O DESAFIO DA
CONFIANÇA
NA ERA DA INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL GENERATIVA
N O V E M B R O | 2 0 2 4
Um olhar sobre os temas
debatidos na Trust Conference
realizada em outubro em
Londres, abordando
governança ética e
confiabilidade da IA, o poder
das Big Techs, a proteção do
jornalismo confiável, a
salvaguarda da democracia e
as principais tendências em
ESG e negócios responsáveis
Parceiro de conteúdo
Foto: Divulgação Thomson Reuters Foundation
ESPECIAL
quatro anos, laamos o MediaTalks com o propósito de
compartilhar ideias capazes de contribuir para um debate
informado sobre o papel das diversas mídias da imprensa
tradicional às redes sociais buscando ajudar na construção de
um ecossistema de informão vibrante e transformador.
Sob essa perspectiva, também temos explorado as percepções
blicas e a representão de temas vitais para um mundo
melhor, como a diversidade e as mudaas cliticas, a confiança
nas marcas e corporações e o valor dos princípios ESG.
Hoje celebramos esse marco com uma edição especial sobre os
temas debatidos na Trust Conference 2024, um dos mais
importantes runs globais sobre confiança, promovido em
outubro pela The Thomson Reuters Foundation em Londres, onde
es nossa base editorial.
Neste ano, a inteligência artificial emergiu como um dos maiores
desafios para a confiaa e sustentabilidade do jornalismo e das
instituições, dominando os debates do encontro.
MediaTalks celebra quatro anos conversando sobre IA,
ESG e a batalha pela Confiaa nas Mídias e Corporações
SALLY UREN,
FORUM FOR THE
FUTURE
5 passos contra os
'ventos destrutivos
contrários ao ESG
LUCIANA GURGEL
EDUARDO RIBEIRO
Editora-chefe
MediaTalks,
Londres
Publisher
Jornalistas&Cia,
São Paulo
KARA SWISHER
E AS BIG TECHS
Shoplifters da
informão
8
6
MARIA RESSA,
NOBEL DA PAZ
A ‘tecnologia deliberativa
que pode substituir as
redes sociais atuais, sem
ódio ou desinformação
COMO IMPLANTAR A
GOVERNANÇA GLOBAL
DA IA?
Visões da Unesco, da Fundação
Mozilla e do Governo dos EUA
16
11
3
‘A inteligência artificial é o
novo campo de batalha
pela confiança
ANTONIO ZAPPULLA,
THOMSON REUTERS
FOUNDATION
2
IA deve elevar o
jornalismo
a novos patamares
RICHARD GINGRAS,
GOOGLE
STAFFAN LINDBERG,
V-DEM INSTITUTE
‘A desinformação leva à
polarização, que leva à
erosão da democracia
18
23
ADVOGADOS DE
JORNALISTAS
o as novas vítimas do
cerco à liberdade de
imprensa
FIM DO ESG?
o para Lady Lynn
de Rothschild, CEO
do Council for
Inclusive Capitalism
TRANSPARÊNCIA
CORPORATIVA
Resultados preliminares
mostram avanços em DEI
(Diversidade, Igualdade e
Inclusão)
25
26 28
13
'REDUZIR', 'AUMENTAR'
E 'TRANSFORMAR'
Os três pilares do uso da
inteligência artificial nas
redações da Reuters
IA E JORNALISMO
INVESTIGATIVO
iStories: como a IA ajuda a
quantificar as mortes de
soldados russos na Ucrânia
GOVERNANÇA
CORPORATIVA DA IA
29
Adão e uso responsável, transparência e governança global da
IA foram alguns dos temas analisados por especialistas que estão
na linha de frente da defesa da confiaa no jornalismo e em
instituições públicas e privadas.
Além dos desafios da IA, a Trust Conference abordou queses
cruciais como a sustentabilidade do jornalismo, o efeito da
polarização e da desinformão sobre a democracia, as velhas e
novas ameaças à liberdade de imprensa e o futuro do ESG.
O debate sobre o ESG foi otimista, destacando seu papel
relevante como guia para empresas e deres comprometidos
com o desenvolvimento sustenvel.
Em tempos de crises globais e mudaas rápidas, o compromisso
com a verdade e a transparência o fundamentais não apenas
para a sustentabilidade da mídia, mas também para a
constrão de um futuro mais justo e informado, uma missão
que continua nos inspirando no MediaTalks.
Boa leitura!
12
Ferramenta com
aval da Unesco vai
ajudar empresas a
garantirem padrões
éticos
Antonio Zappulla falando na Trust Conference (Foto: divulgação TRF)
Antonio Zappulla, CEO da Thomson Reuters Foundation
destacou na Trust Conference os riscos e oportunidades da IA e seu
impacto potencial sobre a confiança no jornalismo, nas instituições,
na democracia e nas marcas.
"Sabemos que não é suficiente acompanhar o desenvolvimento da
IA – precisamos estar um passo à frente quando se trata de
regulamentação e adoção ética, se quisermos aproveitar suas
oportunidades, em vez de exacerbar os danos potenciais. Isso
requer cooperação e colaboração entre os setores público e privado
e garantia de pluralidade de vozes, não apenas com assento à mesa,
mas sendo ouvidas", disse Zappulla ao MediaTalks.
O jornalista foi o arquiteto do encontro que reuniu mais de 600
participantes de 45 países para um mergulho em temas
interconectados e que levam a um destino: a democracia saudável,
que é boa para as pessoas e para os negócios.
Aconteça o que acontecer com a terminologia ESG, vejo
grande potencial para a mídia e as corporações reforçarem
uma estrutura para práticas empresariais responsáveis."
Zappulla foi reconhecido com a Ordem do Mérito da República
Italiana (OMRI) pelo seu seu trabalho como jornalista e pelas
iniciativas em prol da liberdade de imprensa.
Ele tem preocupações com o contexto, mas não está entre os
que só veem nuvens negras no horizonte. Ao mesmo tempo em
que é incisivo sobre a necessidade de regras para que erros do
passado não se repitam, destaca os aspectos promissores da IA.
A inteligência artificial é
claramente o novo campo de
batalha pela confiança,
provocando ansiedade mas
também prometendo avanços
e novas oportunidades"
Antonio Zappulla - CEO da Thomson Reuters Foundation
A deterioração da democracia
Este é um momento histórico, pois estamos
testemunhando um rápido progresso tecnológico, mas
também um claro declínio democrático.
Em todo o mundo, vemos como a disseminação da IA, o uso
da lei como arma para silenciar vozes críticas, o aumento
da polarização política, a perseguição à imprensa, a
desinformação e a subversão de modelos de negócios
estão convergindo para impactar a confiança no
jornalismo."
Erosão de confiança na mídia
Quando informações precisas são mais necessárias do
que nunca, a erosão da confiança na mídia é
extremamente alarmante.
Sem confiança, o jornalismo é incapaz de desempenhar seu
papel vital nas sociedades democráticas – seja
responsabilizando o poder ou capacitando os cidadãos a
tomar decisões mais informadas.
Todos os que investem na proteção do fluxo livre de
informações precisas, imparciais e críticas – de governos a
advogados, da sociedade civil a ativistas – devem
trabalhar juntos para fortalecer o ecossistema, para que
uma imprensa livre sobreviva e prospere."
3
Uma tecnologia que as pessoas mal entendem
A explosão da inteligência artificial, uma tecnologia que a grande
maioria das pessoas ainda não entende bem, já está remodelando
as regras da democracia.
A consultoria PWC estima que até 2030 a contribuição da IA para a
economia global será de quase US$ 16 trilhões. Os maiores ganhos
ocorrerão na China e nos EUA, com previsão de aumentar o PIB
desses países em 26% e 14,5%, respectivamente, nos próximos seis
anos.
A última Pesquisa Global sobre IA da McKinsey indica que 65% dos
entrevistados trabalham em organizações que usam regularmente a
IA generativa.
O ChatGPT tem cerca de 200 milhões de usuários ativos por mês, com
70% da participação de mercado total de todas as ferramentas de
inteligência artificial.
Precisão e segurança de dados no centro do debate
Quando se trata de preocupações em torno da IA, há um
consenso universal: tudo se resume à precisão e à segurança dos
dados.
As aplicações potenciais são muitas, diversas e fascinantes, mas
trazem desafios e riscos. O preconceito é uma área de preocupação.
ONGs de privacidade de dados nos EUA, por exemplo, estão
preocupadas com modelos de IA baseados em dados históricos de
crimes que prometem ajudar a prever quem tem potencial de
cometer delitos e em quais locais. Ativistas dizem que isso já resultou
em novas formas de discriminação.
Os sistemas de IA que promovem desigualdades e prejudicam os
direitos humanos se tornarão ainda mais perigosos se não forem
controlados, especialmente quando enfrentamos uma corrida global
para criar, moldar e deter essa poderosa tecnologia."
Rotulagem de conteúdo feito com IA
O debate em torno da transparência sobre a origem do conteúdo
é importante, já que mais e mais redações estão usando IA
generativa na produção, em vez de apenas em tarefas de bastidores.
Obter o equilíbrio entre aproveitar a inteligência artificial para
impulsionar a eficiência e a produtividade na redação em sintonia
com os padrões jornalísticos de precisão, transparência e confiança é
essencial e não é de forma alguma impossível."
