Londres – Neste mês em que vários países dedicam atenção à prevenção do suicídio – no Brasil o movimento ganhou o nome de Setembro Amarelo – diversas campanhas destacam a importância da representação, que envolve linguagem apropriada e formas de abordar questões relacionadas ao bem-estar emocional, reduzindo o estigma e favorecendo um debate informado.
Os temas escolhidos pela OMS (Organização Mundial de Saúde) para assinar até 2026 as iniciativas visando reduzir as taxas de suicídio são “Mudando a Narrativa” e “Começando a Conversa”, enquanto o Setembro Amarelo brasileiro adotou o lema “Se Precisar, Peça Ajuda”.
Mas para pedir ajuda é preciso quebrar o estigma. Segundo a OMS, pelo menos 700 mil pessoas tiram a própria vida por ano no mundo – e muitas dessas mortes seriam evitáveis com mais informação e menos estereótipos, como apontam especialistas entrevistados para um reportagem especial sobre Saúde Mental e Comunicação publicada na semana passada.
Saúde mental, suicídio e o ‘capacitismo’
A falta de cuidado com as palavras em relação a pessoas com deficiência − que se estende a quem experimenta transtornos emocionais − tem um nome: capacitismo, uma forma de preconceito associada a uma suposta inferioridade dos que vivem essas situações.
Há recomendações óbvias, como destaca o guia da Mind UK, maior ONG de saúde mental do Reino Unido, como evitar adjetivar alguém como doido, lunático ou maníaco, pois isso banaliza patologias.
Outra situação apontada é chamar alguém que gosta de arrumação de “um pouco TOC”.
Indo além das palavras, a Mind aponta abordagens que dão impressões equivocadas, como partir da premissa de que todos são capazes, se tentarem direitinho, de resistir aos efeitos do estresse, da depressão, da ansiedade.
Essa ideia é um obstáculo para busca de ajuda, pois denota fraqueza que nem todos querem admitir diante de parentes ou chefes.
Guias como o da OMS recomendam não usar a expressão “cometer suicídio”, o que sugere um “crime”.
O recomendado é “morte por suicídio”, ou a “tirar a própria vida”. Não se deve especular sobre causas ou descrever métodos ou lugares onde o caso ocorreu.
Outro lembrete é não explicar que a pessoa “escolheu” tirar a própria vida, por não ser uma escolha racional e sim um ato em um momento de desespero.
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Manuais ensinam a linguagem correta para falar de suicídio
Diversas organizações não-governamentais dedicadas ao bem-estar emocional e à prevenção do suicídio oferecem guias de linguagem, muitos inspirados no da própria OMS.
Os grandes meios de comunicação têm manuais de redação orientando profissionais a utilizarem expressões e abordagens sensíveis.
Mas essa não é apenas uma responsabilidade da imprensa, e os preconceitos não aparecem apenas quando o tema da matéria ou da conversa é doença mental.
A linguagem adequada em conversas informais, em postagens em redes sociais e em interações profissionais pode fazer muita diferença para combater o estigma e não ofender, mesmo que involuntariamente, ou desestimular a busca por ajuda.
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Pesquisa mostra desafio de mudar a linguagem
Muitos desses conselhos não são novidade. Mas, neste mês em que se observa com mais atenção o desafio de reverter um quadro dramático, não custa lembrar, já que o que parece óbvio para alguns pode não ser tanto assim para outros, como mostra um estudo da Mind UK.
A pesquisa constatou que 66% dos entrevistados acham que o público deve ter cuidado com a forma como se refere a questões de saúde mental e suicídio.
No entanto, uma em cada cinco disse acreditar que “sociopata” (22%), “totalmente TOC” (22%) e “um pouco maluco” (20%) são termos aceitáveis.
Falar ou não de suicídio?
Em dos artigos da reportagem especial, a jornalista brasileira Claudia Wallin destaca a opinião de um especialista sueco que está entre os que discordam da tese de que que noticiar suicídio poderia fazer “acordar o urso”.
Michael Westerlung, do Centro Nacional para Pesquisa e Prevenção de Suicídio do país, afirma que isso é um mito, que por muito tempo impediu um debate adequado.
Outro mito destacado por ele é classificar o ato de tirar a própria vida como algo inevitável. Estudos mostram que pessoas que fizeram tentativas tiveram dúvidas até o último momento, o que também é apontado pela OMS.
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Reportagem Especial MediaTalks – Comunicação, Imprensa, Redes Sociais e a crise da Saúde Mental