As empresas de tecnologia ganharam mais um problema para se preocupar nos Estados Unidos. O governador do Texas, Greg Abbott, assinou nesta quinta-feira (9/9) uma nova lei que proíbe redes sociais de bloquear ou suspender usuários por postarem informações com base em seu “ponto de vista”.
A lei se aplica a empresas com mais de 50 milhões de usuários ativos por mês nos EUA, incluindo Facebook, Twitter e YouTube, e exige que as empresas prestem contas sobre qualquer conteúdo ilegal ou potencialmente violador de políticas, bem como elaborem um sistema para reclamações, onde cidadãos podem contestar as decisões de remoção de conteúdo.
Críticos de leis e regras semelhantes vêem neste tipo de intervenção um movimento intencional em manter a publicação de fake news e desinformação livre de punições ou censura nas redes.
Hoje, cidadãos e o procurador-geral do estado podem abrir processos se acreditarem que as empresas de tecnologia foram injustas em suas decisões.
“Agora é lei que pontos de vista conservadores no Texas não podem ser proibidos nas redes sociais”, disse Abbott, que integra o partido Republicano. Uma das bandeiras conservadoras nos EUA é afirmar que as empresas de mídia social estão censurando pessoas com base em sua filiação política. As empresas negam essas acusações.
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A assinatura do Abbott segue um esforço semelhante na Flórida, onde o governador Ron DeSantis, também republicano, assinou uma lei que impediria as empresas de mídia social de suspender candidatos políticos nas vésperas das eleições e tornaria mais fácil para o procurador-geral do estado da Flórida e indivíduos para abrir processos judiciais.
Em junho, um juiz federal bloqueou a entrada em vigor da lei, sugerindo que ela seria inconstitucional. A administração de DeSantis apelou da decisão do juiz.
Grupos da indústria de tecnologia criticaram a lei do Texas, e é provável que apelem da decisão à Justiça, travando batalha semelhante à da Flórida.
A lei do Texas argumenta que as redes sociais funcionam como “operadoras comuns”, refletindo um argumento usado em círculos conservadores americanos de que as empresas de redes sociais devem ser forçadas a hospedar todos os usuários.
Esta linha de pensamento foi popularizada pelo juiz da Suprema Corte, Clarence Thomas, que no início deste ano sugeriu em um parecer que as empresas de mídia social poderiam ser regulamentadas como as empresas de telefonia, que enfrentam regulamentações específicas devido à importância dos serviços que oferecem.
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Eric Goldman, professor da Escola de Direito da Universidade de Santa Clara, disse ao jornal Washington Post que a lei do Texas não “sobrevive ao escrutínio crítico” e espera que seja derrubada pelo sistema judicial como a lei da Flórida foi.
Ele disse que as leis da Flórida e do Texas “representam um esforço para jogar pela multidão partidária, não para fazer uma boa política”.
Abbott e DeSantis são vistos como presidenciáveis na eleição de 2024 nos EUA, e seu foco nas empresas de mídia social ressalta a importância do tema para o Partido Republicano. Abbott afirma que a liberdade de expressão “está sob ataque no Texas” e disse que, ao assinar a lei, estava lutando contra a “censura política da Big Techs”.
“Há um movimento perigoso por parte de algumas empresas de mídia social para silenciar idéias e valores conservadores”, disse ele, sem citar evidências para apoiar essa afirmação. “Isso está errado e não permitiremos no Texas.”
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Os conservadores intensificaram seus ataques à tecnologia no ano passado, principalmente depois que empresas como Facebook, Twitter e YouTube tomaram a medida sem precedentes de banir o presidente Donald Trump de suas plataformas por violar suas políticas no episódio do ataque de 6 de janeiro no Capitólio.
Em julho, Trump entrou com ações judiciais contra o Facebook, Twitter e YouTube por causa de uma suposta censura, o que se tornou uma bandeira política para os republicanos.
Adam Kovacevich, o CEO da Câmara do Progresso, que conta com Facebook, Google e outros gigantes da tecnologia entre seus financiadores, disse que acha que a lei do Texas vai contra a Primeira Emenda, que veta o Poder Legislativo de criar leis que restrinjam a liberdade de expressão. Segundo Kovacevich, os republicanos apostam no tema porque veem uma oportunidade de ganho político.
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As empresas de tecnologia têm enfrentado em diferentes países iniciativas que buscam restringir a atuação delas como plataformas de comunicação. Seja no campo econômico, em brigas por pagamento de impostos e adequação a leis locais (quando Big Techs mantém sedes em outros países e não seguem a lei dos mercados onde operam), caso de uma briga particular entre o presidente Vladimir Putin e as companhias americanas na Rússia.
A reponsabilização pelo conteúdo divulgado nas redes sociais é outro campo de batalha, e no caso da Índia, as redes tiveram um revés. O governo do primeiro-ministro Narendra Modi aprovou uma lei que torna as empresas puníveis pelo conteúdo exposto em suas plataformas digitais, e um executivo do Twitter chegou a ter prisão decretada.
No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro assinou recentemente uma Medida Provisória, instrumento que decreta leis temporariamente sem a aprovação do Congresso, que altera o Marco Civil da Internet e, assim como no Texas, proíbe a suspensão ou ocultação de posts baseados em pontos de vista sem ordem judicial.
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Críticos do presidente apontam que a medida é uma tentativa de manter as redes disponíveis para discursos e fatos afirmados pelo presidente sem apresentação de provas, como os ataques às urnas eletrônicas e à vacina contra Covid-19 produzida pelo Butantan, instituto controlado pelo governador João Doria, rival político do presidente.
Na França, o Google foi multado em € 500 milhões em julho, após a autoridade de regulamentação de mercado considerar que a empresa agiu de má fé ao retardar negociações com publicações para o pagamento de conteúdo jornalístico, divulgado por produtos como o Google Showcase, agregador de notícias da empresa.
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