O impacto das Big Techs no jornalismo:
lições para a era da IA
A imprensa ainda está se recuperando após perder seus
modelos de publicidade e distribuição para as empresas de
mídia digital, comprovando os efeitos significativos e de longo
prazo que a tecnologia pode ter na sustentabilidade e
viabilidade da atividade.
Há comparações importantes que podem, e devem, ser
traçadas entre esses momentos na jornada do avanço
tecnológico. Aprendizados sobre a regulamentação de
plataformas de mídia social devem ser aplicados urgentemente
às conversas em torno da governança ética e da
regulamentação da IA."
Direitos autorais e compensação para criadores
O desequilíbrio de poder entre empresas de mídia digital e
organizações jornalísticas criou uma dinâmica de "o vencedor
leva a maior parte", com as plataformas tendo capacidade de
decidir o que consideram "valioso" o suficiente para se
envolver e negociar.
Como vimos até agora, os beneficiados pelas plataformas são
frequentemente os veículos de mídia tradicionais, mas há uma
necessidade crítica de que veículos menores e independentes
sejam protegidos, pois são essenciais para um ecossistema de
mídia vibrante e pluralista."
O modelo britânico
O Digital Markets Act do Reino Unido é um exemplo de como a
legislação pode equilibrar o jogo do licenciamento, ao obrigar
as maiores empresas de tecnologia a se sentarem e negociarem
com qualquer empresa da qual dependam para seus serviços
— incluindo as de IA que usam o conteúdo protegido por
direitos autorais de canais menores para treinar seus sistemas.
Isso não quer dizer que a legislação seja uma bala de prata.
Haverá desafios para descobrir quanto material de treinamento
foi extraído e o valor desse conteúdo. Mas certamente é um
passo na direção certa."
Antonio Zappulla
4
O Itaú Unibanco faz
100 anos e o futuro será
feito com você.
Esta é uma homenagem a todos que
construíram o Itaú Unibanco nestes 100 anos
e vão construir os próximos 100.
5
Na mesma semana em que repercutia globalmente o
manifesto assinado por mais de 10 mil artistas e
profissionais da indústria criativa, entre eles celebridades
como Julianne Moore, reclamando do uso não licenciado de
seu trabalho pelas empresas de inteligência artificial, o
pagamento pelo conteúdo capturado para treinar os
modelos de linguagem foi debatido na Trust Conference.
Um dos painéis reuniu a americana Kara Swisher, uma das
vozes mais respeitadas - e temidas - do jornalismo de
tecnologia; o CEO da Thomson Reuters, Steve Hasker, e a
jornalista filipina Maria Ressa, Prêmio Nobel da Paz. Os
três se mostraram alinhados à frase que encabeça o
manifesto:
O uso não licenciado de trabalhos criativos para
treinamento de IA generativa é uma grande e injusta
ameaça ao sustento das pessoas por trás desses
trabalhos, e não deve ser permitido."
A discussão girou em torno da importância de regulamentar
as empresas de tecnologia e suas ferramentas de IA,
caminho defendido pelas principais organizações de
jornalismo e por entidades como a Unesco.
Em setembro de 2024, a organização publicou um
documento chamando a atenção para a urgência de
mecanismos para compensar os criadores de conteúdo e
"não matar a galinha dos ovos de ouro", já que são eles
que fornecem informação confiável para alimentar as IAs.
Com base em sua longa trajetória
acompanhando os passos da indústria, Kara
Swisher acusou as empresas de tecnologia
digital de historicamente atuarem como
"shoplifters" (ladrões de loja).
Eu sempre os vi como ladrões de
informações. É o que eles são, 'ladrões de
lojas'. E continuarão a fazer isso com a IA,
com todo o resto, até que tenham sugado
tudo. O seu motor é o lucro."
Poucos no mundo da mídia têm autoridade para
uma declaração tão contundente. Swisher, de 61
anos, cobre a internet desde 1994 e em 2023 foi
retratada em um episódio de Os Simpsons como
repórter do Vale do Silício.
Autora de livros sobre as Big Techs e de um
podcast que ocupa o quinto lugar em audiência
no mundo, a editora-chefe da New York
Magazine figura nas listas de jornalistas de
tecnologia mais influentes do planeta.
Antes de subir ao palco com os óculos escuros
que são sua marca registrada, ela foi
apresentada como "força da natureza".
Veja a seguir suas opiniões contundentes.
Kara Swisher | Jornalista de tecnologia e editora da New York Magazine
6
Kara Swisher falando na Trust Conference (Foto: divulgação TRF)
Swisher foi
retratada em
Os Simpsons
Kara Swisher é testemunha ocular da história das Big Techs, e parece
já ter visto esse filme da propriedade intelectual antes. Ela relatou uma
visita ao Googleplex, sede do Google, em que foi recebida por Larry
Page, então CEO da empresa.
Disse que sua "ficha caiu" quando reparou em uma sala cheia de TVs.
No Google você se deparava com coisas estranhas o tempo todo. De
repente poderia aparecer uma girafa em uma sala. Eles faziam todos os tipos
de experimentos.
Aí perguntei: ‘O que é aquela sala com TVs?’ Page disse: 'estamos captando a
televisão'. Eu retruquei: ‘sério? O que você quer dizer com televisão? Toda a
televisão?’
Ele disse: 'sim, são canais diferentes. Estamos gravando tudo. E aplicando
legendas ocultas à pesquisa. Vamos arquivar e usar'.
Então eu perguntei: ‘você detém a propriedade intelectual?’ Ao que ele
respondeu: 'Não, por que eu preciso disso?'
Eu falei: 'existe uma coisa chamada propriedade intelectual. Você não é dono
disso, você está apenas roubando.' O Google fez isso com livros, com
entretenimento. E agora eles estão fazendo com a IA."
Zuckerberg e sua visão sobre moderação
Swisher falou sobre uma entrevista com Mark Zuckerberg, CEO da
Meta, na qual abordou o caso de Alex Jones, radialista considerado
o principal teórico da conspiração dos EUA.
Perguntei: ‘quando você vai expulsá-lo do Facebook? Ele quebrou as regras
da sua plataforma dezenas e dezenas de vezes.’
Mas ele mudou a conversa. Começou a falar sobre os negacionistas do
Holocausto e disse que os deixava na plataforma por acreditar na liberdade
de expressão e por achar que não queriam mentir.
Eu achei isso incrível, e respondi. ‘é claro que eles mentem. Esse é o trabalho
terrível deles!‘
Ali eu percebi, e disse a Zuckerberg, que teríamos mais antissemitismo do que
nunca, porque ele estava deixando na plataforma aquele lixo tóxico.
Dois anos depois, ele fez o que eu sugeri e retirou os negacionistas. Mas
passaram-se dois anos desse antissemitismo fluindo."
Os reguladores da IA é que são o problema
Swisher observou, como diz em um de seus livros, que tudo
o que pode ser digitalizado será digitalizado, e acha que
ninguém pode construir o seu negócio a partir do negócio
dos outros.
Mas sob a perspectiva de quem cobre a indústria desde o
tempo em que as pessoas perguntavam o que era a internet,
a jornalista é pragmática e coloca a responsabilidade por
organizar toda essa confusão nos reguladores:
Lembre-se, essas pessoas não têm seus interesses guiados pelo
coração. Elas querem ganhar dinheiro. E neste ponto, não é culpa
delas. São pessoas vorazes, capitalistas e orientadas pelos
interesses dos acionistas. Elas vão fazer exatamente isso.
A questão é: o que vamos fazer, não para detê-las, mas para
regulá-las da maneira adequada, assim como todo mundo está
sujeito à regulamentação?
Nossos reguladores é que são o problema neste momento."
A saída é manter a pressão’
Apesar da desigualdade de forças, Swisher considera que
ainda dá para lutar. E confia no poder do jornalismo:
A verdade é que há uma concentração de poder nas mãos de
um grupo muito pequeno de pessoas em uma parte da América,
comparável ao dos ditadores históricos.
O governo dos Estados Unidos, tanto a banda Democrata quanto
a Republicana, não quer regular esse grupo.
E esse grupo nunca gostou da imprensa. Mas a imprensa não
está aqui para ser apreciada. O que temos que fazer é continuar
a criar, falar, fazer reportagens incríveis, continuar pressionando
contra esse poder."
Kara Swisher
Google, Zuckerberg,
reguladores e a pressão da
imprensa sobre as Big Techs
7
Maria Ressa falando na Trust Conference (Foto: divulgação TRF)
Dá para desistir das
redes sociais atuais?
Tecnologias deliberativas podem ser a saída
para conversas reais sem lucro e sem ódio
A jornalista filipina Maria Ressa, vencedora do
Prêmio Nobel da Paz de 2021, está convicta de que
não é uma utopia parar de esperar “que as Big Techs
finalmente cumpram suas promessas de que se
autorregularão” e desistir das redes sociais controladas
pelas grandes plataformas de mídia digital.
Co-fundadora e editora do site de notícias Rappler, ela
deposita esperanças na construção de ‘tecnologias
deliberativas’ – um conjunto de ferramentas digitais
capaz de permitir que os usuários conversem uns com os
outros a partir de seus interesses, sem terem seus dados
vendidos ou serem expostos a discurso de ódio e
desinformação.
O aplicativo Rappler Communities, baseado nesse
conceito, foi lançado em dezembro de 2023, construído
no protocolo de código aberto Matrix.
Ressa espera que até as eleições de 2025 nas Filipinas as
ferramentas estejam em um nível que permita que
"pessoas reais tenham conversas reais, sem manipulação
para obtenção de lucro".
