Londres – Seguindo os passos de ambientalista do pai, o rei Charles, que no passado não era tão levado a sério em uma época em que muitos ainda não haviam reconhecido a importância da sustentabilidade ambiental, o príncipe William anunciou que vai à COP30, em Belém.
Charles III abriu a COP28, em Dubai. Mas este ano ficou em casa. O tratamento de câncer pode ter sido um motivo, embora ele tenha ido pouco antes à Austrália.
Ou talvez o meio ambiente tenha deixado de ser prioridade para o monarca, que no trono passou a lidar com problemas maiores. A começar pelo futuro da monarquia, desgastada sobretudo entre os jovens.
Ele pode também ter julgado prudente evitar posar de ativista sendo o chefe de Estado de um dos países mais ricos do mundo, quando eles são cobrados a contribuir para o objetivo da COP29: financiar a adaptação climática em países menos desenvolvidos – vários deles ex-colônias britânicas.
William na COP30: agenda positiva para gerações mais jovens
O filho William dá sinais de uma monarquia modernizada. E a causa do clima se encaixa no contexto de reverter o desgaste da monarquia junto aos jovens.
Um dos grandes projetos do herdeiro da coroa britânica é o Earthshot Prize, que destina anualmente 1 milhão de libras para iniciativas ambientais em vários países.
Este ano o anúncio dos vencedores foi na distante (de Londres) África do Sul, para onde o príncipe arrastou seus assessores e provavelmente viajou de jatinho – um dos maiores inimigos do clima.
Mas no melhor estilo RP da realeza britânica, ele mandou um recado para os críticos da fast fashion, outra vilã dos ativistas: usou um paletó vintage na cerimônia.
A assessoria fez chegar à imprensa que a peça fora comprada em um brechó de Londres.
O nome do brechó não foi informado, nem a marca do blazer de quatro botões. Um amigo que conhece bem moda maasculina acha que a peça parece ter sido feita sob medida por um alfaiate da Saville Row para algum aristocrata inglês antes de chegar ao brechó.
Esse sartorialista observou ainda que o caimento perfeito poderia ser resultado de ajustes feitos por um alfaiate – o que deve ter custado uma boa quantidade de emissões com idas e vindas de assessores, alfaiates ou do blazer.
Pode ser maldade. Pode ser que o blazer fosse a conta para o príncipe, sem precisar de ajustes.
As contradições do clima: moda ‘sustentável’, jatinhos, lucros
Ainda assim, a escolha abre duas questões. A primeira é sobre fast fashion. Usar roupas vintage ou alugadas virou moda e é bom lance de RP para celebridades.
A mulher do ex-premiê Boris Johnson casou-se trajando um vestido alugado.
Entretanto, uma parcela de ativistas desaprova essa escolha, devido ao transporte de roupas para o aluguel e a energia dispendida para a higienização. Uma peça que dura a vida toda seria uma escolha mais acertada.
A outra questão é mais ampla: a desconexão entre palavras e atos de celebridades que se engajam em sustentabilidade ambiental.
O uso de jatinhos é um exemplo. Há o argumento da segurança. Mas o fato é que o número de famosos e autoridades queimando C02 pelo mundo só cresce, até nas conferências de clima.
Um estudo feito pela Universidade Linnaeus, na Suécia, apontou a COP28 como um dos grandes geradores de voos particulares. A deste ano não deve ter ficado atrás.
Lucrar com o clima é mais uma das vulnerabilidades na reputação de sustentabilidade da monarquia. Segundo o The Times, o rei ganharia pelo menos £28 milhões anuais com parques eólicos graças ao direito feudal de cobrar por cabos que cruzam o Ducado de Lancaster.
As torres pertencem a empresas privadas que as exploram comercialmente. Mas será que o dinheiro precisaria ir para a conta pessoal, ao invés de ser destinado a projetos ambientais?
São as contradições do clima, do RP da realeza britânica e da gestão de reputação de famosos, que precisam cada vez mais redobrar cuidados para alinhar discurso e ações.
Este artigo faz parte da edição especial MediaTalks COP29. Leia aqui a revista completa.