares de estudantes para a campanha de Trump, e Kirk foi convidado a falar na Convenção Nacional Republicana.
Em 2020, a organização passou a ter um papel político mais explícito. A Turning Point Action promoveu campanhas de registro de eleitores em estados decisivos e patrocinou ônibus e anúncios para levar apoiadores a Washington, D.C., antes do comício “Stop the Steal” de 6 de janeiro de 2021.
Na época, Kirk tuitou que a Turning Point enviaria “mais de 80 ônibus cheios de patriotas” para o evento.
Embora tenha posteriormente apagado a mensagem e se distanciado da violência, o episódio destacou o envolvimento do grupo em alguns dos momentos mais controversos da era Trump.
Kirk também atuou como porta-voz midiático crucial de Trump. Ele usava seu podcast, as redes sociais e turnês de palestras para amplificar a mensagem do atual presidente e atacar críticos.
Foi um dos primeiros e mais persistentes promotores das alegações infundadas de fraude eleitoral em 2020, ajudando a traduzi-las para o público conservador mais jovem.
Leia também | Casa Branca estreia no TikTok com vídeo de Trump absoluto: “I am your voice”
Disseminação de desinformação e tensões
Críticos argumentaram que Kirk prosperava mais com indignação e intimidação do que com debate.
A Professor Watchlist foi denunciada por associações de professores como uma lista negra que inibe a liberdade acadêmica.
Investigações jornalísticas de veículos como a The New Yorker levantaram questões sobre as finanças da Turning Point, incluindo alegações de falta de clareza entre atividades educacionais sem fins lucrativos e campanhas partidárias.
Kirk foi acusado de espalhar desinformação, como alegações falsas de fraude eleitoral em 2020 e declarações enganosas sobre vacinas contra a COVID-19 e mandatos de uso de máscara.
Ele sugeriu que medidas de saúde pública eram uma forma de controle governamental — retórica que, segundo especialistas em saúde pública, minou a confiança durante a crise.
De forma mais ampla, seus ataques incisivos a opositores políticos — que ele não retratava apenas como errados, mas como perigosos — renderam acusações de que ele alimentava a polarização e inflava tensões nos campi universitários dos EUA e além.
Este artigo foi publicado originalmente no portal acadêmico The Conversation e é republicado aqui sob licença Creative Commons.