Maria Ressa | Jornalista Prêmio Nobel da Paz 2021
Exemplo de coragem por sua luta para resistir a uma
avalanche de processos judiciais movidos durante o
governo do ex-presidente Rodrigo Duterte, que
chegaram a levá-la para a prisão, a jornalista é uma
das críticas mais eloquentes da influência das redes
sociais na sociedade, sobretudo na política.
Conversando com o MediaTalks antes de subir ao
palco da Trust Conference, ela quis saber como
estava a situação no Brasil após a mudança de
governo. Dois tipos de assédio contra jornalistas -
digital e jurídico - são pontos comuns entre os dois
países e não dependem só dos Estados para avançar.
Ressa abriu sua participação no evento respondendo
a uma pergunta provocativa feita pelo presidente da
Fundação, o jornalista Antonio Zappulla: se achava
que a democracia estava à beira de um precipício,
como havia previsto há dois anos.
Ela respondeu que sim - mas com um toque de
otimismo. Confira a seguir.
8
Democracia no precipício?
A situação está ainda pior do que há dois anos. A corrupção entrou no ecossistema
de informação, e o ódio que circula nas mídias sociais virou tudo de cabeça para baixo.
Mas se reconhecermos que estamos na beira do precipício, é possível fazer alguma coisa
para mudar isso."
'Esgoto humano' das redes
Uma análise do Rappler sobre o noticiário na imprensa e nas redes sociais dos
últimos três anos nos EUA mostrou resultados assustadores, muito piores do que o
cenário nas Filipinas no mesmo período.
Seis em cada 10 americanos obtêm suas informações do 'esgoto humano' que é a mídia
social."
Manipulação e interesses geopolíticos
Quando teremos um ecossistema de informações públicas que não seja motivado
pela vigilância com fins lucrativos? Isso não está nos manipulando insidiosamente? Isso
não está pegando ferramentas de publicidade e colocando-as nas mãos de poderes
geopolíticos?"
Desinformação, desconfiança e desmobilização
Por que o setor corporativo é visto como mais confiável do que a imprensa? Porque
eles foram menos atacados. Para travar o engajamento cívico, é preciso fazer as pessoas
duvidarem dos fatos e daquilo em que confiam.
O objetivo da desinformação não é semear o caos, e sim fazer as pessoas não
acreditarem em nada. Esse é o intuito: criar desconfiança para que a sociedade não se
mobilize."
Mundo tecno-feudal
Em seu livro Techno Feudalism, o ex-ministro das finanças da Grécia Janus Varafakis
disse que não vivemos mais em um mundo capitalista, e sim em um mundo tecno-
feudal, onde a tecnologia busca lucrar em ambas as extremidades.
Este é agora o mundo virtual em que vivemos."
A desinformação busca
quebrar a confiança em tudo
e desmobiliza a sociedade
Sistema que estimula
o pior jornalismo
A questão não é se os jornalistas estão fazendo a coisa
certa. Não é um problema do jornalismo, apesar da
mercantilização da imprensa e da utilização de
jornalistas pelas Big Techs. O problema é que temos de
competir num ambiente que recompensa o pior
jornalismo, o que engaja mais, o que levou à febre do
clickbait.
Em um sistema corrompido e enfraquecido, esperar que
os jornalistas sozinhos resolvam o problema não é
realista. Precisamos ganhar dinheiro, porque se não o
fizermos, perdemos nossa independência. Mas como
convencer os grandes investidores a investir em
jornalismo?
Porque se o jornalismo morre, a democracia morre."
Maria Ressa falando na Trust Conference (foto: divulgação TRF)
Maria Ressa
9
O sistema de notícias 'federado'
Maria Ressa apresentou na Trust Conference o conceito de um sistema de notícias
federado, onde as principais organizações de notícias ancorarão suas comunidades e os
usuários poderão seguir diversas plataformas de notícias e se conectar sem compartilhar
dados.
O sistema foi construído para se tornar um meio de distribuição global independente de notícias
e abrir caminho para uma “realidade compartilhada”, diferente do que existe hoje.
O Rappler está trabalhando na implementação deste sistema com a ajuda da Google News
Initiative, visando fazer parcerias com organizações em diferentes países como Indonésia, África do
Sul, Brasil e Filipinas.
O conceito dessa tecnologia deliberativa é como construir uma conexão global. Quando Elon Musk
comprou o X, muitas pessoas entraram no Mastodon, um sistema federado por servidor. Mas lá o
atrito é muito alto.
E se, globalmente, organizações de notícias poderosas, com suas comunidades integradas, fossem
ancoradas sem precisar de um servidor DNS?
Não será necessário fazer nada mais do que no Reino Unido seguir a BBC e a Reuters, ou o Rappler
nas Filipinas. Isso cria um aplicativo de bate-papo sob protocolo de Matrix onde se duas pessoas
seguem uma terceira, elas poderão conversar diretamente sem compartilhamento de seus dados,
em um sistema federado."
As previsões de que a IA generativa causariam uma revolução na
desinformação no espaço digital felizmente não se materializaram,
pelo menos por enquanto, afirmou na Trust Conference Jeff Allen,
Diretor do Integrity Institute, organizaçãoo-governamental
britânica que tem como missão ajudar a construir uma internet
social melhor.
Não vimos até agora uma revolão, mas certamente a AI fez a
desinformação evoluir com o uso de novas técnicas generativas.
Allen considera que a AI tornou mais fácil e trouxe um nível maior
de sofisticação para a desinformação, capaz até de fazer os mortos
falarem e declararem voto em candidatos.
Outro exemplo citado por ele foi o de candidatos a cargos eletivos
que encontram-se presos e ainda assim aparecem emdeos
fazendo campanha.
Para Allen, tudo isso representa uma inovação na geração de
conteúdo, mas não uma transformação completa do que
era feito na desinformação.
Ele alerta, porém, que há equipes trabalhando em
laboratórios de inovação em desinformação eo descarta
a descoberta decnicas que possam levar o problema
a outro nível.
Falando no mesmo painel, Claire Leibowicz, da
Partnership on AI, disse que o que mais a assusta é o
contrário: o uso da IA para negar o que é verdadeiro.
Ela citou o caso de Donald Trump, quando alegou que o
tamanho da multidão num comício de Kamala Harris teria sido
gerado por IA, embora o público fosse real.
Chamo essa estratégia de “dividendo do mentiroso”, mais
uma ferramenta para figuras públicas espalharem
desinformação. Essa negação da realidade me preocupa mais
do que a criação de uma realidade paralela com uso da IA.”
A IA causou evolução,
mas o a revolão da
desinformão'
10
Richard Gingras durante a Trust Conference (Foto: divulgação TRF)
IA deve elevar o jornalismo
a novos patamares
Richard Gingras | News at Google
Richard Gingras acredita que a crise de confiança no jornalismo vem
se desenrolando nos últimos 50 anos.
Vivemos em um mundo altamente dividido. Temos mídias
hiperpartidárias. Como podemos construir meios de comunicação e
abordagens jornalísticas que ajudem a preencher essas lacunas? Como
podemos usar a IA para ir além disso, para realmente dar um passo à
frente?”
Gingras apontou o risco de o jornalismo exacerbar esses sentimentos
de divisão com notícias sem o devido contexto, que pode ser dado com
o uso de ferramentas baseadas em inteligência artificial.
Ele acredita que oblico tende a perceber ameaças queo são
reais, dando como exemplo as estatísticas de que uma pessoa tem 35
vezes mais chances de morrer dencer ou doença cardíaca do que de
crimes. E 11 mil vezes mais chances de morrer dessas coisas do que de
terrorismo.
O jornalismo contribui para isso ao reportar eventos sem contextualizar
se é uma tendência perigosa ou não. Ferramentas podem ajudar o jornalista
a dar esse contexto ou evitar o uso inconsciente de linguagem tendenciosa,
de maneira ao deixar as pessoas tirarem conclusões erradas.”
Inteligência artificial nas
redações e no necio
11
Gingras lembrou que ferramentas de machine learning
em redações nãoo novidade.
Introduzimos a primeira, Pinpoint, há cerca de seis anos,
destinada a capacitar jornalistas investigativos a
analisarem grandes volumes de documentos, permitindo
fazer o que de outra forma não seria possível.
O executivo do Google salientou que a IA generativa
oferece oportunidades na produção jornalística e
para tornar o negócio mais sustentável.
Ela pode ser usada para atividades como aumentar o
engajamento, elaborando boletins informativos e
formulando argumentos de venda para impulsionar
melhor os fluxos de assinatura, ajudando a entender
melhor o que o público está procurando e como eles
respondem ao que estão vendo.”
O jornalista russo Roman Anin (Foto: divulgação TRF) e o canal iStories, que publica em inglês e russo
Como a inteligência artificial está ajudando a
expor as perdas russas na Guerra da Ucrânia
IA no jornalismo investigativo
O Kremlin dificilmente revelará o número real de soldados russos
mortos na guerra da Ucrânia. Mas o russo Roman Anin, fundador e
editor do site iStories está tentando fazer isso. Com a ajuda da IA.
O objetivo é revelar ao mundo, e principalmente à população russa, o
preço real, em número de vidas, que o país está pagando “pelo
desejo expansionista de Vladimir Putin”, diz o jornalista, exilado após
o início da guerra com a Ucrânia.
Trata-se de um trabalho de jornalismo investigativo de enorme
dificuldade, apresentado por Anin em um dos painéis da Trust
Conference.
