Um novo estudo interno da Meta constatou que o Instagram distribui mais conteúdos ligados a transtornos alimentares para adolescentes que já se sentem mal com seus próprios corpos, sobretudo meninas.
Segundo o documento, para 223 dos jovens que normalmente se sentiam mal com seus corpos após ver o Instagram, conteúdos desse tipo correspondiam a cerca de um a cada dez postagens (10,5%) em seus feeds. Entre os outros jovens, a taxa foi de apenas 3,3%.
Destinado a entender melhor as experiências de jovens no Instagram e no Facebook, o relatório consolida os resultados de uma análise qualitativa de amostras de conteúdo e do Youth Social Emotional Trends (MYST), um estudo de longo prazo que acompanhou a vida de 1.149 adolescentes americanos e seus pais por um ano letivo (2023-2024), cruzando postagens com vivências comportamentais.
O documento foi revelado pela Reuters nesta segunda-feira (20), obtido pela agência de notícias de uma fonte não identificada. A Meta não questionou a veracidade dos dados.
Mais conteúdo nocivo no Instagram de jovens vulneráveis
Para a análise, os pesquisadores coletaram amostras dos conteúdos exibidos ao público durante três meses, a fim de avaliar a exibição de “conteúdos paralelos a transtornos alimentares”.
A classificação inclui posts com corpos sexualizados (focando peitorais, nádegas e coxas) ou ligados a dieta, emagrecimento e saúde.
Jovens que relatam altos índices de insatisfação corporal ligado ao conteúdo do Instagram podem ter visto quase três vezes mais conteúdo focado em corpo e transtornos alimentares quando comparado a outros jovens, afirma o documento.
O levantamento também aponta que o público feminino é o principal atingido pela distribuição desse tipo de conteúdo.
Cerca de três quartos (74%) das participantes que relatavam frequente insatisfação corporal depois de navegarem no Instagram eram meninas. Já nos grupos com pouca ou nenhuma insatisfação corporal, o índice era de 50%.
Os pesquisadores constataram também que os impactos ocorrem no início da adolescência — com 54% dos que relataram alta insatisfação corporal serem jovens entre 13 a 15 anos de idade.
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Jovens recebem mais conteúdo sensível
Alguns dos conteúdos exibidos no Instagram eram tão explícitos que o estudo interno recomendou à Meta a inclusão de uma classificação de “conteúdo sensível” para algumas das publicações, sem levar em conta se o público tenha ou não transtornos alimentares.
Em alguns dos casos, as publicações continham imagens de mulheres muito magras, seguidas de pescoços cortados e o desenho de uma figura chorando, acompanhado de frases como “como eu poderia me comparar” e “faça isso acabar”.
Segundo a pesquisa interna, o mesmo grupo com alta insatisfação corporal via 27% a mais de publicações em outras categorias problemáticas, como “temas maduros”, “comportamento de risco”, “crueldade” e “sofrimento”.
Em contrapartida, os que apresentavam pouca ou nenhuma insatisfação corporal viam apenas 13,6%.
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Conteúdos não são proibidos pelos termos de uso
Apesar do teor de alguns destes conteúdos, eles não chegam a ferir os termos de uso do Instagram e irão permanecer na plataforma.
No entanto, uma parte deles passou a ser restrito por novas diretrizes de segurança para adolescentes, segundo informou um porta-voz da Meta ao The New York Post:
“Insights das pesquisas, além de consultas a especialistas, nos ajudam a criar as mudanças significativas que fizemos em nossas plataformas para pais e filhos.”
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Conexão entre conteúdos fitness e transtornos
O estudo interno é um dos mais recentes a apontar uma conexão entre os conteúdos fitness, fashion ou de beleza encontrados no Instagram e impactos negativos a jovens com transtornos alimentares.
A primeira grande revelação sobre o problema foi feita em 2021, quando o Wall Street Journal publicou uma pesquisa interna obtida por uma ex-gerente do Instagram constatando os impactos negativos.
No entanto, os próprios pesquisadores do levantamento atual afirmam que “não é possível estabelecer uma relação causal direta por estes resultados.”
Isso porque o estudo não exclui a possibilidade de jovens no grupo mais insatisfeito busquem conteúdo inapropriado por conta própria.
Mesmo assim, jovens, pais, pediatras, especialistas e até mesmo conselheiros da Meta já orientaram a plataforma a limitar o quanto de conteúdo de fitness e beleza deve ser exibido aos jovens, segundo o documento.
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O que diz a Meta
Andy Stone, porta-voz da Meta, informou à Reuters que a pesquisa em questão é uma prova de que a empresa está dedicada a melhorar seus produtos e torná-los “mais seguros para jovens.”
Na semana passada, a big tech anunciou que iria alinhar os algoritmos de exibição de conteúdo com as mesmas classificações indicativas de filmes PG-13, para até 13 anos de idade.
Para alguns países, isso pode não ser o bastante.
O governo da Austrália anunciou uma ação publicitária de 14 milhões de dólares australianos para promover uma nova lei, em vigor em dezembro, que proíbe crianças e adolescentes de acessarem redes sociais.
A Dinamarca estuda uma medida similar, prevendo a idade mínima de acesso para 15 anos.
O documento obtido pela Reuters pode ser conferido na íntegra aqui.
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