O jornalista britânico Benjamin Hall, correspondente da Fox News na guerra na Ucrânia, falou pela primeira vez sobre a extensão e gravidade dos seus ferimentos após ser atingido em um ataque da Rússia em Kiev, há quase um mês.

No dia 15 de março, o carro em que estava o repórter e mais dois colegas, o cinegrafista Pierre Zakrzewski e a fixer ucraniana Oleksandra Kuvshinova, foi atingido por tropas russas. Zakrzewski e Kuvshinova morreram, enquanto Hall foi internado em estado grave.

“Para resumir, perdi meia perna de um lado e um pé do outro”, escreveu o jornalista ao compartilhar no Twitter uma foto de si mesmo enfaixado e usando um tapa-olho. Ele também machucou a mão e está sem a visão de um olho e sem parte da audição. 

(Foto: Reprodução/Twitter)

Enquanto Hall se recupera, jornalista da Fox defende Rússia na Ucrânia

Ao mesmo tempo em que o jornalista tenta se recuperar dos ferimentos, com sequelas que o acompanharão por toda a vida, a emissora para a qual ele trabalha continua abrigando em seus quadros um dos mais controvertidos jornalistas americanos, que na semana passada chegou a criticar a credibilidade da mídia que cobre a guerra na Ucrânia. 

Tucker Carlson é um comentarista de extrema-direita, apoiador de Donald Trump de primeira hora, e se consagrou como disseminador de desinformação e fake news durante a covid-19. 

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Na guerra da Ucrânia, ele tomou abertamente o partido de Vladimir Putin. Poucos dias antes da invasão, indagou ao espectadores de seu programa noturno “por que os americanos tinham que odiar Putin”. 

Carlson tem recebido diversas críticas pelos esforços em promover pontos de discussão a favor do Kremlin e desinformação sobre a situação na Ucrânia.

Seus comentários estão sendo usados pela mídia estatal russa para “corroborar” a narrativa de Putin sob o “viés” Ocidental, chegando a ser objeto de um email enviado pelo governo às emissoras recomendando a reprodução de trechos de suas falas. 

Na última quinta-feira (7), ele voltou a causar indignação. Depois de reconhecer que os soldados russos haviam “cometido atrocidades”, ele voltou a atacar a cobertura da mídia sobre a guerra.

“Algum número” dessas atrocidades “deve ser real”, disse ele, “mas também podemos estar absolutamente certos de que a guerra não é, apesar do que nos dizem, uma história infantil do bem contra o mal”.

Na Ucrânia, jornalistas vítimas de ataques da Rússia

Os jornalistas que cobrem o conflito certamente discordam. Até agora sete profissionais de mídia perderam a vida na Ucrânia, e há alguns desaparecidos depois de capturados pelo exército russo.

Diferentemente de outras guerras, na Ucrânia as mortes e ferimentos de jornalistas têm sido resultado de ataques diretos, com diversos casos de carros emboscados e alvo de tiros mesmo quando claramente identificados como “Imprensa”.

Esse foi o caso do ataque que tirou a vida do cinegrafista Pierre Zakrzewski e da produtora Oleksandra Kuvshynova e que mutilou Benjamim Hall.

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Ao falar pela primeira vez sobre o caso no hospital onde se recupera, Hall prestou homenagem aos dois colegas que morreram no ataque na Ucrânia durante a cobertura da guerra.

“Já se passaram mais de três semanas […] e eu queria começar a compartilhar tudo. Mas primeiro preciso prestar homenagem aos meus colegas Pierre e Sasha, que não conseguiram [sobreviver] naquele dia”, escreveu o jornalista britânico.

“Pierre e eu viajamos pelo mundo juntos, trabalhar era sua alegria e sua alegria era contagiante. Descanse em paz.”

 Zakrzewski era um cinegrafista veterano de guerras que cobriu vários conflitos para a Fox News, inclusive no Iraque, Afeganistão e Síria. Baseado em Londres, estava na Ucrânia desde fevereiro.

Já a jornalista ucraniana Oleksandra Kuvshynova prestava serviços como fixer para a equipe, ou seja, estava ajudando os dois profissionais da emissora dos EUA a transitar por Kiev e arredores enquanto coletava informações e conversava com fontes. 

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Hall trabalha em Washington e cobre o Departamento de Estado dos EUA para a Fox News, onde está desde 2015.

Ele já atuou para veículos globais como New York Times, The Times, Agence France Press e BBC, e tem grande experiência na cobertura de conflitos. Por isso, foi enviado para cobrir a invasão russa ao território vizinho. 

O jornalista disse que se sentiu “muito sortudo” por ter sobrevivido ao ataque do exército da Rússia na Ucrânia.

“Uma mão está sendo tratada, um olho não está mais funcionando e minha audição está bastante danificada… mas, apesar de tudo, me sinto muito sortudo por estar aqui – as pessoas que me trouxeram aqui são incríveis”.

Com a repercussão da foto e informações sobre seus ferimentos, o jornalista apagou a publicação do Twitter sem fazer qualquer comentário. 

Dias depois do caso de Benjamin Hall, o premiado documentarista Brent Renaud, dos EUA, foi morto na Ucrânia.

Outros jornalistas da Fox polemizam sobre mídia na Ucrânia 

Tucker Carlson não está sozinho na Fox News em suas críticas à mídia na guerra na Ucrânia. Pouco antes do ataque, ele reagiu furioso a um comentário do âncora Greg Gutfield, do programa político The Five.

Gutfield disse no ar que a cobertura na Ucrânia “é muito parecida com outras matérias na era digital, com imagens capturadas  e depois reproduzidas repetidamente para criar algum tipo de resposta emocional em você, porque isso gera lucro para as empresas de notícias.”

Benjamim Hall retrucou: dizendo: “Esta não é a mídia tentando angariar alguma resposta emocional, isso é o que está acontecendo.”

“É uma catástrofe absoluta”, acrescentou. “E as pessoas no local são as que estão realmente sofrendo.”

Teorias conspiratórias da Rússia sobre Ucrânia com ajuda da Fox

A Rússia conseguiu exportar uma antiga teoria de conspiração divulgada no país: a de que os EUA têm “armas biológicas” secretas.

Essa tese infundada chegou ao grupo QAnon e foi amplificada por jornalistas da Fox News, incluindo o próprio Tucker Carlson.

No fim de semana passado, o âncora da Fox foi alvo de um protesto diante de uma igreja onde realizava um evento ao vivo, em San Diego, na Califórnia. 

Manifestantes portavam cartazes e bandeiras da Ucrânia e cartazes criticando o jornalista por seus comentários favoráveis à Rússia. 

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