Para mim, é o exemplo perfeito do uso da IA para tornar possível a
investigação de um tema de interesse mundial, queo seria possível de
outra forma.
Ferramenta para identificar as baixas nas redes
Como não há, obviamente, dados oficiais disponíveis, Anin e sua
equipe tiveram a ideia de pesquisar todas as menções a baixas
militares no mundo digital russo, sejam elas avisos de missas,
funerais, ou textos de despedida de familiares e amigos.
A ideia era boa. No entanto, seria humanamente impossível, pois
estamos falando de analisar milhões de postagens.
Mas tornou-se viável a partir do desenvolvimento de uma ferramenta
de AI, que foi concluída às vésperas da Trust Conference.
Anin, jornalista investigativo rotulado desde 2021 pelo governo de seu
país como “agente estrangeiro”, atuou no Novaya Gazeta, jornal do
prêmio Nobel da Paz Dmitry Muratov, que fechou as portas após
perseguição implacável do governo russo.
Acesso ao banco de dados será público
A ferramenta do iStories está varrendo textos e
vídeos de plataformas dedias sociais russas como
VK, a mais popular do país, Odnoklassniki e
Telegram, bem comoruns regionais.
Ela identifica as postagens que envolvem militares e
as analisa para verificar se mencionam baixas
ocorridas na guerra atual. Por fim, valida os nomes
encontrados antes de incluí-los no banco de dados.
É um projeto extremamente ambicioso, mas Anin
está acostumado a desafios. Desde 2009
ele trabalha com o Consórcio Internacional de
Jornalistas Investigativos e participou da investigação
do escândalo Panama Papers.
Nunca conseguiríamos realizar essa investigação sobre
os soldados mortos sem a ajuda da IA.o há
comparação com o que eu e meus colegas
conseguiríamos fazer manualmente.”
Anin ainda não sabe quando podedivulgar o
resultado dessa reportagem investigativa. Mas uma
coisa ele sabe: vai disponibilizar a qualquer
cidadão interessado o banco de dados dos soldados
russos sacrificados. Com todos os nomes e
sobrenomes, devidamente verificados.
12
Jane Barret | Thomson Reuters
(Foto: divulgação TRF)
Segundo uma pesquisa realizada pela London School of
Economics, mais de 75% das redações pesquisadas estão
usando ferramentas de inteligência artificial.
Mas de que maneira esse uso está sendo feito na prática?
Em geral, as empresas dedia estão utilizando a IA para
coleta e análise de dados, produção, checagem e
contextualização de conteúdo, engajamento da audiência e
distribuição das notícias.
O principal motivo para a adoção da IA nas redações é a
busca de maior eficiência, produtividade e qualidade, a fim
de liberar os jornalistas de tarefas tediosas, para que usem
esse tempo em trabalhos originais e criativos.
IA nas redações da Reuters:
'reduzir', 'aumentar' e 'transformar'
IA e jornalismo
Reduzir
"O foco é reduzir o tempo
empregado pela redação em
tarefas demoradas e estressantes
que possam ser repassadas à IA.
Quais trabalhos ocupam muito
tempo, causam muito estresse e
cujo peso podemos tirar dos
jornalistas, liberando seu tempo
para fazer reportagens originais?”
Jane Barret, editora global de estratégia de IA na
Thomson Reuters, apresentou em um painel da Trust
Conference o modelo adotado pela agência de notícias.
Barrett informou que o investimento da Reuters no uso da IA na
redação chega a US$ 100 milhões, distribuído em três vertentes
principais: reduzir, aumentar e transformar.
Até agora, os esforços se concentraram nas duas primeiras,
com experimentos bem-sucedidos, como o uso da IA para
avaliar as milhares de sugestões de pautas que chegam
diariamente à redação e extrair delas os fatos mais relevantes
de que os jornalistas precisam.
Barrett explicou as três vertentes que norteiam a estratégia de
uso de IA da Reuters.
Aumentar
“A partir das reportagens que
fazemos, como podemos
aumentar nossa audiência
alcançando novos públicos com
formatos diferentes?
Vivemos em mundos
hiperpersonalizados. Como
podemos aumentar o alcance do
que fazemos?
Transformar
“Como a chegada da IA afetará as
expectativas da sociedade de
como lidar com as informações?
A partir daí, que mudanças
precisamos fazer para atender a
essas novas expectativas dos
usuários e oferecer as
experiências que desejam?”
13
IA na indústria de mídia
Oportunidades para uns,
futuro sombrio para outros
Com a popularização do ChatGPT e das demais ferramentas que
disputam esse mercado, o caminho é sem volta:
goste-se ou não, tema-se ou não, a IA generativa vai continuar
transformando a produção e o acesso a notícias.
Um painel da Trust Conference discutiu como a integração cada
vez maior da IA ao universo da mídia digital vai modificar a
indústria de notícias.
Esse futuro já chegou para muitos. A moderadora do painel, a
pesquisadora Courtney Radsh, Diretora do Center for
Journalism and Liberty, dos EUA, informou que 56% dos textos
disponíveis na Internet já são gerados por IA.
Um dos participantes do painel foi Rasmus Nielsen, que entre
2018 e setembro deste ano dirigiu o Reuters Institute for the
Study of Journalism, na Universidade de Oxford, e hoje leciona
no Departamento de Comunicação da Universidade de
Copenhague.
Ele fala com propriedade sobre o tema, por ser um dos co-
autores do Reuters Institute Digital News Report, que analisa
anualmente a situação da indústria de notícias.
Oportunidades para uns, riscos para outros
Nielsen expressou preocupações sobre o impacto da IA generativa
no setor.
Ele acredita que, à medida que a tecnologia se torne mais
relevante para acesso a notícias, ela intensificará as pressões já
existentes e reforçará a dinâmica em que algumas grandes
organizações de notícias retêm um público privilegiado disposto a
pagar, enquanto muitas outras ficam para trás na corrida por
receita.
14
Mais produção não significa mais receita
O pesquisador alertou que usar a IA generativa para
produzir mais conteúdo de baixo valor de forma barata
não resolverá o problema central da indústria, que é a
criação de valor.
No entanto, ele reconhece o potencial da IA generativa
para fornecer informações verdadeiras, personalizadas e
sob medida, aumentando a percepção de valor.
Testando os chatbots para acessar notícias
Mas os desafios ainda são grandes. Nielsen relatou uma
experiência de pedir a chatbots que fornecessem as cinco
principais notícias de veículos selecionados. Alguns não
conseguiram trazer as reportagens, possivelmente devido
ao bloqueio automático ou por cautela. Mesmo quando o
conteúdo foi fornecido, sua qualidade e precisão foram
questionáveis.
Certos conteúdos eram inexistentes ou falsos. Outros
foram obtidos de veículos diferentes dos solicitados. Houve
ainda resultados genéricos, difíceis de interpretar.
No entanto, quando testados em questões factuais
específicas relacionadas a eleições, os chatbots tiveram
melhor desempenho, com cerca de 80% dos resultados
corretos.
Isso sugere que usar chatbots para consultas relacionadas
a eleições, onde informações confiáveis de domínio
público estão disponíveis, pode fornecer uma experiência
mais satisfatória e útil para os cidadãos, em comparação
com resultados de notícias genéricas.
Courtney Radsh, Ginny Badanes, Graham Brookie e Rasmus Nielsen, em painel da Trust Conference (Foto: divulgação TRF)
Steve Hasker, CEO da Thomson Reuters (Foto: divulgação TRF)
É possível construir uma IA confiável? A Trust Conference 2024 não
trouxe a resposta final para essa pergunta, mas apresentou o
caminho que está sendo percorrido.
A tecnologia continua deslumbrando pela sua capacidade de
transformar positivamente os negócios e a vida das pessoas, mas
ainda não conseguiu vencer a desconfiança em torno de seus efeitos
negativos potenciais.
As principais preocupações são com a manipulação de informações, a
segurança cibernética, a criação um consenso internacional na
avaliação de risco do uso de AI e a prevenção de cenários associados
à perda de controle desse uso.
Para lidar com a manipulação, que afeta a confiança por disseminar
desinformação, os esforços envolvem a detecção do conteúdo
artificial, a identificação de dados autênticos e falsos e a rotulagem
adequada do conteúdo gerado por IA.
a segurança cibernética oferece mais riscos à confiança na fase de
aprendizagem do modelo de AI, visto que o envenenamento de uma
pequena quantidade de dados pode impactar significativamente a
confiabilidade.
Adoção responsável da IA
Esse é o motivo pelo qual a discussão da adoção responsável
da IA é tão importante, segundo Steve Hasker, CEO da Thomson
Reuters, que falou durante a conferência.
Em um momento em que o mundo corporativo esadotando cada
vez mais a tecnologia em seus processos, ele salientou a importância
de que isso seja feito com base em conjuntos de princípios que
assegurem o uso ético e levem à confiança.
Não é novidade dizer que confiança é uma vantagem
competitiva nos negócios.
Hasker expressou preocupação com a proliferação de
conteúdos baseados em opinião, desprovidos de fatos verificados ou
clareza sobre a origem, mas apresentados como notícia.
Ele sugere que reguladores e empresas jornalísticas permitiram que
isso ocorresse, e enfatiza a urgência da correção dessa situação,
passando-se a distinguir claramente o que é opinião do que é factual,
além de se garantir a transparência das fontes e dos processos de
verificação.
