Uma imagem falsa de uma suposta explosão nos arredores do Pentágono, prédio do Departamento de Defesa dos EUA em Washington, apontada por especialistas como tendo sido produzida por inteligência artificial, viralizou nesta segunda-feira (22), acentuando preocupações com os efeitos da IA sobre a desinformação e as novas regras de verificação no Twitter.
A imagem, já desmentida pelo governo dos Estados Unidos, foi compartilhada por diversos outros perfis com selo azul de verificação da plataforma, incluindo uma conta que alegava ser associada à Bloomberg News.
Menos de cinco minutos após a publicação, o mercado de ações nos Estados Unidos registrou queda. Das 10h06 às 10h10, o Dow Jones caiu 0,26%, recuperando-se depois dos desmentidos.
Entenda o incidente da imagem falsa
A conta que publicou a foto pela primeira vez, já suspensa, ostentava o selo azul de verificação. Antes da compra do Twitter por Elon Musk, o selo era concedido a pessoas ou organizações certificadas pela plataforma, gratuitamente.
O novo dono instituiu o pagamento, mas a verificação passou a ser falha, com casos de contas falsas em nome até do próprio Musk.
A conta que publicou a imagem nesta segunda-feira tinha o nome de Bloomberg Feed, o que pode ter ajudado a chamar a atenção do mercado financeiro.
A imagem mostrava uma coluna de fumaça nos arredores de um prédio similar ao Pentágono, supostamente causada por uma explosão.
“Grande explosão próxima ao Pentágono, em Washington, D.C. — relato inicial”, dizia o tweet.
O corpo de bombeiros de Arlington, Virgínia, respondeu em um tweet declarando que tanto eles quanto a Agência de Proteção ao Pentágono estavam cientes dos relatos nas redes sociais, desmentindo em seguida:
“NÃO há explosão ou incidente acontecendo nas reservas do Pentágono ou em seus arredores, e não há danos ou impactos ao público.”
Até o momento, não se sabe quem é o autor por trás da publicação.
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Imagem do Pentágono é obra de Inteligência Artificial
Especialistas em manipulação digital se manifestaram na imprensa e nas redes sociais apontando os indícios de que a imagem da explosão no Pentágono é falsa e gerada por IA, e não por programas de tratamento de imagens.
Hany Farid, professor da Universidade de Berkeley e perito forense digital, informou ao CNN Business que a imagem tem traços característicos de obras de inteligência artificial generativa:
“Esta imagem mostra sinais típicos de ter sido sintetizada por IA: há erros estruturais na construção e na cerca que você não veria, por exemplo, caso alguém tivesse acrescentado fumaça a uma foto já existente.”
De acordo com o Insider, outros traços de imagem gerada por algoritmo seriam a variação das colunas e a cerca se fundindo com a calçada em alguns pontos.
Renee DiResta, do Stanford Internet Observatory, corroborou no Twitter com detalhes do motivo pelo qual a criação não parece ser uma “montagem” feita com programas de edição visual, como Photoshop:
“Artefatos estranhos que uma pessoa não teria mudado com o Photoshop. Cercas não funcionam assim.”
Notícia repercutiu no noticiário internacional
A imagem falsa da explosão no Pentágono repercutiu na mídia internacional e foi disseminada em canais da Rússia.
O portal estatal russo de notícias RT foi um dos veículos que compartilhou a imagem como verdadeira. Com 3 milhões de seguidores nas redes sociais, o RT é o principal braço de propaganda do regime Putin, reconhecido por repercutir conteúdo falso sobre a guerra Ucrânia-Rússia.
Segundo o Business Insider, diversas contas associadas a teorias da conspiração na guerra da Ucrânia compartilharam a notícia falsa. Momentos depois, o RT apagou a publicação.
A rede televisiva indiana Republic TV também exibiu o conteúdo do portal russo RT. Segundo a CNN Business, o canal indiano se retratou momentos depois, ao reconhecer que o incidente não ocorreu.
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Imagem falsas, estragos reais
Apesar de as autoridades responderem à imagem falsa o mais rápido possível, o “incêndio” gerado se alastrou a ponto de causar estragos, pois mesmo com o Pentágono desmentindo o acontecido, o conteúdo foi divulgado amplamente nas redes sociais e afetou o mercado financeiro.
Segundo o site de análise de finanças Kobleissi Letter, minutos depois da repercussão internacional, o S&P 500 — índice de valor das 500 maiores empresas do mundo — caiu 30 pontos. O grupo comentou no Twitter:
“Isso representa uma variação de mercado de US$ 500 bilhões só por uma imagem falsa. A situação voltou ao normal quando a imagem foi confirmada como falsa. [A] IA está ficando perigosa.”
O caso é mais um a demonstrar o risco de imagens geradas por inteligência artificial confundirem ou serem usadas com propósitos negativos, que tem sido objeto de alertas diversos.
No início deste mês, o fotógrafo alemão Boris Eldgadsen venceu o prêmio de fotografia Sony World Photo Awards com uma imagem gerada por inteligência artificial.
O artista devolveu o prêmio em dinheiro, explicando que seu objetivo era “suscitar uma discussão” sobre os limites do que é considerado fotografia.
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Com premissa similar, o jornalista britânico Eliot Higgins, do site investigativo Bellingcat, também divulgou imagens de uma suposta prisão de Donald Trump, ex-presidente dos Estados Unidos, também feitas por inteligência artificial.
A publicação, feita no dia em que Trump supostamente seria preso, foi ao ar para alertar sobre o risco de deepfakes circulando na internet.
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