Confiança é uma
vantagem competitiva
Confiança na IA
O CEO da Thomson Reuters apontou as TVs a cabo e a
ascensão dasdias sociais como fatores do que chamou de
"disfunção política".
Com o impacto da IA na distribuição de notícias, ele alerta
que a tecnologia podeperpetuar essa disfunção, seo for
tratada de forma responsável.
É um princípio paras adotar a IA assegurando que a
integridade do que é produzido seja mantida."
IA da vida real: se tirar empregos, não se
confiável
Na mesma conferência, o parlamentar britânico Andrew
Pakes apresentou uma visão pragmática.
Apontando para o público, ele observou que todos os
presentes eram privilegiados, por terem as condições para
adotar a tecnologia - e de se proteger de seus impactos
indesejados.
Mas a "IA da vida real", enfatizou ele, pode representar
perda de empregos, levando a uma insegurança geral.
Na comunidade que represento [Peterborough], se a IA
tirar empregos, elao será vista como confiável."
No mesmo debate, o der de Ética em IA da Unesco,
Irakli Khodel, afirmou que a confiança está no centro dos
esforços de regulamentação e criação de padrões conduzidos
pela organização.
Ele disse que embora a entidade costume dialogar com
governos, nesse caso o setor privado também esfazendo
parte das conversas, em uma pauta que inclui questões como
empregos e inclusão.
15
Mark Surman, presidente da comunidade de software
livre Mozilla, abriu sua participação em um painel da Trust
Conference 2024 sobre governança global da inteligência
artificial (IA) com duas perguntas para a plateia: "Quem
acha que a internet é uma bagunça? E quem acha que ela
deveria acabar?"
Muitas mãos se ergueram após a primeira pergunta, e
apenas uma depois da segunda, dando a Surman a deixa
para fazer a analogia com a IA generativa: a falta atual de
regras não pode levar à conclusão de que a sociedade deve
abrir mão da tecnologia.
Mas é preciso nivelar as regras do jogo, como apontou
Mariagrazia Squicciarini, da Unesco, fazendo outra
analogia: "Seria possível disputar um jogo de futebol entre
duas seleções internacionais se as regras fossem diferentes
em cada país?”
Governança global da IA
Parece simples, mas não é. Quem faz as regras? Como
fazer cumprir? Quem pune os infratores?
Essa bola está rolando de um lado para o outro desde
pelo menos 2019, antes do lançamento do ChatGPT.
Mas a popularização da IA generativa, desencadeada
pela ferramenta da Open AI, motivou outras empresas a
se lançarem na corrida, tornando a governança global
mais urgente e também mais complexa.
O painel da Trust Conference sobre o tema reuniu três
especialistas - Surman, Squicciarini e Jennifer Bachus,
do Departamento de Estado dos EUA. Apesar de não
apresentarem uma abordagem única, todos
concordaram que já passou da hora de deixar as
discussões teóricas e partir para a ação.
Qual a melhor forma de implantar a
governança global da IA?
Três visões diversas mostram o
tamanho da montanha a escalar
16
Jennifer Bachus, diplomata americana, dirige o Bureau of Cyberspace and Digital Policy,
órgão do Departamento de Estado dos EUA que coordena a política do país referente ao
ciberespaço e às tecnologias digitais. Ela demonstrou desconforto com o que chamou de
"abordagem negativa da IA" nas conversas sob a liderança de organismos internacionais.
"Sinto que às vezes nos encontros globais gastamos todo o nosso tempo falando sobre IA para o mal, sobre
as preocupações de vigilância, que são incrivelmente importantes. Mas as pessoas querem falar sobre
como podemos ter uma tecnologia que funcione para as sociedades, para as pessoas e não apenas para os
governos."
A diplomata garantiu que a estratégia de seu país não é trabalhar para que empresas americanas
dominem o mercado, como acontece atualmente com as Big Techs de mídia social, e que o foco
principal é a IA estar a serviço da sociedade.
Mas sugeriu um modelo de governança inverso ao proposto pela Unesco: “Eu diria que deveríamos
parar de esperar para ver se a ONU faz alguma coisa e, em vez disso, trabalhar de baixo para cima.”
Mariagrazia Squicciarini, que representa a posição da Unesco sobre o tema nas reuniões do
G7 e do G20, enfatizou a necessidade de uma estrutura global, com uma abordagem multilateral
e multissetorial.
Ela argumenta que a IA tem implicações para várias partes interessadas e suas regras não podem
ser ditadas por um único país.
A IA afeta as políticas externas, pois tudo está interligado, e daí a necessidade de uma abordagem
integrada. Não estamos falando somente com governos, mas com todos os atores. A Unesco foi incumbida
desde 2019 pelos países membros da ONU a desenvolver os parâmetros, os valores, e as abordagens
globais. Já temos tudo isso. Vamos implementar.”
Governança global da IA
ONU à frente da governaa global da IA?
Sem a ONU na governança global?
Mark Surman, presidente da organização sem fins lucrativos Mozilla, que criou o
Firefox e busca desenvolver tecnologia para uma IA mais confiável (Mozilla.ai), defendeu uma
organização multissetorial para gerir uma IA de Interesse Público, com infraestrutura pública
aberta para que o setor possa impulsionar globalmente resultados benéficos à coletividade,
inclusive econômicos.
É uma parte crítica e pouco discutida: para onde queremos levar a economia da IA? Como distribuímos
a riqueza? Como construirmos indústrias de IA nativas que mantenham o dinheiro no próprio país?
Como construirmos uma economia de IA global justa? Ao falarmos sobre regulamentação, ética, uso de
IA para serviços públicos, não podemos abrir mão do futuro econômico em prol de um conjunto
pequeno de atores. Precisamos configurar uma economia de IA da qual todos possam participar e se
beneficiar."
IA de Interesse Público e distribuão de riqueza
17
Staffan Lindberg (Foto: MediaTalks)
O professor sueco Staffan Lindberg apresentou na Trust
Conference estudos que evidenciam a forte relação entre a
disseminação da desinformação, o crescimento da polarização
e a erosão da democracia, num processo que se repete em
diferentes países ao longo do tempo.
Lindberg é uma das maiores autoridades no assunto. Ele é
Diretor do V-Dem Institute, da Universidade de
Gotemburgo, na Suécia, que produz e analisa o maior
conjunto global de dados sobre democracia, com mais de 31
milhões de informações sobre eleições de 202 países, desde
1789.
A conclusão é que a tecnologia veio tornar mais eficiente a
antiga estratégia de dividir para conquistar.
O professor explica que a disseminação da desinformação é
usada com o objetivo de polarizar o eleitorado e daí passar a
controlá-lo:
Aspirantes a ditadores espalham desinformação em casa
e no exterior.
Segundo Lindberg, o mundo nunca experimentou uma
quantidade tão grande de países em processo de se tornarem
autocracias, ou em erosão de suas democracias.
O auge foi em 2022, quando eram 47 nessa situação, o maior
número registrado desde 1900 pelo instituto.
Confira o que Staffan Lindberg destacou sobre o relatório mais
recente do instituto, referente à situação da democracia no
mundo em 2023.
Staffan Lindberg, diretor do V-Dem Institute
A desinformação
leva à polarização,
que leva à erosão
da democracia
Desinformação = polarização
A desinformação é espalhada intencionalmente
pelos aspirantes a ditadores, que sabem que ela
funciona para atingir seus propósitos. Eles e suas
equipes trabalham para multiplicar a
desinformação e assim aumentar
exponencialmente a polarização para níveis
tóxicos.
Isso leva a um estágio em que as pessoas
começam a considerar como inimigos os que
pensam politicamente de forma diferente.
Inimigos de quem elas são e do que defendem.
Polarização = erosão da democracia
Quando a polarização chega ao nível em que os
adversários políticos não são só meus inimigos,
mas - e aí está a jogada - também do povo e da
nação, está implantada a metáfora de guerra.
O que você faz com os inimigos da nação?
Sabemos disso desde a década de 1930. O
caminho para a autocratização está aberto,
seguindo um dos processos mais evidentes em
nossos estudos ao longo do tempo,
independentemente do país pesquisado.
18
Declínio democrático
O retrato global da democracia em 2023
71% da população vivendo em países autocráticos
Cerca de 5,7 bilhões de pessoas, ou 71% da
população mundial, vivem em regimes autocráticos. É o
15º ano consecutivo em que o número supera o dos que
vivem em democracias.
O declínio democrático é mais acentuado no Leste
Europeu e na Ásia do Sul e Central, enquanto a América
Latina e o Caribe contrariam a tendência global.
Dos países pesquisados, 91 foram classificados
como democracias e 88 como autocracias, mas a
população que vive nesses últimos é bem maior do que
nos primeiros.
Dos 34 países que realizaram eleições em 2024, 31
pioraram seus níveis democráticos.
Do total de 71% da população global que vive em
autocracias, 44% residem em autocracias eleitorais, o
que inclui países populosos como Índia, Paquistão,
Bangladesh, Rússia, Filipinas e Turquia.
A outra parcela, de 27%, vive em autocracias
fechadas, em países de população numerosa como
China, Irã, Mianmar e Vietnam.
O mapa do Relatório da
Democracia do Instituto
V-Dem mostra a situação
em 2023. Quanto mais forte
o azul, mais forte a
democracia. Quanto mais
forte o vermelho, mais
fechada a autocracia.
Apesar de ser o tipo de regime mais comum
no mundo, 59 democracias eleitorais acolhem
apenas 16% da população mundial. O Brasil está
incluído nessa categoria.
As 32 democracias liberais respondem por
13% da população mundial. Os Estados Unidos
são, de longe, a maior democracia liberal,
representando 4% da população mundial e cerca
de um terço da população total desse tipo de
regime.
A grande maioria dos latino-americanos
(86%) vive em democracias eleitorais, como
Argentina e Brasil, e 4% vivem em democracias
liberais, como Chile e Uruguai. Os únicos
regimes autocráticos da América Latina assim
classificados pelo estudo são os de Cuba,
Nicarágua e Venezuela, onde vivem 10% da
população da região.
Embora considerados democracias
eleitorais, México, Guatemala, Guiana e
Honduras são posicionados em uma "zona
cinzenta", devido à incerteza dessa classificação.
19
Manifestantes participam de um protesto contra o golpe militar em Mianmar, um dos
campeões mundiais de violações das liberdades de imprensa e de expressão
(Foto: Pyae Sone Htun / Unsplash)
Menos liberdade de expressão
A liberdade de expressão piorou em 35 países em
2023. Isso significa imprensa menos livre, restrições
aos cidadãos para discutir assuntos políticos e menos
liberdade de expressão acadêmica e cultural.
É uma situação quase quatro vezes pior do que em
2003, quando ela se deteriorou em 10 países.
Eleições menos limpas
Eleições livres e justas deixaram de acontecer em 23
países em 2023. O cenário é duas vezes pior do que o
de 2003, quando isso foi constatado em 11 países.
Trata-se de uma inversão completa do cenário de dez
anos atrás, quando esse índice piorou em 10 países e
melhorou em 23.
O Diretor do V-Dem Institute, Staffan Lindberg,
destacou que a liberdade de expressão foi o
componente mais afetado no processo global de erosão
da democracia nos últimos anos.
Em seguida no Relatório da Democracia aparecem a falta
de lisura em processos eleitorais, a violação da
liberdade de associação e a falta de respeito à oposição
e ao Estado de Direito.
Liberdade de expressão
Liberdade de expressão é o
componente da democracia
mais desrespeitado no mundo
Menos liberdade de associação
A liberdade de associação diminuiu em 20 países em
2023, e melhorou em apenas três. É um reflexo de mais
restrições à formação e atuação dos partidos políticos
e das ONGs.
É outra inversão do quadro de dez anos atrás, quando
esse indicador estava em declínio em 3 países e
melhorava em 11.
Desrespeito à oposição e ao Estado de Direito
O respeito à oposição e ao pluralismo recuou em 19
países em 2023, em comparação com 14 em 2013.
Na mesma comparação, o Estado de Direito degradou-
se em 13 países, contra 4 em 2013.
A terça parte dos países pesquisados
(60) foi identificada como vivendo uma
transição de regime.
De 2003 a 2023 o número de países em
processo de autocratização quase
quadruplicou, passando de 11 para 42,
enquanto a quantidade em processo de
reforço democrático caiu pela metade,
de 35 para 18.
Processos de reforço de
componentes autocráticos
estão em curso em 42 países, que
concentram 35% da população
global.
A Índia, com 18% da
população mundial, responde
por metade da população dos
países em processo de
autocratização.
Processos de reforço de
componentes democráticos
ocorrem em 18 países, onde
vivem apenas 5% da população
mundial.
O Brasil responde por mais
da metade da população
dos países em processo de
reforço da democracia.
Mudanças de regime na direção errada
20
Liberdade de imprensa
Enquanto são discutidas ameaças institucionais ao jornalismo,
como o avanço da IA e a desinformação que corrói a confiança
e a democracia, problemas antigos da profissão, como os
riscos da cobertura de guerras, seguem causando impacto na
liberdade de imprensa e no acesso do público às informações.
Na Trust Conference, um único painel fez a plateia aplaudir
de pé: o dos relatos das coberturas das guerras de Gaza e
da Ucrânia, feitos pela repórter da Al Jazeera Youmna
ElSayed, e por Sevgil Musayeva, editora do Ukrainska
Pravda.
O depoimento de Youmna ElSayed, agora exilada no Egito, fez
com que alguns chorassem. Ela contou como o prédio onde morava,
em Gaza, foi destruído após várias ameaças.
E narrou como foi angustiante aguardar por várias horas a
autorização do exército de Israel para resgatar um colega jornalista
baleado, queo sobreviveu aos ferimentos.
Enquanto a repórter falava, eram projetadas fotos de seu
apartamento antes de ser atingido por bombardeios, de seus filhos
abrigados em um compartimento na cozinha, e no final os
escombros do prédio.
Ela contou que perdeu todas as memórias da família - imagens dos
filhos, do casamento e de todos os momentos importantes - pois o
disco rígido com as fotos foi destruído junto com seu apartamento.
Mais de 130 jornalistas mortos na guerra
O drama de ElSayed parece igual ao de muitos palestinos que
tiveram suas casas e vidas devastadas, mas uma diferença: ela é
jornalista, e se considera perseguida por causa disso. Ela contou ter
recebido vários avisos para deixar o local.
A rede Al Jazeera, para a qual trabalha, pertence ao governo do
Catar e, além de ter sido proibida de operar em Israel, teve seu
escritório na Cisjordânia fechado.
Vários profissionais da rede foram mortos em ataques apontados
como deliberados por organizações de liberdade de imprensa,
entre elas a Repórteres Sem Fronteiras, que fez quatro denúncias de
crime de guerra no Tribunal de Haia.
A repórter revelou que o mais duro foi ouvir da filha que
toda a família seria morta por causa da profissão dela.
Foi o pior sentimento possível constatar que tinha virado
um risco para a minha família, pois tudo o que qualquer
mãe e qualquer pai quer é proteger seus filhos."
Segundo o Comitê para a Proteção de Jornalistas, pelo
menos 130 jornalistas morreram na guerra em Gaza.
Em Gaza, memórias destruídas
Youmna ElSayed mostra
como era o prédio em que
morava,os filhos abrigados
de bombardeios na cozinha
e a construção destruída
depois que a família se
asilou no Egito
21
Liberdade de imprensa
Victoria Roshchyna, jornalista ucraniana
morta em prisão russa (Foto: redes sociais)
Na guerra da Ucrânia não morreram tantos profissionais de imprensa
quanto em Gaza, e os riscos para quem esna capital, Kiev, são
certamente menores do que as ameaças a quem vai para o front.
O caso mais recente, o da jornalista Victoria Roshchyna, ilustra os
perigos enfrentados por aqueles que se impõem o dever de reportar o
que acontece nas regiões em conflito.
A jovem repórter, de 27 anos, foi capturada por soldados russos
quando cobria a situação dos territórios ocupados na Ucrânia.
Depois de passar mais de um ano presa nassia, foi declarada morta
pelo governo russo no dia 10 de outubro.
Seu exemplo foi reverenciado durante a conferência pela editora do
Ukrainska Pravda, Sevgil Musayeva.
Outro caso de violação da liberdade de
imprensa debatido na Trust Conference foi o de
José Rubén Zamora, fundador do El Periodico,
da Guatemala, que tinha acabado de sair da
cadeia após 813 dias detido.
Zamora, um veterano e premiado editor que
denunciou corrupção no governo de seu país,
ainda aguarda o julgamento de processos que
colocaram fim ao seu jornal.
Seu filho, José Carlos Zamora, disse:
É um grande passo à frente, mas não é o fim da
história. Ainda mais processos em curso.
Estamos no início da próxima maratona.”
Ela havia sido detida um ano antes, e por muitos meses
não tivemos ideia do que aconteceu com ela porque a Rússia
não anunciou a prisão.
No direito humanitário internacional, isso é chamado de
detenção 'incomunicável' - a pessoa não tem acesso a
advogado, nem defensor dos direitos humanos. Não
sabíamos disso até o anúncio de sua morte, mas ela
também estava em greve de fome."
A editora acha que a guerra em seu país na verdade se
desenrola desde 2014, quando a Rússia tomou a
Crimeia.
Na época, ela era repórter de negócios, e admite que
não esperava o horror que viria depois, com a invasão
de fevereiro de 2022.
Apesar dos riscos, a editora garantiu que não pretende
se exilar.
Se nossoblico fica,s ficamos."
Sevgil Musayeva encerrou sua apresentação lembrando
que ainda existem pelo menos 28 jornalistas ucranianos
presos nassia.
Ucrânia: Se nosso público fica, nós ficamos
Guatemala: a batalha por justiça para José Rubén Zamora
Ele acrescentou que o assédio enfrentado
pela equipe de defesa do pai criou um
ambiente tão hostil que nenhum advogado
local pôde defendê-lo, tendo-se que
recorrer a profissionais estrangeiros.
Esses regimes repressivos em todos os lugares
usam as mesmas táticas. Eles vão atrás dos
advogados para deixar o jornalista indefeso.
Ao longo do caso do meu pai, ele teve dez
advogados.
Todos foram perseguidos. Quatro foram
presos, maltratados e obrigados a aceitar
acusações inventadas. Um teve que ir para o
exílio.”
22
José Carlos Zamora na Trust
Conference (Foto: divulgação TRF)
Carolina Henriques-Schmitz | TrustLaw
(Foto: divulgação TRF)
Não são só os jornalistas: uma pesquisa
apresentada durante a Trust Conference 2024
demonstra que o cerco à liberdade de
imprensa está se estendendo aos advogados
que os defendem e que acabam virando
também alvo de perseguição, submetidos a
prisões e exílio.
A pesquisa é o resultado do esforço conjunto
do Centro de Direitos Humanos da Ordem dos
Advogados dos Estados Unidos, do projeto
Media Defence e da Thomson Reuters
Foundation, revelando que os os casos têm se
intensificado nos últimos cinco anos.
Os resultados preliminares identificaram mais
de 40 advogados perseguidos por defenderem
jornalistas ou a liberdade de atuação de
veículos de imprensa, mas esse número pode
ser a ponta do iceberg, em virtude de as
vítimas não reportarem a perseguição por
medo de retaliações.
Os dez países campeões na perseguição a
advogados que defendem jornalistas são
Guatemala, Turquia, Azerbaijão, Rússia,
Zimbábue, Quirguistão, Etiópia, Bielorússia,
China e Hong Kong.
Liberdade de imprensa
Advogados
de jornalistas
são as novas
vítimas do
cerco à
liberdade de
imprensa
Perseguição russa obrigou
defensor de repórter a se exilar
Na palestra Sob cerco: o custo de defender a liberdade de
imprensa, a Diretora do TrustLaw, a advogada Carolina
Henriques-Schmitz, ressaltou que a guerra legal está
aumentando em intensidade e complexidade.
Isso resulta em danos à liberdade, bem-estar e segurança
financeira tanto dos jornalistas como dos advogados que os
defendem.
A TrustLaw, mantida pela Thomson Reuters Foundation, é a
instituição que mais destina recursos globalmente para
propiciar apoio jurídico gratuito a jornalistas.
Para exemplificar a que ponto as carreiras de advogados
podem ser destroçadas por governos autoritários em virtude
de seu trabalho de defender jornalistas, Carolina citou os
casos de Ivan Pavlov e Dmitry Talintov, na Rússia.
Pavlov era diretor da Team 29, uma associação de advogados
e jornalistas que provê assistência legal a pessoas que
defendem a liberdade do acesso à informação.
Ele tornou-se conhecido por defender o já falecido
prisioneiro político Alexei Navalny e o jornalista Ivan
Saranov. Foi a defesa deste último que lhe custou a opção
pelo exílio.
23
Carolina Henriques-
Schmitz com a
imagem do jornalista
Ivan Saranov ao
fundo
(Foto: MediaTalks)
O jornalista russo Ivan Saranov foi preso em 2020
e acusado de alta traição por supostamente compartilhar
informações confidenciais com o serviço de inteligência
tcheco. Mas, na verdade, a perseguição se deveu a uma
reportagem publicada no ano anterior sobre a venda de
caças russos ao Egito.
O Serviço de Segurança Russo estendeu o cerco ao
advogado Ivan Pavlov, primeiro com uma detenção para
interrogatório, e depois com o indiciamento pelo suposto
vazamento de dados da investigação sobre Saranov.
Pavlov ficou sujeito a pena de 3 meses de prisão e o site de
sua associação foi bloqueado pelo Procurador-Geral da
Rússia, sob a alegação de que o Team 29 teria laços com
uma ONG tcheca contrária aos interesses russos.
O Team 29 encerrou as atividades na Rússia, seus antigos
membros continuam a atuar em caráter pessoal e Pavlov foi
forçado a abdicar da defesa de Saranov e se exilar.
Novo advogado entra no caso e é preso
Mas a história não termina aí. O advogado que substituiu
Pavlov, Dmitry Talintov, foi detido em seguida, sob
acusações com penas que chegam a 15 anos de prisão.
A Diretora do TrustLaw informou na palestra que Talintov
permanece em prisão preventiva por tempo indeterminado,
não se sabe em quais condições.
Por seu lado, o jornalista Saranov teve sorte ainda pior do
que seus advogados. Julgado sem o adequado apoio
jurídico, está agora cumprindo uma pena de 22 anos de
prisão, sem possibilidade de apelação.
Liberdade de imprensa
Assédio aos advogados que defendem jornalistas é
um atentado à democracia.
Carolina Henriques-Schmitz ressalta que esse
tipo de ação por parte de governos autoritários tem
um efeito inibidor sobre os advogados, que temem
os riscos de defender jornalistas injustamente
perseguidos. Além disso, limita o direito dos
cidadãos de terem acesso a informações de
interesse público.
Na medida em que a lei é usada para calar o
jornalismo, os advogados são vitais para a liberdade de
imprensa e para a democracia."
Ela enfatiza que para responder ao cerco legal, é
necessária a união de jornalistas, sociedade civil e
dos próprios advogados, não só para quantificar a
real dimensão do assédio nos diversos países, mas
também para aumentar a conscientização da
necessidade de medidas para denunciá-lo e
combatê-lo.
Carolina espera que a divulgação da pesquisa seja
um passo inicial nessa direção.
O estudo pode ser visto aqui.
Julgado sem apoio jurídico, jornalista Ivan
Saranov foi condenado por alta traição
24
As estratégias para perseguir
advogados de jornalistas
1
Incapacitar os advogados por meio de processos
criminais e outras medidas judiciais, dificultando sua
atuação profissional
2
Interferir na capacidade de os advogados
representarem seus clientes, limitando acesso a
documentos legais e restringindo sua independência
3
Atacar diretamente o direito de os advogados
exercerem sua profissão
A Trust Conference também tratou de uma questão tão
importante quanto os efeitos da IA, o declínio da
democracia, a desinformação e a liberdade de imprensa:
o desgaste da sigla - ou dos compromissos ESG.
Ao enumerar uma lista de riscos enfrentados pela agenda
que nos últimos anos colaborou para que as corporações
criassem impacto positivo no mundo, o presidente da
Fundação Thomson Reuters, Antonio Zappulla, fez a
pergunta que muitos têm feito: estaríamos vendo o fim do
ESG como rótulo ou até como abordagem?
O papel dos líderes corporativos nesse ambiente foi
destacado pela empresária Lady Lynn Forester de
Rothschild.
O título é pomposo, herdado de seu terceiro marido, Sir
Evelyn de Rothschild, membro de uma das famílias mais
associadas ao capitalismo da história.
Com essa bagagem, ela fundou e dirige o Council for
Inclusive Capitalism, que tem como objetivo estimular
líderes corporativos a realizar ações que tornem a economia
e as sociedades mais inclusivas, dinâmicas, sustentáveis e
confiáveis.
A missão de combater o fim do ESG não é simples, como
destacou Antonio Zappulla.
Há poucos anos, havia uma expectativa generalizada de
que as empresas tomariam posição em algumas das
questões mais relevantes do nosso tempo [...]. Mas esses
dias parecem ter ficado para trás.
Nos EUA - mas também na Europa - vemos uma reação
contra o ativismo dos CEOs [...]. A acusação é a de que se
eles defendem posições sociais importantes que não geram
lucros diretos, estão priorizando a ideologia em vez do lucro
dos acionistas."
Lady Lynn Forester de Rothschild
(Foto: divulgação TRF)
Apesar dos contratempos, Lynn de Rothschild
permanece otimista sobre o progresso que está sendo
feito em questões como mudanças climáticas,
diversidade, equidade e inclusão (DEI) e o papel das
corporações na condução de transformações.
Ela enfatizou a necessidade de superar a percepção de
que não se pode ser favorável ao mesmo tempo ao
trabalhador e ao mercado.
Não existe dicotomia. Empresas que priorizam o
bem-estar de seus trabalhadores tendem a ter mais
sucesso a longo prazo."
A CEO do Council for Inclusive Capitalism acha que
pode ter havido um "exagero no feedback negativo", já
que há progressos em questões ligadas à agenda ESG.
Ela citou avanços em responsabilidade corporativa e
mudanças climáticas adotados por estados americanos
mesmo durante a presidência de Donald Trump como
exemplos positivos.
E disse acreditar que muitas empresas estão
incorporando princípios de ESG em suas práticas
principais, e não só na comunicação.
Precisamos de um movimento. Precisamos de
investidores que exijam entender o que as empresas
estão fazendo com seus trabalhadores e com o
planeta. A mudança empresarial deve vir dos líderes."
Fim do ESG?
Não para Lady Lynn de
Rothschild, CEO do
Council for Inclusive
Capitalism
ESG
25
Onda anti-ESG coloca
sociedade sob risco’
Como se manter firme diante dos "ventos destrutivos anti-ESG" e do
sentimento contrário a políticas corporativas que causam impacto
positivo na sociedade, movimento rotulado como "anti-woke" (contra o
politicamente correto)?
Sally Uren, diretora-executiva da organização não-governamental
Forum for the Future, apresentou durante a Trust Conference um
plano para reverter essa tendência, presente em nível global e com
mais força nos Estados Unidos.
Os opositores dos pilares ESG afirmam que a cobrança por adoção de
práticas ambientais, sociais e de governança (Environment, Social,
Governance, em inglês), fundamentais para o desenvolvimento
sustentável, estaria prejudicando o crescimento e os lucros das
empresas
Para Uren, no entanto, no longo prazo essa visão não se sustenta, pois
perpetua desigualdades sociais e econômicas a fim de favorecer um
grupo de acionistas em detrimento do restante da coletividade.
O Forum for the Future, onde Sally Uren atua desde
2002, nasceu no Reino Unido e hoje desenvolve
projetos nos Estados Unidos, Sudeste Asiático e Índia.
Os objetivos são transformar a forma como o mundo
pensa, produz, consome e valoriza alimentos e energia,
e reavaliar o prosito dos negócios frente aos desafios
sociais, ambientais e econômicos.
A diretora-executiva, integrante de conselhos de várias
empresas globais, destaca que o setor privado está no
centro da estratégia de sua organização.
Por ser um grande empregador, possuir cadeias de
abastecimento globais, influenciar o comportamento do
consumidor com suas marcas e ter acesso ao capital, o setor
privado tem papel fundamental na transformação dos
sistemas alimentares, energéticos e econômicos.
Inconformada com a visão dos defensores da onda anti-
ESG de que “o negócio das empresas é o negócio”,
desconsiderando pessoas e o meio ambiente, Sally Uren
apresentou um plano de cinco passos a fim de incentivar
líderes a se manterem firmes no compromisso de seguir
a pauta dos três pilares do desenvolvimento sustentável.
ESG
26
Sally Uren (foto: MediaTalks)
ESG
Um plano de ação contra os 'ventos
destrutivos contrários ao ESG
Cinco passos para o mundo corporativo
manter o compromisso vivo, por Sally Uren
“Atualmente, é quase impossível para uma empresa obter empréstimos de bancos
sem apresentar um plano de avaliação climática. Além disso, a própria economia
de mercado obriga à transição para a energia renovável. No Reino Unido, o custo
da energia eólica e solar é 99% menor do que era 15 anos. Não podemos
acreditar na retórica de quem se opõe ao desenvolvimento sustentável. Os fatos
mostram que para cada resolução de acionistas nos EUA de cunho anti-ESGo
tomadas 10 resoluções pró-ESG.”
Foque no contexto
atual e na
impossibilidade
de retroceder
“Particularmente nos Estados Unidos, em círculos onde há restrições à sigla ESG,
podemos eliminar a ideologia política da conversa e usar termos ligados ao
conceito, como a justiça climática, por exemplo. E mostrar como ela é importante
para a vida das pessoas, incluindo um emprego de longo prazo e a segurança da
família diante dos riscos de eventos climáticos extremos.”
Reformule a
narrativa e tire a
política da
conversa
“A linguagem dos negócios dos acionistas é muito baseada em riscos e resiliência.
Uma cadeia de suprimentos descarbonizada, que tem adaptação climática
embutida, é uma estrutura resiliente, o que faz todo o sentido comercial. Assim
como o custo da energia renovável cada vez menor.
Fale a
linguagem de
negócios dos
acionistas
Aproveite o
sentimento dos
funcionários
Planos de
implementação
podem ser
recalibrados
“Os funcionários realmente se preocupam com os pilares ESG e a
sustentabilidade. Estatísticas demonstram que empresas queo se
preocupam com essa agenda estão perdendo funcionários e sua atratividade
como empregadoras, principalmente junto aos mais jovens. Por outro lado, se
você é um CEO de uma empresa comprometida com o desenvolvimento
sustentável, aproveite esse dado a seu favor.”
“Quando muitas organizações estabeleceram suas metas ambientais, não
tínhamos as opções de descarbonização que temos hoje. Não problema em
uma empresa recalibrar seu plano com base no que está aprendendo, desde que
se mantenha focada nos impactos que causa. uma relutância em admitir a
dificuldade desses desafios. Osderes empresariais devem ser mais honestos
com os dados que mostram onde estão fazendo a diferença e onde não estão
indo bem.
27
Transparência corporativa
aumenta no compasso das
exigências de clientes e governos
Empresas que atuam em setores com alto nível de
concorrência, ou em regiões com mais exigências regulatórias
quanto à divulgação de seus dados,o as que apresentam
maior transparência corporativa e que prestam contas de forma
mais frequente e detalhada de seus compromissos sociais,
ambientais e de governança.
A conclusão é da edição 2024 do Workforce Disclosure
Iniciative, da Thomson Reuters Foundation, que recebeu
dados corporativos de 144 companhias que atuam globalmente
em 11 setores diferentes. Originárias de 25 países, incluindo o
Brasil, essas corporações têm um valor de mercado conjunto de
9 trilhões de dólares.
O estudo mostra como as principais transformações em curso,
principalmente a ascensão da IA e automação, a transição para
emissões líquidas zero, o avanço da Gig Economy, as mudanças
climáticas e os conflitos geopolíticos estão causando mudanças
significativas na força de trabalho global. Confira.
Tenncias globais
Empresas de setores de maior concorrência têm maior
transparência corporativa, na medida em que a disputa
pela fidelidade dos consumidores faz com que tenham que se
alinhar às demandas sociais e ambientais de seublico.
Requisitos regulatórios têm elevado ovel da
transparência corporativa. Isso foi mais evidente
recentemente na Ásia, com o aumento da legislação
específica em vários países do continente, seguindo o
exemplo da União Europeia e Reino Unido.
Diminuiu a transparência dos dados corporativos dos
EUA. O estudo associou o fato à depreciação dos pilares ESG
por parcela da comunidade empresarial do país, com base na
coincidência com a diminuição do investimento em fundos de
ações de empresas com temática ESG emvel global, que
tem nos EUA seu principal mercado.
5 trilhões de dólares por ano serão investidos na
mudança para uma economia líquida zero até 2030,
fomentando empregos na tecnologia verde, e ameaçando os
ligados a combustíveis fósseis.
95 milhões de pessoas estão deslocadas por 56
conflitos ativos em 2024, em outros países ou
internamente, e mais expostas ao tráfico humano e ao
trabalho forçado.
216 milhões de pessoas terão de migrar devido às
mudanças climáticas dentro de seus próprios países até
2050.
A Gig Economy avança, com aumento de empregos por
tempo determinado e de trabalhadores atuando por meio de
plataformas. Pesquisa da Universidade de Economia e
Negócios de Viena atribuiu a esse avanço o abrandamento do
crescimento salarial na Europa.
O relatório
completo
pode ser
visto aqui
Workforce Disclosure Initiative
28
82% das empresas respondentes estão aumentando o
investimento em AI e na transição tecnológica, o que vai
exigir investimentos em treinamento, requalificação e
garantia de benefícios equitativos da IA aos seus
trabalhadores
A desigualdade salarial entre gêneros continuou a
cair de 15% em 2022 para 13,7% em 2023 e 10% em 2024
77% têm políticas contra discriminação e assédio
divulgadas publicamente
76% têm medidas para aumentar a diversidade da
liderança
12% afirmaram ter identificado violações na cadeia de
abastecimento global, como trabalho forçado,
escravatura moderna, tráfico humano ou trabalho infantil
Esta iniciativa desempenhará um papel
fundamental no alinhamento das
práticas comerciais com a
Recomendação da UNESCO sobre a
Ética da IA, para que as empresas
prosperem e para que usuários e
consumidores se beneficiem da IA
ética.”
Gabriela Ramos | Diretora-Geral Adjunta
para as Ciências Sociais e Humanas da
UNESCO
Ferramenta com aval
da Unesco vai ajudar
empresas a garantir
padrões éticos de IA
A primeira ferramenta criada para apoiar empresas a
garantir os padrões éticos de suas aplicações de IA foi
apresentada durante a Trust Conference.
A iniciativa, denominada AI Governance Disclosure
Initiative (AIGDI), é resultado de uma parceria entre a
Unesco e a Thomson Reuters Foundation.
A AIGDI é uma pesquisa feito por meio de um questionário
voluntário e gratuito, que serve de roteiro para dar suporte
às empresas na maximização do potencial da IA,
destacando as melhores práticas, ao mesmo tempo em
que apoia a mitigação de riscos para as pessoas, a
sociedade e o meio ambiente.
A ferramenta também ajudará as empresas a se
anteciparem às legislações de IA e a posicioná-las como
líderes na adoção ética.
A Iniciativa é baseada nos valores e princípios da
Recomendação da UNESCO sobre Ética da IA, adotada
pelos 194 membros da ONU.
Criada em 2021, essa Recomendação é o primeiro e único
padrão global sobre Ética da Inteligência Artificial.
Ela estabelece uma estrutura para garantir inclusão,
equidade, respeito aos direitos humanos, proteção de
dados e colaboração internacional.
A iniciativa chega em boa hora. De acordo com pesquisa
divulgada pela McKinsey, apenas 18% das empresas têm
estruturas em vigor, como um conselho ou diretoria,
conforme recomendado pela Unesco, a fim de garantir que
o uso de IA seja responsável e ético.
Governança corporativa da IA
Revisão completa dos usos de IA
O objetivo do questionário é apoiar as empresas a realizar uma
revisão completa de como a IA está sendo usada em questões
emergentes que podem ter consequências sérias na vida das
pessoas e no futuro das empresas.
Além disso, vai permitir que compartilhem suas práticas de ética em
IA e contribuam para o avanço responsável da tecnologia.
Entre os aspectos analisados estão a aquisição de sistemas,
estratégia de IA, responsabilidade e conformidade legal,
privacidade e preconceito de dados, transparência, segurança
cibernética, supervisão humana das ferramentas de IA, impacto
ambiental, mitigação de riscos, garantia de diversidade e inclusão
nas ferramentas e impacto na força de trabalho, incluindo
qualificação de trabalhadores.
As empresas interessadas podem se cadastrar
para participar da pesquisa, que começará em 2025.
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Imgem: Geralt / Pixabay
lucianagurgel@mediatalks.com.br
São Paulo
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Reportagem, redação e edição | Luciana Gurgel e Aldo De Luca